Brasileiros são os que mais temem violência no mundo, aponta índice de paz global
Apesar de temer, o Brasil não está entre aqueles em que a população mais passou por situações violentas
Os brasileiros são os que mais temem a violência ao redor do globo, com 83% da população do país muito preocupada com isso, aponta o Global Peace Index 2021, que mede o nível de paz e a ausência de violência em 163 nações.
Divulgado nesta quinta-feira (17) pelo think tank independente australiano Institute for Economics and Peace (IEP), o índice mostra que, em relação ao medo da violência, o Brasil está acima da média mundial de 60%. O problema foi visto ainda como o maior risco para a própria segurança para 64% da população, à frente de questões como saúde, mesmo no ano da pandemia do coronavírus.
Apesar de ser o país que mais teme a violência, o Brasil não está entre aqueles em que a população mais passou por situações violentas nos últimos dois anos -índice que está em 40%, mais de 20 pontos atrás da Namíbia, líder nesse aspecto do ranking com 63%.
“O Brasil pode não ser o país mais violento do mundo, mas tem níveis excepcionais de violência, assim como a América do Sul“, afirma Steve Killelea, fundador e presidente do IEP. “Possivelmente, isso [o medo da violência] pode estar relacionado ao nível de denúncia dos crimes e a várias pessoas se comunicando em redes sociais.”
Killelea também aponta que 58% dos brasileiros se sentem menos seguros do que há cinco anos. O indicador vai na contramão da tendência mundial, que aponta que 75% das pessoas dizem se sentir tão ou mais seguras do que há cinco anos.
Outro ponto em que o Brasil nada contra a corrente é a taxa de homicídios, que, apesar da pandemia, cresceu no país, enquanto 116 nações reduziram seus índices desde 2008. No primeiro semestre do ano passado, 25.712 pessoas foram mortas, número 7% maior do que o registrado no mesmo período de 2019, segundo estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que compila estatísticas de criminalidade no país.
Esses foram alguns dos fatores que levaram o Brasil a não avançar sua posição no ranking, permanecendo com um nível de paz considerado baixo. A pesquisa, realizada entre janeiro de 2020 e março de 2021, é baseada em 23 indicadores agrupados em três domínios: segurança, militarização e conflitos contínuos.
O estudo mede o nível de violência física, de armamentos e de criminalidade, excluindo terror psicológico e intimidações verbais.
No ranking geral, o Brasil permaneceu na 128ª posição, com pioras em indicadores como mortes por conflitos internos e terror político e avanços em questões como impacto do terrorismo e instabilidade política. Em 2020, o país era o 126º, mas a mudança não é considerada uma queda devido a atualizações nos dados.
Já na América do Sul, o Brasil ocupa o 9º lugar, à frente apenas de Colômbia e Venezuela. Na região, o Uruguai segue como líder, apesar de ter registrado a maior piora em seus índices dentre os sul-americanos. Isso se deve, principalmente, à instabilidade política, aos protestos e aos crimes violentos. Por outro lado, a Argentina, na 3ª posição no continente, foi o país que mais avançou, com quedas nos índices de terror político e instabilidade política.
Como um todo, a América do Sul foi a segunda que mais piorou seu nível de paz, atrás apenas da América do Norte. Os EUA, que avançaram sete posições no ano passado, caíram duas no ranking geral deste ano.
Apesar de ter melhorado no indicador de impacto do terrorismo, o país norte-americano piorou nas questões de instabilidade política, conflitos internos e protestos violentos. O presidente do IEP aponta que esses fatores estão ligados à turbulenta eleição presidencial no ano passado, que culminou na invasão do Capitólio por apoiadores do ex-presidente Donald Trump no dia 6 de janeiro.
Além disso, os EUA viram ainda diversas manifestações contra o racismo e a violência policial contra a população negra, que tiveram registros de violência.
Esses protestos se espalharam pelo mundo e fazem parte das 15 mil manifestações identificadas pelo índice ao redor do globo, 5.000 delas relacionadas à Covid-19.
No ano passado, inclusive, os protestos violentos aumentaram 10%, mesmo em meio às restrições impostas pela pandemia. Esse crescimento é uma tendência que já vinha acontecendo, com um aumento de 244% desses atos entre os anos de 2011 e 2019.
A Belarus, comandada pelo ditador Aleksandr Lukachenko, foi palco de muitos desses protestos, o que colaborou para o país ter a segunda pior deterioração no índice e cair 19 posições em relação a 2020. Lá, a reeleição do autocrata, apontada como fraudulenta, levou a população às ruas durante meses, o que motivou uma forte repressão das forças de segurança.
Essa instabilidade política e protestos violentos em diferentes países ajudaram a diminuir em 0,07% o nível de paz mundial, segundo o estudo, que está em sua 15ª edição. É a nona queda registrada nos últimos 13 anos, mas a segunda menor na série histórica.
Também colaborou para a piora o indicador de militarização, que vinha melhorando até o ano passado. Segundo o presidente do IEP, essa queda se deve principalmente à bélica relação entre EUA e Rússia e entre americanos e chineses.
Pelo lado positivo, pela primeira vez desde 2015 houve melhora do índice de conflitos permanentes, com queda nas mortes em campos de batalha e também no nível e na intensidade dos combates. Segundo Killelea, isso se deve, ao menos em parte, Às restrições impostas para conter o coronavírus.
O estudo aponta que, se por um lado os conflitos e as crises da década passada estão diminuindo, eles devem ser substituídos “por uma nova onda de tensão e incerteza como um resultado da pandemia da Covid-19 e do aumento das tensões entre muitas das principais potências”.
O presidente do IEP vê três áreas como protagonistas dos problemas futuros. “Muito vai depender de quão bem o mundo vai se recuperar economicamente da Covid-19 nos próximos anos”, diz.
Nesse sentido, instabilidade política e protestos violentos são as principais preocupações, principalmente em países que não conseguirem se recuperar economicamente da pandemia, avalia Killelea. Além disso, a tendência de queda na militarização parece ter chegado ao fim e deve aumentar nos próximos anos.