Crítica: Bebê Rena (minissérie, 2024) – Netflix
Show é estrelado por Richard Gadd e Jennifer Gunning
Já tivemos muitos projetos que lidam com stalkers e saúde mental, mas não me lembro de um projeto que trata o assunto de maneira tão honesta, tão profunda e auto avaliativa como aqui em “Bebê Rena”. Criado, escrito e estrelado por Richard Gadd, que conta sua própria experiência pessoal quando começou a ser perseguido por uma mulher que conheceu no bar onde trabalhava. Chamada aqui de Martha, tudo começou após ele ter oferecido uma bebida já que ela estava triste e sem dinheiro, mas desde então os e-mails, ligações e encontros indesejados não pararam mais.
Mas ainda que a história superficial de “Bebê Rena” seja sobre uma mulher problemática e sem afeto que começa a perseguir outra pessoa, a minissérie de Richard Gadd vai muito além e não esconde os demônios pessoais de seu próprio protagonista, e Gadd utiliza o show como terapia para exorcizar, ou ao menos mostrar ao público, que o maior problema desta situação foi ele mesmo. Gadd se abre sem nenhum tipo de amarras ou vergonha, e cria uma produção que se aprofunda no psicológico e descontrói totalmente a vítima da história.
O show não coloca a culpa na vítima, mas mostra como sonhos frustrados, decepções e um histórico familiar repressivo favorece nossas escolhas e decisões, e como até mesmo uma situação desagradável como alguém tirando totalmente sua liberdade pode colaborar para você se sentir minimamente importante. O buraco é muito mais fundo, e Gadd cria uma minissérie muito mais sobre si mesmo do que sobre uma perseguidora. Temos uma cena belíssima no último episódio quando descobrimos um segredo íntimo de seu pai, ou mesmo a última cena quando Gadd (ou Donny Dunn na série) se vê na mesma posição de Martha lá no começo. São momentos que mostram como tudo é um ciclo de repressão, angústia e solidão que afeta muitas pessoas.
E se Richard Gadd é uma revelação como realizador e protagonista, em uma atuação difícil e muito pessoal, outra revelação é Jennifer Gunning como Martha. O papel da stalker poderia cair muito fácil na caricatura, mas Martha consegue tornar sua personagem uma figura trágica que transmite tanto ódio quanto pena.
A Netflix sempre lança muitas coisas novas semanalmente, mas de vez em quando surge um projeto que fura a bolha e ganha a massa – casos como “Wandinha”, “Stranger Things” e “Round 6” são ótimos exemplos. Mas um show como “Bebê Rena”, que é um drama melancólico e difícil de assistir que fala sobre saúde mental e comportamento, conseguir alcançar este patamar e se manter viva na boca das pessoas, é um feito e tanto que só mostra como o público se interessa por assuntos humanos, principalmente quando a história é contada magistralmente com excelente ritmo e elenco. Um show que tem muito a dizer e abre espaço para ótimas conversas sobre como nós estamos mentalmente.
Baby Reindeer/minissérie, REINO UNIDO, EUA – 2024
Criado por: Richard Gadd
Com: Richard Gadd, Jennifer Gunning, Nava Mau…