GRANDE SÃO PAULO

Câmeras escondidas flagram violência policial na cracolândia; assista

Com câmeras escondidas no topo de prédios, cenas de violência policial foram flagradas desde o…

Com câmeras escondidas no topo de prédios, cenas de violência policial foram flagradas desde o fim de dezembro do ano passado na região da cracolândia, no centro de São Paulo. As imagens gravadas por estes equipamentos foram divulgadas nesta segunda-feira (5) pelo coletivo “A Craco Resiste”.

“São ataques de surpresa e sem necessidade com spray de pimenta e bombas de gás lacrimogêneo. Socos e empurrões quando os guardas não sabem que estão sendo filmados. Isso enquanto as pessoas estão sentadas, distraídas ou simplesmente passando”, diz o dossiê.

A prefeitura argumenta que as gravações mostram apenas “um recorte” das ações e que há investigações em casos de desvio de conduta ou protocolo de atendimento (leia mais abaixo). A SSP (Secretaria Estadual da Segurança Pública) ainda não se manifestou.

Pelas imagens, é possível acompanhar ações que não foram feitas num revide policial contra os dependentes químicos, mas, sim, partiam dos policiais e guardas civis contra a população de rua.

O movimento registrou pelo menos 12 ações entre a noite de 31 de dezembro do ano passado e o fim da tarde de 29 de março de 2021 —durante a pandemia do novo coronavírus. “As imagens deixam claro que não existe razão para a imensa maioria das ações do que violentar de maneira cruel as pessoas em situação vulnerável. Não são desvios de conduta de dois guardas ou três policiais, é o projeto da prefeitura de São Paulo”, afirma a Craco Resiste.

De acordo com relatório obtido pelo movimento por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), se considerado o intervalo entre setembro de 2020 e março de 2021, a prefeitura gastou, pelo menos, R$ 60.247,12 em munições ditas não letais. Com esse valor, seria possível distribuir mais de 6 mil refeições às populações vulneráveis durante a pandemia.

Roberta Costa, 33, militante da Craco Resiste, afirma que as imagens ajudam a entender a dinâmica “que acontece na região há décadas”: “No fundo, não é o policial que jogou o spray no culpado. É uma lógica, uma política pública. A gente sempre mostrou e sempre foi dito que era um caso isolado. Agora, dá para dizer que não é nem que a prefeitura deixa acontecer, mas sim uma política pública.” Ainda de acordo com a militante, nenhuma questão complexa tem solução simples.

Enquanto a gente não conseguir olhar para todo o conjunto de coisas, como moradia, encarceramento e liberação das drogas, o problema não será resolvido. Mas, de imediato, a gente quer que, no mínimo, que esse massacre se encerre, que as pessoas que já são resultado de diversos problemas sociais não fiquem levando nas costas, no olho e na cabeça.

Roberta Costa, militante da Craco Resiste

Na tarde de hoje, a Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) enviou um ofício ao MP (Ministério Público) com as imagens divulgadas no dossiê. Segundo a OAB, as gravações mostram usos excessivos das forças, além de suposta prática de tortura.

O que diz a prefeitura

A prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Segurança Urbana, afirmou que as imagens fornecidas não permitem uma análise apropriada, pois “não mostram toda a dinâmica das ocorrências, mas apenas um recorte da ação dos guardas”.

“A Corregedoria da Secretaria Municipal de Segurança Urbana apura situações em que há desvio de conduta ou protocolo de atendimento, impondo medidas disciplinares específicas. Os agentes em campo devem obedecer estritamente aos protocolos estabelecidos para uso progressivo da força”, diz.

Ainda segundo a gestão municipal, “para que esta atuação seja acolhedora e humanizada, os agentes participam de capacitações diversas, em parceria com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania e com a Defensoria Pública, aprofundando a compreensão de legislação específica e conceitos de direitos humanos”.

A prefeitura afirma, também, que a comparação entre gastos com segurança e fornecimento de alimentos é descabida. “Apesar de sempre ser pontuado que a solução para os usuários não é exclusivamente de segurança, a atuação da GCM é fundamental para apoiar as políticas públicas desenvolvidas nas áreas da assistência social, saúde e limpeza, por exemplo”, acrescenta.

A Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social afirma distribuir mil refeições diárias (500 almoços e 500 jantares) na região. Já a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania mantém pontos do programa Rede Cozinha Cidadã na Luz, que distribuiu mais de 2,4 milhões de marmitas em toda a cidade durante a pandemia.

Procurada, a SSP não comentou as gravações até a publicação desta reportagem. Caso haja posicionamento, o texto será atualizado.

Assista às imagens: