FEMINICÍDIO

Após uma semana, Justiça condena Manvailer por morte de Tatiane Spitzner no PR

Após sete dias de julgamento, o juiz Adriano Scussiatto condenou em primeira instância o biólogo Luis…

Após sete dias de julgamento, o juiz Adriano Scussiatto condenou em primeira instância o biólogo Luis Felipe Manvailer a 31 anos, 9 meses e 18 dias de reclusão pelo homicídio qualificado de sua mulher, a advogada Tatiane Spitzner. O juiz afirmou que a vítima vivia um relacionamento abusivo com Manvailer, 34, e considerou como qualificadores do assassinato feminicídio, meio cruel, motivo fútil, além de fraude processual por limpar vestígios de sangue de Tatiane. O réu também foi condenado a indenizar os familiares de Tatiane em R$ 100 mil por danos morais.

A advogada foi encontrada morta no dia 22 em julho de 2018, aos 29 anos, depois de uma queda do quarto andar do prédio em que morava com Manvailer, em Guarapuava, no Paraná. Momentos antes da morte, câmeras do prédio em que o casal morava registraram cenas em que Tatiane era perseguida e agredida violentamente pelo marido no estacionamento e no elevador.

Os sete jurados, todos homens, que foram sorteados no início do julgamento para compor o júri, declararam Manvailer culpado pelo assassinato de Tatiane. O júri seguiu a denúncia feita pelo Ministério Público do Paraná que diz que Manvailer agrediu, asfixiou e matou a mulher antes de atirar seu corpo pela sacada do apartamento. Segundo o IML (Instituto Médico Legal), a causa da morte da vítima foi asfixia por esganadura.

“É um alívio pela Tati. Finalmente ela vai poder descansar”, disse Bruna Spitzner, prima de Tatiane, a Universa. O advogado da família de Tatiane, Gustavo Scandelari, também comemorou a decisão. “A justiça foi feita! A reação dos familiares foi de emoção. A declaração dos jurados efetivamente entrega alguma paz de espírito. A decisão não traz a Tatiane de volta, mas é uma sensação de alívio”, afirmou. Segundo Scandelari, Manvalier não esboçou reação alguma durante todo o julgamento.

Durante a leitura da sentença, o juiz Scussiatto relembrou outros casos de feminicídios de repercussão nacional. “Casos como o de Ângela Diniz, Eloá Cristina Pimentel, Marielle Franco e, mais recentemente, da juíza Viviane Viera, entre outros, não podem e não devem ser esquecidos. O crime não só chocou a cidade do Paraná, mas todo o país”, afirmou.

O advogado de Manvailer, Cláudio Dalledone Júnior, disse que recorrerá da decisão e pedirá a anulação do julgamento. “Infelizmente, perde a sociedade, perde a comunidade”, declarou.

O réu, que está preso há dois anos e nove meses, seguirá na prisão até possível novo julgamento. Com a pena de 31 anos aplicada hoje, para que Manvailer consiga pedir progressão de regime, ele terá que cumprir aproximadamente 12 anos. Como já cumpriu menos de três anos de reclusão, faltam mais de nove para uma eventual progressão.

A advogada Isabela Del Monde, coordenadora do movimento #MeToo Brasil e colunista de Universa, classificou o veredito como “histórico”. “Embora eu não seja uma pessoa que celebra prisões, é realmente histórica essa condenação que foi confirmada por sete jurados homens. Acredito que o feminismo jurídico está conseguindo ver os resultados de sua atuação; nossas lutas incidem positiva e diretamente na realidade quando temos homens decidindo pelas nossas vidas não em pacto com o feminicida.”

A condenação de Manvailer foi celebrada com buzinaço em Guarapuava, cidade com pouco mais de 180 mil habitantes.

Após uma semana, Justiça condena Manvailer por morte de Tatiane Spitzner no PR

Advogado de Manvailer agride colega para contestar acusação

Um fato ocorrido no último dia do julgamento, nesta segunda (10), foi condenado por advogadas e diversas mulheres nas redes sociais. Para demonstrar que a tese da acusação de que Tatiane havia sido asfixiada antes de cair da sacada do apartamento, o advogado de Manvailer, Cláudio Dalledone Junior, chamou uma colega de escritório para uma “encenação”. Nas imagens, Dalledone é tão realista na agressão que a advogada chega a perder o equilíbrio e quase cair.

“Alguém já viu alguma reconstituição em que se usam corpos humanos para simular os crimes de lesão corporal praticados? Não, simplesmente porque isso é imoral, ilegal e antiético. Para tanto, são usados bonecos, objetos sem vida e sem alma, ao contrário da advogada exposta de maneira vexatória pelo dono do escritório de defesa”, diz Isabela Del Monde.

Dalledone Júnior divulgou agora à noite um vídeo ao lado da colega criminalista para dizer que não se tratou de agressão, mas de uma “dinâmica” de plenário. “Temos treinamentos para isso. Não houve qualquer força empregada, nada que possa se caracterizar uma agressão. O Ministério Público, o juiz de direito, com poder de polícia, e a própria OAB estavam presentes”, disse.

Procurada por Universa, a OAB – PR não se manifestou sobre o ocorrido até a publicação desta reportagem.

Depoimento de Manvailer durou 11 horas

O julgamento de Manvailer começou na última terça-feira (4). O primeiro passo foi a composição do júri. Foram escolhidos sete jurados, todos homens, para julgar o réu. Ao longo da semana, foram ouvidas testemunhas e apresentadas provas de defesa do réu e de acusação.

Entre as pessoas que deram depoimentos estiveram vizinhos do casal, policiais que foram ao local, peritos e especialistas que acompanharam o caso. Após dois dias de plenário, a defesa de Manvailer mudou sua argumentação. No tribunal, o advogado Claudio Dalledone Júnior afirmou que Tatiane se acidentou quando utilizava uma “estratégia emocional” para conseguir acessar o celular do marido, o que teria causado sua queda. Em declarações e entrevistas anteriores, porém, Dalledone afirmara que Tatiane tinha depressão e havia se suicidado.

O réu foi interrogado por 11 horas durante o domingo (9). Em sua fala, Manvailer pediu perdão aos familiares de Tatiane, aos próprios parentes e às mulheres vítimas de violência no Brasil. Ele assumiu que agrediu a mulher — a sequência de socos e empurrões foram registradas por câmeras de segurança e chamaram a atenção para o caso logo após a morte de Tatiane, ainda em julho de 2018 —, mas reafirmou que não matou.

Sentença é anunciada após júri ser adiado três vezes

Desde o começo da investigação, Manvailer é o único suspeito pela morte da mulher. A princípio, o julgamento foi marcado para dezembro de 2020, mas adiado pela defesa, o que ocorreu outras duas vezes: em janeiro e fevereiro de 2021.

Após a queda, ele levou o corpo de Tatiane para o apartamento, limpou vestígios de sangue no elevador, trocou de roupa e fugiu. Manvailer foi encontrado pela polícia após bater o carro em uma rodovia em direção à fronteira com o Paraguai, a aproximadamente 340 quilômetros do local do crime. Ele está preso há dois anos e nove meses na Penitenciária Industrial de Guarapuava.

Manvailer sempre negou o crime e diz que Tatiane morreu ao cair da sacada, ao contrário do que diz o laudo do IML, de que ela veio a óbito ao ser esganada e antes de cair do prédio.