Mercado de trabalho

Auxílio emergencial não cobre queda na renda de SP, RS e DF

Concebido para amparar informais e beneficiários de programas sociais, auxílio foi mais eficiente aos que já estavam em cadastros de ações do governo

O auxílio emergencial superou a perda da massa de rendimentos causada pela pandemia em 22 estados do país no primeiro semestre de 2020. Cinco unidades federativas, porém, não acompanharam essa tendência. São Paulo, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul não tiveram as perdas compensadas pelo benefício.

Os dados fazem parte de estudo dos economistas Ecio Costa, da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), e Marcelo Freire, da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

De acordo com Costa, o auxílio emergencial foi concebido para amparar informais e beneficiários de programas sociais. Mas chegou de forma mais eficiente aos que já estavam em cadastros de ações sociais do governo.

Os cinco locais em que o benefício não repôs as perdas na renda têm um menor número percentual de pessoas cadastradas em programas sociais, segundo o pesquisador. “Ocorre o contrário no Norte e Nordeste, onde o cadastro inclui um número maior de beneficiários de programas sociais”, afirma.

Na análise do professor, o desenho do auxílio deveria ter sido aperfeiçoado, pois muitos informais terminaram não conseguindo acesso à ajuda emergencial.

Segundo o levantamento, em valores agregados, o Brasil teve uma perda acumulada de R$ 66,8 bilhões na massa de rendimentos (soma dos salários de todos os trabalhos das pessoas em determinado período, segundo levantamento do IBGE) no primeiro semestre de 2020 em comparação com igual período de 2019. Por outro lado, as evidências sugerem que a compensação em auxílio emergencial foi de R$ 108,3 bilhões apenas no segundo trimestre de 2020.

“Quando comparamos o auxílio com a queda na massa, no valor global ficou 61% acima da perda de renda das famílias”, explica o professor Ecio Costa.

Mas a liberação foi concentrada.

Em 22 estados, o valor liberado do benefício foi maior do que a perda de renda. São eles Minas Gerais, Pernambuco, Paraná, Bahia, Goiás, Rio de Janeiro, Piauí, Paraíba, Alagoas, Maranhão, Ceará, Mato Grosso, Sergipe, Tocantins, Acre, Santa Catarina, Roraima, Rondônia, Amapá, Amazonas, Rio Grande do Norte e Pará.

O estudo mostra que seis estados —Piauí, Pernambuco, Paraná, Goiás, Paraíba e Minas Gerais—tiveram perdas na massa de rendimentos equivale a mais da metade do foi ganho em auxílio. Já nos demais 12 estados essa relação é de 30%.

De acordo com o levantamento, na comparação com as nove parcelas programadas do auxílio, é possível verificar que o volume ainda é muito superior às perdas observadas no semestre. Há, inclusive, tendência de que as quedas na massa de rendimentos sejam revertidas nos terceiro e quarto trimestres, decorrentes da circulação dos recursos nas economias locais.

O professor Ecio Costa entende que o comportamento do segundo semestre de 2020 vai trazer os efeitos da flexibilização do isolamento social, que promoveu a reabertura de bares, restaurantes, shoppings e do comércio de rua em todo o Brasil.

A redução do auxílio, avalia o pesquisador, tende a ser coberta pelos ganhos provenientes da reabertura gradual em diferentes segmentos de negócio.

Comércio foi beneficiado pelo auxílio

O cruzamento de dados do auxílio com o resultado do comércio identifica que a liberação de um volume maior do benefício influenciou na recuperação dos estados.

Enquanto estados do Norte e Nordeste tiveram um boom no varejo, catapultados pelo auxílio governamental, o varejo no Distrito Federal e Rio Grande do Sul ainda não recuperaram o nível pré-crise.O comércio em São Paulo, por sua vez, teve um crescimento tímido, enquanto Mato Grosso do Sul e Espírito Santo observaram aumento inferior a outras áreas do país.

Daniel Duque, pesquisador da FGV, explica que estadis do Norte e Nordeste foram mais afetados em termos de mercado de trabalho, especialmente por terem empregos concentrados no setor informal, e são regiões que possuem uma população mais vulnerável em termos de atividade econômica.

“No entanto, essas regiões, por serem mais vulneráveis, eram mais pobres e com massa de rendimento menor. Como o auxílio tem valor fixo de R$ 600 [reduzido para R$ 300 a partir de outubro] e atingiu os mais pobres e informais, tivemos uma compensação muito grande da renda nessas regiões em que havia parcela menor de rendimentos”, explicou o pesquisador.

Um estudo de Duque apontou que os 30% mais pobres do país tiveram aumento de renda em relação a 2019 graças ao auxílio emergencial. “Os estados mais pobres tiveram um ganho de renda e estão com mais recursos”.

Otto Nogami, economista do Insper, destaca ainda que os quatro estados que receberam menos recursos e o Distrito Federal estão entre os mais afetados pelo colapso no setor de serviços, que segue sem recuperar as perdas na pandemia.

“Nos aglomerados urbanos, o setor de serviços tem um peso maior. Na medida que restaurantes, bares, lanchonetes e hotéis ligados ao turismo são fechados, o impacto é muito grande sobre uma parcela maior de trabalhadores”, diz.

Ele ainda aponta que a situação econômica deve se complicar em vários locais após o fim do auxílio.