PANDEMIA

Com UTIs lotadas, SC tem baladas com fila, festas no mar e burla a fiscais

Sem máscaras e aglomerados, baladeiros ignoram medidas sanitárias no litoral catarinense

Festa com barcos em uma baía de Santa Catarina (Foto: Polícia Militar de Santa Catarina)

“Pessoal, todo mundo sentadinho com a máscara, tá?” O aviso feito ao microfone de um bar no centro de Florianópolis poderia ser um alerta para evitar a contaminação pela Covid-19, mas se tornou símbolo do desrespeito às regras sanitárias em Santa Catarina. Em crise na saúde, a capital catarinense está com 92% de suas UTIs públicas ocupadas com pacientes graves de coronavírus.

O recado para sentar e colocar a máscara foi dado momentos antes da chegada dos agentes de fiscalização ao local. Quando os fiscais saem, os baladeiros levantam, retomam a festa e o show continua.

O teatro para burlar a fiscalização foi publicado nas redes sociais de um baladeiro na última sexta-feira (16) com deboches ao cumprimento das regras sanitárias. Ele escreveu “é tchau pra quem vigia [sic]” na postagem. O registro mostra o que ocorre em muitas das festas que se multiplicam nos fins de semana no estado.

Mas, algumas, são denunciadas. Um dos últimos alvos da fiscalização foi um evento em Governador Celso Ramos, na Grande Florianópolis no sábado (17). A festa cladestina reuniu 23 embarcações em torno de um show ao vivo em um deck flutuante.

Para a diretora da Vigilância em Saúde de Florianópolis, Priscilla Valler dos Santos, as baladas representam “um total desrespeito” a todos que enfrentam um dos momentos mais críticos da pandemia. “[Um desrespeito] com todos os nossos profissionais de saúde, assim como com os mais de 850 cidadãos de Florianópolis que perderam a vida em decorrência da Covid-19 e tantos outros que estão lutando por ela nas UTIs da cidade”, diz.

As denúncias de festas ocorrem com frequência. Em Jurerê Internacional, os moradores reclamam das baladas nos beach clubs, que possuem estruturas de grande porte instaladas na areia da praia.

“A concessão das licenças de funcionamento autoriza baladas em número extremamente superior ao desejado, pois se baseia na área ocupada pelos estabelecimentos”, diz o presidente da Associação de Moradores de Jurerê Internacional, Bernardo Boiteux.

“As autoridades batem cabeça e o que vemos são ordens e contraordens de abertura e fechamento das casas. Alega-se prejuízo ao turismo e atividades comerciais. Infelizmente, não priorizam a saúde, a vida. E já temos mais de 12 mil catarinense mortos.”

Nas cenas, os festeiros permanecem sem máscara mesmo com a chegada da Polícia Militar e da Marinha do Brasil. O decreto em vigor no estado impõe multa de R$ 500 para quem deixa de usar a máscara. Segundo a Capitania dos Portos de Santa Catarina, 26 embarcações foram abordadas e quatro foram autuadas por irregularidades na documentação.

No fim de semana anterior, outro vídeo mostrou aglomeração em uma balada eletrônica em alto-mar na mesma região. As cenas foram publicadas nas redes sociais de um participante que zomba de quem não está na festa. “A galera em casa indignada […] Ihuuuuuu”. As imagens mostram o embarque dos jovens e cenas da festa com o barco em movimento.

Balneário Camboriú, no litoral norte, é outra cidade turística onde as baladas são denunciadas com frequência. “Aqui, as pessoas vêm para curtir e não se cuidam, como se não existisse Covid”, diz a psicóloga Mayane Oliveira da Silva, que relata ser coagida quando tenta alertar sobre o desrespeito. “A gente vai cobrar que as pessoas sigam o decreto e é mal interpretada. O que eu mais vejo são pessoas negacionistas.”

“É só passear pela orla que você vê aglomerações”, diz Jaline Rocha, que também mora na cidade. “No início, posso dizer que me sentia uma palhaça. Hoje, é mais indignação, mais pena do ser humano. Ou o povo deixa de lado o egoísmo e a ignorância ou continuaremos nesse caos.”

Os anúncios das festas são publicados nas redes sociais dos estabelecimentos. “Hoje é dia de aproveitar, curtir, dançar e beber. Seguindo todos os procedimentos recomendados pela OMS!”, diz a descrição de um dos anúncios.

Em alguns locais, há filas para entrar. “Vocês acham que é coincidência estar morrendo gente?” diz um motorista que gravou um vídeo ao passar em frente a um bar no centro de Florianópolis com fila de espera.

Proporcional ao crescimento das filas das baladas está o de espera por leitos de UTI. O índice de lotação dos leitos de Santa Catarina está na capacidade máxima desde janeiro.

O estado passa por aumento no número de casos desde novembro, com pico de contaminação e mortes em março. Os meses de verão de 2021 foram os mais críticos. Em três meses deste ano morreram mais catarinenses do que todo o ano passado.

A concentração de pessoas em espaços públicos está proibida, incluindo praias, onde apenas a prática de esportes individuais é permitida. No entanto, os finais de semana e feriados apresentam movimento de moradores e turistas no litoral catarinense.

Desde o início da pandemia, Santa Catarina contabilizou 855.902 casos e 12.582 mortes por Covid.O número de casos ativos e de óbitos apresentou queda no mês de abril, mas ainda há superlotação nos hospitais e todas as regiões do Estado estão classificadas no mapa de monitoramento em nível gravíssimo para o risco de contaminação.