Crítica: Tick, Tick… Boom! (2021) – Netflix
O Oscar digno para Andrew Garfield, por favor! Além de ser um dos melhores filmes do ano!
Jonathan Larson foi um compositor nova-iorquino responsável por criar “Rent”, uma das mais populares peças teatrais da Broadway que ficou por mais de dez anos em cartaz. Também escreveu “Tick, Tick… Boom”, que se tornou seu primeiro grande sucesso e é uma peça cheia de metalinguagem sobre um momento de sua vida em que estava chegando aos 30 anos e não tinha conseguido emplacar nenhum trabalho tanto na Broadway quanto off-Broadway. Portanto, “Tick, Tick… Boom” explora este momento da vida de Larson onde ele estava terminando de escrever uma peça de ficção científica, chamada Superbia, enquanto trabalhava meio período em uma lanchonete. E é o próprio Larson o apresentador dessa narrativa.
E quando digo que Jonathan Larson foi, é porque ele faleceu em 1996 com apenas 35 anos de um aneurisma cerebral antes mesmo de seu grande sucesso, “Rent”, estrear na Broadway (concidentemente no mesmo dia de estreia da peça). Larson era uma dessas pessoas super talentosas repletas de conflitos e paixão imensurável pela arte de escrever, de compor, e uma pessoa efervescente e cheia de energia e paixão pelo que fazia. Stephen Sondheim, um gênio da Broadway que compôs clássicos como “Amor Sublime Amor, “Sweeney Todd” e outros, teve uma breve conexão e amizade com Larson, lhe servindo de mentor em muitos aspectos profissionais de seus trabalhos.
Eis que chegamos ao filme “Tick, Tick… Boom!” dirigido por Lin-Manuel Miranda, estrelado por Andrew Garfield e lançado pela Netflix. Adaptado da peça homônima de Jonathan Larson, o filme é um desses colossos surpreendentes que nos fisga emocionalmente em sua jornada e quando notamos estamos imersos e chorando aos montes.
“Tick, Tick… Boom” capta com maestria a metalinguagem do texto de Larson, sobrepondo situações com a apresentação do compositor (aqui interpretado por Garfield) na peça “Tick, Tick… Boom!” em algo que somente o poder da edição audiovisual é capaz de proporcionar. A montagem da obra flui com naturalidade, inteligência e colabora para a construção dos conflitos emocionais do protagonista. Além de entregar um ritmo sempre empolgante e envolvente.
O longa marca também a estreia de Lin-Manuel Miranda como diretor. Miranda é conhecido por ter criado o fenômeno atual da Broadway, “Hamilton”, além das músicas de “Moana”, do inédito “Encanto” (também da Disney), escreveu a peça “In The Heights” que ganhou um filme este ano chamado “Em Um Bairro de Nova York”, além de ser um ator excelente. Sua estreia na direção não poderia ser melhor com um material que fala justamente dos altos e baixos do processo criativo e os conflitos de se criar um trabalho para a Broadway, algo que ele também vivenciou. E Miranda entende a diferença de teatro e cinema e entende que um filme musical requer movimento, requer uma colaboração maior de atores, cenário, figurino, iluminação, coreografia e, o mais importante, edição e ritmo.
Diferente do péssimo “Querido Evan Hansen” que não emplaca emoção alguma e é totalmente pobre na maneira como desenvolve suas sequências musicais, em “Tick, Tick… Boom!” temos ritmo, temos movimento, e quando são momentos parados, eles fazem sentido e são essenciais para a transmissão do drama e emoção do momento. O filme é excepcional na maneira como nos coloca em constante conflito e angústia com o protagonista, ao mesmo tempo em que entrega canções ora empolgantes e envolventes, ora profundamente emocionantes.
E precisamos falar sobre Andrew Garfield. O ator já se mostrou um dos melhores atores da atualidade em filmes como “Até o Limite do Homem”, “A Rede Social” e “Silêncio”, por exemplo, e mais uma vez ele entrega um personagem totalmente diferente de outras performances, e um personagem difícil, repleto de camadas e a espinhal dorsal da narrativa. Garfield é um furacão em cena, um maestro que não só reproduz os tiques reais de Jonathan Larson com exatidão, como sua construção do compositor passeia entre a empolgação constante com o medo e a insegurança acerca de seu futuro. Sem dúvida, é uma atuação digna de Oscar e se não for, ao menos, indicado ao prêmio será outra grande injustiça da Academia.
Diferente dos musicais habituais que estamos acostumados, “Tick, Tick… Boom!” é uma dessas surpresas memoráveis e inesquecíveis. Uma obra-prima do gênero e um filme que merece, e muito, ser assistido e revisto. Recomendado!
Tick, Tick… Boom!/EUA – 2021
Dirigido por: Lin-Manuel Miranda
Com: Andrew Garfield, Vanessa Hudgens, Robin de Jesus, Alexandra Shipp, Bradley Whitford…
Sinopse: Em Tick, Tick…Boom!, Jon (Andrew Garfield) é um jovem compositor que trabalha como garçom em Nova York, enquanto sonha em escrever um grande musical americano que vai o levar ao estrelato. Quando seu colega de quarto aceita um emprego corporativo e está prestes a se mudar, próximo ao seu aniversário de 30 anos, Jon é tomado pela ansiedade de que seu sonho é irreal e não vale a pena continuar lutando.