Comissão de Direitos Humanos pede proteção para adolescentes venezuelanas
Medida protetiva visa resguardar família refugiada citada por Bolsonaro, alvo de notícia-crime junto ao STF para investigação do caso
A Comissão de Direito Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal entrou com representação junto à Defensoria da Infância e Adolescência para garantir medida protetiva para as três adolescentes venezuelanas citadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em entrevista que viralizou nas redes sociais.
A solicitação foi encaminhada na noite deste domingo (16), após a divulgação de que a primeira-dama Michelle Bolsonaro e a senadora eleita Damares Alves (Republicanos-DF) fariam uma visita à família que vive em São Sebastião, na periferia de Brasília.
“Nossa preocupação é com a integridade física da família de refugiados, dada a precarização da situação dela no país”, afirma o deputado distrital Fábio Félix (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos.
A presença da imprensa e de assessores da Presidência da República na unidade de São Sebastião da Cáritas, entidade que presta apoio aos refugiados, na tarde deste domingo, motivou a mobilização de entidades de proteção à infância no DF.
“A simples presença de funcionários da presidência, fazendo uma visita precursora antes de uma eventual ida da primeira-dama ao local, já é uma situação de intimidação”, entende o parlamentar.
Depois da repercussão da fala do presidente sobre um encontro com as “menininhas” bonitas de 14, 15, anos”, onde “pintou um clima” e que as venezuelanas estavam “ganhando a vida”, sugerindo uma situação de exploração sexual, a família não foi mais localizada na região.
Venezuelanas rechaçam Bolsonaro
Uma das venezuelanas visitadas por Bolsonaro rechaçou a fala do presidente sobre ter encontrado adolescentes vindas da Venezuela “arrumadas para ganhar a vida”.
A mãe, as duas filhas e uma sobrinha teriam se mudado há dez dias do local onde se encontraram com o presidente em abril, conforme o relato dele na entrevista que teve impacto negativo na campanha presidencial.
Um assessor da Comunicação Social da Presidência da República, que se apresentou para a funcionária da Cáritas como Márcio, informou no começo da noite de domingo, por telefone, que a visita da primeira-dama não era mais cogitada.
“Não tem previsão de agenda para hoje. Quando tiver previsão, a gente entra em contato pra ficar uma coisa bacana”, disse ele, explicando que foi à entidade após jornalistas divulgarem que Michelle Bolsonaro estava indo para o local. “Inclusive fomos aí para tentar entender o que estava acontecendo.”
No primeiro debate do segundo turno das eleições, promovido por Folha, UOL, TV Band e TV Cultura, o presidente negou se tratar de pedofilia sua fala ao podcast rubro-negro no dia 14.
“Parei a moto numa esquina, tirei o capacete e olhei umas menininhas, três, quatro, bonitas, de 14, 15 anos, arrumadinhas num sábado, numa comunidade. E vi que eram meio parecidas. Pintou um clima, voltei, ‘posso entrar na tua casa?’ Entrei. Tinha umas 15, 20 meninas, [num] sábado de manhã, se arrumando —todas venezuelanas”, disse Bolsonaro.
E concluiu: “Eu pergunto: meninas bonitinhas, 14, 15 anos se arrumando num sábado para quê? Ganhar a vida. Você quer isso para a tua filha, que está nos ouvindo aqui agora? E como chegou neste ponto? Escolhas erradas”.
“Essa fala do presidente da República reproduz tudo que sempre batalhamos para desconstruir: o machismo, a erotização, culpabilizar meninas vulneráveis”, afirma Karina Figueiredo, coordenadora do Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Criança e Adolescentes.
O grupo Prerrogativas, formado por juristas e advogados, apresentou uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo que o presidente seja investigado.
A iniciativa se soma a de oito parlamentares da bancada do PSOL na Câmara dos Deputados que também pedem investigação para os fatos narrados pelo próprio Bolsonaro.
“É estarrecedora e causou indignação a fala do Presidente Bolsonaro. Estamos falando do Brasil, país que ocupa o segundo lugar em um triste ranking: o de exploração sexual de crianças e adolescentes, atrás da Tailândia. Por ano, de acordo com um panorama organizado pelo Instituto Liberta, são 500 mil vítimas”, diz o texto da notícia-crime, que leva assinatura de deputados como Luiza Erundina, Sâmia Bomfim e Ivan Valente.
É destacado na representação ao STF o “completo desrespeito de Bolsonaro para com as mulheres (adultas ou crianças) evidenciado também na disponibilidade orçamentária e nas políticas públicas: no atual Governo, em valores já atualizados pela inflação, temos o menor orçamento de toda a história destinado a ações de combate à violência contra a mulher”.
Segundo a ação, o orçamento para este conjunto de ações em 2021 foi apenas 0,67% do valor liquidado em 2014 durante o governo Dilma, o maior da série histórica.