Câmara autoriza o uso ‘pílula do câncer’
Sem qualquer comprovação científica de sua eficácia, fosfoetanolamina sintética poderá ser distribuída a pacientes que sofrem com tumores malignos
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O plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira o projeto de lei que autoriza o uso da chamada pílula do câncer para pacientes diagnosticados com tumores malignos. A matéria foi aprovada em votação simbólica e agora segue para análise do Senado.
A fosfoetanolamina sintética foi desenvolvida pelo Instituto de Química da USP de São Carlos e, após uma decisão da Justiça, passou a ser distribuída a pacientes com câncer, mesmo sem a comprovação dos benefícios da substância no tratamento de tumores.
Para ser aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), seria necessário que a substância passasse por, pelo menos, três fases de estudos clínicos que visam avaliar a eficácia e segurança do composto. Para se ter uma ideia, a pesquisa sobre os efeitos da fosfoetanolamina sintética em humanos só terá início em abril no Estado de São Paulo. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Conselho Nacional de Saúde (Conep) liberou na última sexta-feira os testes pela Secretaria de Saúde do Estado.
A grande procura – que levou à distribuição de senhas e o temor de que aumente ainda mais o número de interessados – fez com que a USP divulgasse um comunicado em que alega que não é indústria química ou farmacêutica e não tem condições de atender demanda em larga escala.
O projeto aprovado na noite de noite permite a “produção, manufatura, importação, distribuição, prescrição, dispensação, posse ou uso da fosfoetanolamina sintética” independentemente de registro sanitário, em caráter excepcional, enquanto estiverem em cursos os estudos clínicos da substância. É exigido, no entanto, que os agentes estejam regularmente autorizados e licenciados pela autoridade sanitária competente.
O uso da pílula do câncer, conforme o texto, fica condicionado a apresentação de laudo médico que comprove o diagnóstico da doença e assinatura de termo de consentimento e responsabilidade pelo paciente ou seu representante legal.
Exceção
Segundo a relatora da proposta pela Comissão de Seguridade Social e Família, deputada Leandre (PV-PR), o Brasil não tem laboratórios oficiais que produzam o medicamento para consumo. “O País tem apenas laboratórios químicos oficiais e não farmacêuticos”, afirmou, destacando a necessidade de quebra de patente para a produção por outros laboratórios.
Na discussão em Plenário, uma das preocupações dos deputados foi o acesso da população à substância, de preferência com distribuição pública e gratuita.
O deputado Glauber Braga (Psol-RJ) questionou a relatora quanto à possibilidade de o medicamento ser vendido por um preço abusivo mesmo com a permissão temporária. “Queremos que as pessoas tenham acesso ao medicamento sem pagar um preço abusivo por ele”, afirmou.
Histórico
A fosfoetanolamina é pesquisada pelo Instituto de Química de São Carlos, da Universidade de São Paulo, há cerca de 20 anos por meio de estudos conduzidos pelo professor aposentado da universidade Gilberto Orivaldo Chierice.
A substância imita um composto que existe no organismo, o qual sinaliza as células cancerosas para que o sistema imunológico as reconheça e as remova. Os resultados podem variar de acordo com o sistema imunológico de cada paciente, mas há vários relatos de casos de regressão agressiva da doença e até de cura.
A fosfoetanolamina vinha sendo distribuída de forma gratuita no campus da universidade, em São Carlos, mas, em 2014, a droga parou de ser entregue por causa de uma portaria determinando que substâncias experimentais tivessem todos os registros antes de serem disponibilizadas à população.
Sem a licença da Anvisa, essas substâncias passaram a ser entregues somente se determinadas pela Justiça por meio de liminares, que chegaram a ser suspensas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. O presidente do TJ-SP, desembargador José Renato Nalini, reconsiderou a decisão e informou, em outubro de 2015, que os pacientes que necessitam da substância deveriam entrar com um pedido na Justiça.
Atualmente, cada cápsula tem um custo de produção de menos de R$ 0,10 e, apesar do interesse de outro país em fabricar o medicamento, o professor Chierice argumenta que isso tornaria inviável o acesso à fosfoetanolamina pelo preço de venda.