Racismo e homofobia

Aluno é chamado de ‘macaco, gorila e veadinho’ em escola, e Polícia Civil investiga

O episódio aconteceu na quinta (21), um dia após a data que celebra a Consciência Negra

Macaco, gorila e veadinho. É o que um adolescente teria ouvido de dona Zuca, uma septuagenária conhecida entre alunos como a dona da Disneylândia, escola particular no Conjunto Maguari, periferia de Belém (PA).

A Polícia Civil diz que um adolescente de 16 anos fez a acusação de injúria racial e prestou depoimento na Divisão de Atendimento ao Adolescente nesta segunda-feira (25). O caso foi registrado, e o garoto, atendido por uma equipe com psicólogo e assistente social.

O episódio aconteceu na quinta (21), um dia após a data que celebra a Consciência Negra. O jovem estava na sala de aula, com colegas e dois professores, quando dona Zuca, que só teve o apelido e o primeiro nome (Dora Célia) revelados, entrou.

Quem reproduz seu relato é um primo, o psicólogo Diego Ferreira Machado, 26.

“Ela começou a fazer insinuações, dizia estar satisfeita que um aluno não estaria mais na escola [no ano seguinte]. Ele começou a rebater, perguntando se era dele que ela estava falando. Aí chamou de macaco, gorila e veadinho.”

Segundo Diego, o primo pegou suas coisas para se retirar, mas dona Zuca não deixou que fosse. “Nisso ela deu um tapa nele [na cabeça], puxou a gola da camisa para ele voltar e chegou a puxar o cabelo, como ele falou. Disse que, como estava em sala, não podia ir embora. Ainda bem que ele não reagiu. Sei que é difícil ficar calado, se conter, até por conta da idade dela.”

Machado afirma que o adolescente, “o único negro retinto, mais escurinho”, da turma do 9º ano do ensino fundamental, foi suspenso e chegou a ter seu desligamento anunciado pela direção da escola. Ele poderia ficar só até fazer as provas de fim de ano.

A reportagem tentou falar com a instituição, que cobra mensalidades de até R$ 500, mas não teve retorno. Não está claro se a idosa acusada de injúria racial é, como dizem estudantes, a proprietária do colégio ou só uma funcionária, como a direção afirmou após a denúncia viralizar.

Um site de notícias local, o Roma News, conversou com Dagmar Valente, identificada como assessora pedagógica do colégio. De turbante, ela, que tem a pele negra, diz que nada foi comprovado e destacou que o colégio estava desenvolvendo trabalhos para celebrar o Dia da Consciência Negra.

Valente diz que o jovem supostamente atacado por dona Zuca está bem e que foi acolhido pela classe. A idosa está afastada da escola, segundo ela.

Alunos, ex-alunos e familiares convocaram um ato para quarta (27), em frente à Disneylândia, em desagravo ao jovem que teria sofrido a injúria racial. Muitos endossam a ideia de que Zuca seria agressiva e reincidente no preconceito racial.

Izabel Estumano é uma delas. À reportagem ela conta que sua filha, que estudou ali, já foi chamada de “negrinha gorda” e “baleia preta” pela senhora. O pai da menina estava devendo mensalidades atrasadas, e a adolescente teria pagado o pato. “Ela entrava na sala ofendendo minha filha.” A garota tinha 12 anos à época, em 2016.

O primo do adolescente, que completou 16 anos na semana em que teria sido agredido, diz que sempre debateu o tema na família. “A criança negra percebe o racismo da maneira mais cruel. Ele teve dificuldade de se entender como negro.”

Por conta do bullying que o garoto sofria no ambiente escolar, sua avó, que o cria, já teria decidido mudá-lo de colégio.

Só quando o caso veio à tona que a responsável pelo garoto recebeu um pedido de desculpas do diretor, afirma Machado. “Pediu para ela repensar [se persistia na acusação]. A gente falou várias vezes: se tivessem tomado providência antes [contra Zuca], não teria chegado a esse ponto.”