Celso Amorim visita Cuba e defende ‘grande amizade’ entre Brasil e ilha
Governo brasileiro calcula montante de dívidas contraídas por Havana com Brasília. Maior parte está relacionada ao financiamento das obras do Porto de Mariel
O assessor especial do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-chanceler Celso Amorim, encontrou-se com o líder de Cuba, Miguel Díaz-Canel, nesta sexta-feira (18) e disse que o Brasil pretende restaurar laços comerciais e políticos com a ilha. A viagem dele a Havana foi um pedido direto do presidente brasileiro, apontou o diplomata.
“Queremos fazer da relação entre Brasil e Cuba uma relação exemplar, uma relação de grande amizade, que também contribua para a paz em nossa região, porque a paz é o grande objetivo da diplomacia; crescimento econômico também, mas a paz é fundamental”, disse o diplomata.
No início do mês, Amorim afirmou à Folha que a viagem serviria como uma espécie de “prospecção” para entender de que forma o governo brasileiro poderia ajudar o país.
Mas nem o governo brasileiro nem o regime cubano divulgaram o conteúdo da conversa entre os dois. A ditadura, no entanto, publicou na sexta um texto com respostas de Amorim a sua assessoria de imprensa. Na entrevista, ele apontou que técnicos da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) irão a Cuba em menos de um mês.
Um grupo de empresários também deve embarcar para Havana nas próximas semanas. Amorim não informou nomes da comitiva nem de quais setores econômicos os empresários fazem parte. Em junho, a Folha mostrou que o Brasil promoveria uma missão da Apex, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, na ilha, que enfrenta grave crise financeira.
Havana tem dívidas com Brasília, mas o governo brasileiro afirma ainda estar calculando o valor dessa dívida -maior parte do montante está relacionada ao financiamento das obras do Porto de Mariel. Amorim disse no início do mês, entretanto, que a viagem não teria como objetivo fazer nenhuma negociação. Para ele, Cuba sempre foi excelente pagadora, mas a situação econômica do país foi agravada pelo recrudescimento das sanções dos Estados Unidos e pela pandemia de Covid-19.
O diplomata brasileiro também afirmou na sexta que especialistas do Ministério da Saúde visitarão o país “porque Cuba está muito desenvolvida nisso [saúde]”. “Sabemos de todo esse progresso”, acrescentou.
Cuba foi parte fundamental do programa Mais Médicos, criado pelos governos petistas. A iniciativa importava médicos cubanos, que trabalhavam principalmente em cidades afastadas dos grandes centros urbanos. Parte de seus salários, no entanto, era transferida para o regime cubano.
O programa foi esvaziado pelo governo Jair Bolsonaro, que criou uma nova iniciativa. O Médicos pelo Brasil tinha em 2022 cerca de 3.000 médicos contratados, ao passo que o Mais Médicos passou de 18 mil, atuando em 4.058 municípios.
Ainda na conversa com jornalistas, Amorim disse que Cuba está em seu coração, “com muita força” e que acompanhou “um pouco da Revolução Cubana de longe”. Afirmou também que se interessa pelo cinema cubano e que não se esquece do filme Memórias do Subdesenvolvimento, de Tomás Gutiérrez Alea -que aborda a revolução liderada por Fidel Castro.
Miguel Díaz-Canel, por sua vez, postou na plataforma X, o ex-Twitter, que teve um encontro agradável com Amorim. “Ratificamos nossa disposição de avançar em setores prioritários e com oportunidades para o desenvolvimento das relações bilaterais em benefício de ambos os povos”, escreveu.
A viagem de Amorim ocorre em meio a uma virada na relação entre os países. Desde 2016, a missão brasileira na ilha era chefiada por um encarregado de negócios, na esteira do distanciamento entre Havana e Brasília ocorrido após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O regime cubano tratou o episódio como um golpe de Estado parlamentar.
De lá para cá, apenas altas autoridades brasileiras visitaram o país insular: Ricardo Barros (PP-PR), então ministro da Saúde de Michel Temer (MDB), em 2018; e Daniela Carneiro, ex-ministra do Turismo, este ano.
Cuba e Brasil encerraram oficialmente o período de estremecimento pouco depois de Lula assumir a Presidência, quando ambos os países nomearam embaixadores. Em fevereiro, o petista indicou para o posto Christian Vargas, à época diretor do Departamento de Integração Regional do Itamaraty.
Lula esteve com Díaz-Canel em junho, durante a Cúpula do Novo Pacto Financeiro, em Paris, liderada pelo presidente francês, Emmanuel Macron. Segundo interlocutores do governo brasileiro, na ocasião os dois líderes discutiram a conjuntura mundial e da América Latina.