Boatos sobre Marielle Franco se espalham nas redes sociais
A internet está dividida. De um lado, milhares compartilham homenagens, memórias afetuosas e palavras de…
A internet está dividida. De um lado, milhares compartilham homenagens, memórias afetuosas e palavras de ordem. Do outro, mentiras, calúnias e ofensas são publicadas (e curtidas) sem checagem. Na noite em que o assassinato de Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes chocou o país, uma média de 594 menções por minuto ao nome da vereadora foi registrada no Twitter, segundo um estudo da Diretoria de Análises de Políticas Públicas (Dapp) da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Nos dias seguintes, as hashtags ganharam fôlego. Com um porém. Do total de citações ao caso, 7% passaram a levantar suposições não comprovadas sobre a mulher nascida e criada na Favela da Maré, na Zona Norte do Rio. A desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) Marília Castro Neves chegou a acusá-la de engajamento com bandidos do Comando Vermelho. Foi o estopim para uma série de boatos pipocarem na web.
— Parece que querem executá-la pela segunda vez — declara o procurador regional Sidney Madruga, da equipe responsável por investigar políticos e candidatos a cargos públicos: — Marielle estava fora de nosso radar. Não temos nenhuma informação sobre qualquer comportamento negativo dela. É tudo “fake news”. Nas redes sociais, o que a gente assiste é uma descarga de ódio, racismo e preconceito. As pessoas estão tentando justificar uma morte injustificável.
Abaixo, listamos (e provamos a essência mentirosa) de algumas das informações incorretas que têm circulado na internet.
“Marielle Franco foi eleita pelo Comando Vermelho”: É BOATO
Dados do Tribunal Regional Eleitoral do Rio mostram que o maior índice de votos da vereadora foi registrado em bairros da Zona Sul, reduto da classe média e da classe média alta da cidade. Cerca de 32% dos eleitores são provenientes de bairros como Jardim Botânico, Laranjeiras, Copacabana e Catete. Em Ramos, região que abrange a Favela da Maré — área estigmatizada pela ação do tráfico de drogas, e onde Marielle nasceu, viveu e se projetou na carreira política — a vereadora recebeu o menor número de votos (apenas 187). A afirmação proferida pela desembargadora Marília Castro Neves é, portanto, errada. Confira abaixo os números de votos recebidos por Marielle em cada bairro.
“Marielle Franco era ex-mulher de Marcinho VP”: É BOATO
A imagem de um casal é falsamente atribuída a Marielle Franco e ao traficante Marcinho VP. Os dois jamais se encontraram. O texto que circula em grupos de Facebook e WhatsApp também não especifica qual dos dois traficantes conhecidos como Marcinho VP está em questão. Não precisava, aliás: Márcio Santos Nepomuceno, do Complexo do Alemão, está preso desde 1997; Márcio Amaro de Oliveira, do Morro Santa Marta, permaneceu um longo período distante do Rio antes de sua morte, em 2003, como relatado no livro “Abusado — O dono do Morro Dona Marta”.
Uma busca em sites de pesquisa prova que a fotografia (acima) foi publicada num fotolog intitulado “Ktaputas”. Sem a tarja, a imagem ganha outra dimensão. A mulher não tem qualquer semelhança com Marielle Franco. O homem tampouco carrega traços parecidos com nenhum dos dois homens conhecidos como Marcinho VP.
“Marielle engravidou aos 16 anos”: É BOATO
Marielle Franco tinha 38 anos quando foi assassinada. A vereadora deixou uma filha de 19 anos chamada Luyara Santos. Ou seja, ela pariu a jovem aos 20 anos — e engravidou aos 19. Casada com Monica Benício, a mulher vivia com a adolescente numa casa de vila na Tijuca.
“Marielle fazia campanhas injustas contra policiais”: É BOATO
É verdade que Marielle Franco questionava determinadas ações truculentas da Polícia Militar do Rio. A última denúncia da vereadora se concentrava sobre operações numa favela em Irajá, na Zona Norte. “O 41º BPM está aterrorizando e violentando moradores de Acari. Nessa semana dois jovens foram mortos e jogados no valão”, escreveu ela, nas redes sociais. Mas ela nunca ficou de um lado só. Na época em que foi assessora da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio, a vereadora auxiliou familiares de vítimas de homicídios ou policiais vitimados. Rose Vieira, que perdeu o filho, o policial Eduardo Oliveira, em 2002, é uma das beneficiadas pela ajuda de Marielle — à época, até a ex-presidente Dilma Rousseff fez questão de encontrá-la.