Assassinato de petista não será enquadrado como crime de ódio, conclui polícia
A Polícia Civil do Paraná anunciou nesta sexta-feira (15) a conclusão do inquérito que investigou…
A Polícia Civil do Paraná anunciou nesta sexta-feira (15) a conclusão do inquérito que investigou em menos de uma semana o assassinato do guarda municipal petista Marcelo Arruda pelo policial penal bolsonarista Jorge Guaranho.
De acordo com a polícia, o crime ocorrido no último sábado (9) em Foz do Iguaçu teve motivo torpe e, tecnicamente, não será enquadrado como crime de ódio, político ou contra o estado democrático de direito, por falta de elementos para isso.
A polícia diz que tudo começou sim em uma provocação do bolsonarista seguida de discussão por questões política e ideológica. Mas que, para enquadrá-lo como um crime político, seriam necessários requisitos para isso, como o de tentar impedir ou dificultar outra pessoa de exercer direitos políticos.
Jorge foi indiciado por homicídio duplamente qualificado. Ele invadiu a festa de 50 anos de Marcelo, que tinha o PT como tema, e o matou —o bolsonarista acabou baleado pelo petista e segue internado em estado grave.
Segundo a polícia, na tarde de sábado, Jorge estava em um churrasco regado a bebidas e lá ficou sabendo da festa temática do PT e, diante disso, decidiu agir —um outro convidado do churrasco era funcionário do clube no qual Marcelo havia alugado o salão de festa e, por isso, tinha acesso às câmeras de segurança.
Esse funcionário visualizou as imagens do salão em meio ao churrasco, como rotina, segundo a polícia, e foi nesse momento, em meio a um roda de amigos, que o bolsonarista ficou sabendo da festa temática do PT —a polícia diz não ver nenhum crime por parte desse funcionário.
Segundo testemunhas, Marcelo e Jorge não se conheciam, e Jorge inicialmente invadiu o local da festa gritando palavras de ordem a favor de Bolsonaro e contra o PT e Lula.
Jorge estava em seu carro, com a esposa e uma criança no banco traseiro. Em meio a suas provocações, como mostram as imagens, Marcelo enche a mão com um punho de terra e pequenas pedras de um jardim na entrada do salão e o atira em direção ao carro de Jorge, que promete voltar e deixa o local.
Jorge então retorna minutos depois, agora armado e sem a esposa e a criança. O único foco dele era Marcelo, por causa da discussão anterior.
Jorge atira primeiro, o que levou a polícia a descartar legítima defesa. Ele efetuou quatro disparos, sendo que dois atingiram Marcelo, que revidou com dez disparos, sendo que quatro deles atingiram o bolsonarista.
Em resumo, segundo a polícia, Jorge foi inicialmente ao salão para provocar os participantes da festa por causa do tema político do aniversário. Mas, durante as discussões, passou a ter Marcelo como seu único foco. E que teria cometido o assassinato por impulso, após discussão, e não de forma premeditada.
“Chegamos à conclusão que vamos indiciar o agente penal pelo crime de homicídio qualificado por motivo torpe e por causar perigo a outras pessoas no local, que poderiam ter sido atingidas pelos disparos”, afirmou a delegada Camila Cecconello, chefe da investigação.
Marcelo era tesoureiro do PT municipal. No partido havia mais de dez anos, ele concorreu a vereador e a vice-prefeito pela sigla em eleições recentes.
Ainda segundo a polícia, Jorge foi agredido por três convidados da festa de Marcelo, quando caiu ferido no salão. Um inquérito sobre esse ponto específico segue em andamento —a polícia quer saber se as lesões em Jorge foram causadas ou agravadas por essas agressões.
A polícia afirma ainda que não haverá reconstituição do crime e que aguarda o resultado da apuração do Instituto de Criminalística para desvendar outros detalhes, como a dosagem alcoólica em ambos.
Durante as investigações, segundo a polícia, foram ouvidas 17 pessoas, entre as quais testemunhas que estavam no salão de festa, palco do assassinato, além de familiares do petista e do bolsonarista.
A conclusão do inquérito foi anunciada em entrevista do secretário estadual da Segurança Pública, Wagner Mesquita, da delegada-chefe da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa, Camila Cecconello, e do promotor Tiago Lisboa.
O crime em Foz provou forte reação do mundo político. O PT, por exemplo, recorreu à PGR (Procuradoria-Geral da República) com cobranças sobre mais segurança nas eleições. Já a Polícia Federal decidiu ampliar sua mobilização para proteger os presidenciáveis durante a campanha eleitoral.
Já o presidente Jair Bolsonaro (PL) desde o assassinato incluiu discurso dúbio sobre o crime, ataques à esquerda e, por último, uma ofensiva por sua imagem.
A ofensiva por sua imagem em ano de eleição teve seu ponto alto na terça-feira (12), quando usou um deputado federal aliado para se aproximar de uma ala da família de Marcelo mais simpática a ele.
Numa conversa por telefone com esses familiares, Bolsonaro se preocupou mais em se defender do que em se solidarizar com os parentes do petista assassinado. Ele disse que a esquerda tenta “politizar” a morte para desgastar o governo e convidou parentes para irem a Brasília.
A ligação por vídeo foi feita pelo deputado bolsonarista Otoni de Paula (MDB-RJ), que esteve na casa de um dos irmãos de Marcelo, com o aval de Bolsonaro, para intermediar a conversa. Segundo ele, o presidente falou com dois irmãos do petista assassinado: José e Luiz de Arruda.
A iniciativa, porém, irritou os familiares mais próximos de Marcelo, incluindo a viúva, Pâmela Suellen Silva. Ela afirmou ao UOL ter ficado surpresa com o telefonema do presidente aos irmãos de Marcelo (“absurdo, eu não sabia”, disse) e ressaltou que eles nem estavam na festa de aniversário onde ele foi assassinado.
O atirador Jorge, que está internado após também ser baleado por Marcelo, se define como conservador e cristão. Ele usa as redes sociais principalmente para defender Bolsonaro, se diz contra o aborto e as drogas e considera arma sinônimo de defesa.
Em junho de 2021, ele aparece sorrindo em uma foto ao lado do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do mandatário. “Vamos fortalecer a direita”, escreveu em 30 de abril numa corrente da “#DireitaForte” para impulsionar perfis de conservadores com poucos seguidores.
Sua última postagem antes do crime é um retuíte de uma publicação do ex-presidente da Fundação Cultural Palmares Sérgio Camargo, dizendo: “Não podemos permitir que bandidos travestidos de políticos retornem ao poder no Brasil. A responsabilidade é de cada um de nós”.