A Marca da Maldade (1958) | Relembrando Clássicos
Longa-metragem foi escrito, dirigido e estrelado por Orson Welles
Logo nos primeiros momentos de “A Marca da Maldade” temos um plano sequência de 3 minutos mostrando uma bomba sendo colocada em um carro e acompanhamos o veículo passando pela fronteira entre México e Estados Unidos, ao mesmo tempo em que o protagonista Ramon Miguel Vargas, interpretado por Charlton Heston, anda com sua namorada Susan (Janet Leigh) também passando pela fronteira até que uma enorme explosão acontece.
O crime será o estopim para a entrada do capitão da polícia Hank Quinlan (Orson Welles), um sujeito manco, obeso e com enorme desprezo pelos mexicanos. Ele será a figura controversa da trama e em nenhum momento a narrativa irá buscar torná-lo mais agradável, pelo contrário, o roteiro também do próprio Welles (que também dirige) o coloca como o ser humano desprezível, mentiroso e desonesto que ele é, mas sem deixar de mostrar razões para este sujeito ter se tornado este ser vil e desprovido de empatia.
“A Marca da Maldade” é indubitavelmente um filme de Orson Welles. Alçado ao estrelato com o clássico “Cidadão Kane” (1941), Welles é um diretor que a todo momento busca fugir da zona de conforto e não se contenta em fazer um filme da maneira convencional. Aqui temos enquadramentos ousados e distintos, e uma edição tão angustiante e frenética que é de dar inveja à muitos diretores atuais.
Percebam, por exemplo, o momento da angustiante sequência em que a mocinha Susan Vargas (Janet Leigh) é mantida cativa em um quarto e Quinlan surge para implantar provas para incriminá-la, e toda a sequência é filmada no escuro com pequenas sombras iluminando o quarto, e se a fotografia magistral de Russell Metty colabora para a claustrofobia do momento, a câmera de Welles não para e mescla momentos de contra-plongé (de baixo para cima), para enfatizar a ameaça assustadora do capitão corrupto, com momentos de câmera na mão que inserem o expectador no calor do momento. É angustiante!
Mas não apenas a cena citada acima é memorável em “A Marca da Maldade”. Welles é um maestro de seu ofício, e o filme nos entrega uma trama policial que à partir de certo momento torna-se uma jornada pessoal do personagem Vargas para provar a corruptilidade de Quinlan. Daí, o filme se transforma em uma jornada de gato e rato onde forças distintas se mesclam em um jogo denso, angustiante e extasiante. E se Welles coloca diálogos que nos ajuda a conhecer melhor o passado de Quinlan com sua falecida esposa, o personagem em nenhum momento é colocado em rota de redenção, mas sim, se mantém como o grande algoz da trama.
Orson Welles é um ator também multifacetado que consegue se diferenciar em cada personagem. Irreconhecível aqui, Quinlan é o grande vilão da trama, mas também, o mais interessante e hipnotizante. E ainda que sirva bem seu papel como o lado coerente e correto da história, é estranho e nada convincente ver Charlton Heston como um mexicano (mas coisas da época e não interfere na qualidade geral do longa).
Um dos melhores filmes da carreira de Orson Welles, “A Marca da Maldade” é uma aula de cinema que ressalta a visão singular de Welles para a Sétima Arte, em uma história policial que sabe colocar o expectador imerso, e envolvido, em cada momento da narrativa. Um filmaço!
Touch of Evil/EUA – 1958
Com: Charlton Heston, Orson Welles, Janet Leigh, Joseph Calleia…
Dirigido por: Orson Welles