Segurança

Justiça de Goiás determina que mortes por PMs sejam investigadas pela Polícia Civil

De 2018 a 2023, o número de mortos em ações registradas como confronto cresceu 22%

(O Globo) O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) decidiu que homicídios dolosos cometidos por policiais militares no exercício da função contra cidadãos comuns devem ser reportados à Polícia Civil e não à Justiça Militar. A sentença acolhe um recurso impetrado pelo Ministério Público estadual e também determina que as armas utilizadas em cada caso sejam entregues ao Instituto de Criminalística para perícia, sem qualquer espécie de manuseio, após o episódio.

O recurso foi apresentado pelo MPGO após decisão anterior do juiz Everton Pereira Santos, da 5ª Vara da Fazenda Pública Estadual, que havia negado pleito semelhante com base no Código de Processo Penal Militar (CPPM). No entender dos promotores, porém, a legislação atual é inconstitucional, pois esses casos não devem ser tratados como crimes militares. A argumentação acabou chancelada pela desembargadora Sirlei Martins da Costa, que reformou a sentença original para atender parcialmente os pedidos do MP.

A nova decisão determina que o comandante-geral da PM goiana, Marcelo Granja, edite e publique, no prazo de 30 dias, ato normativo formalizando a mudança no procedimento. Em caso de descumprimento, foi fixada uma multa diária na pessoa do oficial, no valor de R$ 1 mil, limitada ao período de 30 dias de incidência.

Ao portal g1, a PMGO informou que ainda não foi formalmente notificada da decisão. A corporação destacou, porém, que “assim que for cientificada e tomar conhecimento do total teor do acórdão, adotará as medidas administrativas e adequações necessárias, dentro do prazo legal, para garantir o cumprimento da determinação judicial”.

Bandeira do governador Ronaldo Caiado (União Brasil) na tentativa de se cacifar para a disputa à Presidência em 2026, a política de segurança pública em Goiás tem um modelo de progressão de carreira que quadruplicou desde o início da gestão as promoções de policiais militares por “atos de bravura”. Também houve aumento de 22% na letalidade em ações policiais na comparação com o último ano do governo anterior.

Crescimento da letalidade

O aumento da letalidade em confrontos na gestão Caiado está aliado à queda de outros crimes, como homicídios e roubo de veículos, e tornou-se instrumento eleitoral ao mesmo tempo em que a Polícia Civil investiga a suspeita de fraudes nos registros de ocorrência de confronto com criminosos e que o crescimento nas promoções de oficiais e praças gera desconforto em setores da Polícia Militar.

Em abril deste ano, policiais militares mataram dois homens, em Goiânia, em uma ação registrada como confronto. Um vídeo gravado pelo celular de uma das vítimas revelou que não houve reação antes de serem baleadas. A imagem mostra que, após os tiros, um policial retirou um revólver de uma sacola e efetuou disparos para o chão — um segundo agente também atirou contra o chão, com outra arma. Seis agentes do batalhão especializado Comando de Operações e Divisas (COD) foram presos por envolvimento no caso, investigado pela Polícia Civil.

A Polícia Militar disse que o episódio foi um “fato isolado”, que as “medidas correcionais” já foram tomadas e que colabora com as autoridades para que “nenhuma irregularidade fique impune”. O chefe do batalhão foi exonerado do posto após o episódio. O governo de Goiás argumentou que a letalidade policial vem caindo desde 2020 e que o estado “tem se destacado pela queda expressiva dos indicadores de violência e criminalidade em geral”.

De 2018, último ano antes da entrada de Caiado, a 2023, o número de mortos em ações registradas como confronto cresceu 22%. O governador criou, inclusive, o seguinte lema: “Em Goiás, ou bandido muda de profissão, ou muda de estado”.

— Em todas as denúncias de excesso, os policiais foram afastados e julgados. Mas, se as pessoas vêm para o confronto, o policial é muito bem treinado — já afirmou Caiado.