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‘Absoluta desnecessidade enviar vídeo abjeto ao povo brasileiro’, diz autor de pedido de impeachment contra Dilma

Para Miguel Reale Júnior, presidente pode ser enquadrado em artigo sobre falta de decoro na lei de crimes de responsabilidade

A publicação de um vídeo contendo atos obscenos pelo presidente Jair Bolsonaro configura quebra do decoro e pode até mesmo justificar um processo de impeachment, segundo o jurista Miguel Reale Júnior . Em 2015, ele foi um dos autores do pedido que levou a saída de Dilma Rousseff (PT) do cargo.

A lei 1.079 de 1950, que define os crimes de responsabilidade do presidente da República, afirma que é crime contra a probidade na administração “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”.

O advogado lembrou que o conceito de decoro requer a decência, compostura, respeito ético e moral e, também, a discrição de quem ocupa um cargo público. Para Reale Júnior, a possível quebra de decoro é reforçada pelo caráter desnecessário da divulgação do vídeo.

Segundo o jurista, caso quisesse denunciar os responsáveis, o presidente poderia ter ordenado a um auxiliar para que fizesse uma comunicação à polícia.

— O que eu destaco é a absoluta desnecessidade de enviar este vídeo abjeto ao povo brasileiro para denunciar algo que tinha sido visto, previamente, por algumas centenas de pessoas. Um auxiliar, reservadamente, poderia fazer isso junto à autoridade policial. Com a divulgação, ele deu exposição a um fato restrito, sem nenhuma necessidade: ou seja, ampliou o ato. Algo que seria visto por algumas pessoas foi visto pelo Brasil inteiro — afirmou.

O advogado lembrou que o crime de praticar ato obsceno em lugar público é considerado, no Código Penal, menos grave do que o de sua divulgação.

Segundo o artigo 234 do código, a pena para quem pratica ato obsceno em lugar público é de três meses a um ano de detenção. Já para aqueles que distribuírem, a pena é de seis meses a dois anos.

O jurista lembrou ainda que, a partir do momento em que Bolsonaro venceu a eleição, suas contas nas redes sociais podem e são vistas como meios de comunicação oficiais do governo, onde o presidente já anunciou nomeação de ministros, além de outros atos de caráter oficial.

— Não existem dois Jair, o que está no Twitter e o que está no Planalto. É uma coisa só — disse.

Possível violação ao ECA

Além de ser passível de um pedido de impeachment, a divulgação do vídeo também poderia ser entendida como uma violação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), já que alguns dos seguidores de Bolsonaro nas redes sociais são crianças ou adolescentes e que, inadvertidamente, podem ter assistido aos atos obscenos divulgados pelo presidente.

Segundo Reale Junior, a publicação do vídeo nas redes sociais de Bolsonaro indica que a intenção do presidente não era a responsabilização dos autores do crime, mas fazer uma relação falsa entre obscenidade e Carnaval.

Para o jurista, o objetivo do presidente era desmoralizar os blocos que, durante o feriado, o criticaram. Em alguns deles, foliões fizeram protestos contra alguns dos escândalos do início de seu governo, como as candidaturas laranjas do PSL e as investigações sobre os depósitos suspeitos de Fabrício Queiroz, assessor de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).

— Não foi para denunciar. O presidente tem outros meios muito mais hábeis para isso do que publicar no Twitter. Inclusive, aparentemente, quem estava nesse bloco diz que foi um ato isolado de um sujeito bêbado. O presidente quer universalizar, quer estabelecer uma relação de generalidade de que bloco é isso.