Ambientalistas tentam conter retrocessos ambientais do governo na Justiça
Pedido de tutela de urgência de deputados petistas contra a revogação de normas foi negado
Após a revogação de resoluções do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), presidido pelo ministro Ricardo Salles, entidades ambientalistas e parlamentares preparam ações na Justiça para conter os efeitos da decisão, que tirou a proteção ambiental de áreas de manguezais e restinga.
A reunião, ocorrida na manhã de segunda-feira (28), também derrubou a necessidade de licenciamento ambiental para projetos de irrigação e aprovou a queima de resíduos de agrotóxicos em forno de cimento.
“Os setores imobiliário e da carcinicultura sempre pleitearam publicamente as revogações dessas normas”, afirma o deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP), que foi conselheiro do Conama e participou da relatoria de duas resoluções revogadas nesta segunda: a 302 (que protege áreas no entorno de reservatórios) e a 303, que determina as Áreas de Preservação Permanente em manguezais e restingas. Ambas foram criadas em 2002.
“Havia receio de se tratar disso no Conama e haver uma reviravolta, que foi o que aconteceu”, afirma Agostinho.
“Com o novo Código Florestal [aprovado em 2012], eram previsível que essas resoluções fossem revisadas para atualização, mas não revogadas. O que Salles fez é criminoso. Criou uma lacuna legislativa absurda”, completa.
Ainda no domingo, os deputados petistas Nilto Tatto (SP), Enio Verri (PR) e Gleisi Hoffmann (PR) haviam ingressado com uma ação popular preventiva na 16ª Vara da Justiça Federal pedindo, em tutela de urgência, a suspensão da reunião ou, não havendo tempo hábil para a decisão, a anulação das decisões tomadas pelo colegiado. A Justiça negou o pedido.
A decisão do juiz federal Gabriel Zago Vianna de Paiva se baseou na presunção de legitimidade dos atos administrativos. “Os pedidos se baseiam em meras conjecturas, e não em atos concretos”, afirmou em sua sentença.
Tatto afirma que pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal junto a outros partidos. “Parece limitado o entendimento do magistrado sobre o dever constitucional do Judiciário de agir para evitar o dano, quando ele é previamente apontado e não apenas suposto”, afirmou Tatto em resposta à decisão.
“Modificar resoluções do Conama é quase um processo legislativo, passa por câmaras técnicas, por discussões técnicas e jurídicas. Mas, da maneira como Salles fez, acabou com tudo, deslegitimando uma instância que tem papel fundamental da governança ambiental do país”, afirma o ambientalista Fabio Feldmann, ex-deputado federal e ex-conselheiro do Conama.
Ele expressa preocupação com o precedente que a ausência de discussão técnica na decisão do Conama pode gerar para futuras votações, como a do Proconve (Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores), já que a indústria automotiva tem pedido ao Conama o adiamento da adoção de novos padrões de emissão de poluentes.
“A reorganização do Conama realizada pelo atual governo foi efetivada exatamente para ele ter controle completo das decisões do conselho. Ao refletirem a posição do governo atual, as decisões serão sempre no sentido de reduzir o grau de proteção ambiental das regras. O o Conama passou a ser uma instância de ‘passar a boiada’.”, afirma Suely Araújo, especialista em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama.
Para ela, “o único caminho será a judicialização. É a única saída para lutar contra o desmonte da política ambiental”.
A aposta na Justiça é seguida por outras organizações ambientalistas. “A sociedade civil deixa instrumentos democráticos como o Conama, que já não funcionam mais, e vão pra judicialização”, Carlos Bocuhy, ex-conselheiro do Conama e presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam).
Segundo ele, ONGs em três estados —Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo— já preparam ações na Justiça para que a aplicação das normas seja mantida.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES), presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, também prometeu ingressar com uma ação na Justiça Federal contra a decisão.
Segundo ele, a decisão do conselho é um retrocesso às regras de proteção ambiental do país. “Os mangues são o berçário da biodiversidade costeira e sua degradação traz um alto impacto ambiental e social. O ministro do Meio Ambiente quer transformá-los em resorts de luxo e fazendas de carcinicultura. A sociedade precisa reagir a essa barbaridade.”