Delegados dizem que governo ‘engavetou’ projeto da PF
Eles acreditam que sofrem retaliação; projeto de outra corporação foi aprovado
Delegados da Polícia Federal estão inquietos. Não escondem o inconformismo e a insatisfação com o governo. Eles afirmam que o Palácio do Planalto “engavetou” projeto de reestruturação da corporação, apresentado em 2009, ainda no governo Lula.
Os delegados afirmam que não querem dar conotação política ao caso mas alegam que “às portas das eleições” o governo apressou-se em sancionar lei que cria 354 “funções de confiança”, denominadas “funções comissionadas”, além de 969 funções gratificadas destinadas ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal.
A Lei 13.027 foi sancionada em 24 de setembro de 2014. É a lei da Polícia Rodoviária Federal.
Os delegados sustentam que o ‘engavetamento’ do projeto da PF caracteriza uma retaliação do governo – embora, publicamente, a presidente Dilma Rousseff declare que dá “total autonomia” à instituição.
Ambas as corporações, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal, são vinculadas ao Ministério da Justiça.
Os delegados não questionam o projeto da Polícia Rodoviária Federal, nem querem criar área de atrito. Reconhecem a PRF como parceiro importante no combate ao crime organizado. Mas cobram do governo um tratamento igual, com a aprovação do projeto da PF, que prevê reestruturação de unidades e chefias e criação da Função Comissionada Policial – pela qual as chefias de unidades da instituição somente poderiam ser ocupadas por servidores de carreira.
O projeto amplia o número de chefias com direito a essa função. O que deixa os delegados indignados é que o texto foi preparado ainda no governo Lula, gestão do então diretor geral da PF, delegado Paulo Lacerda, depois revisado na administração do delegado Luiz Fernando Correa.
A aprovação do projeto chegou a ser anunciada oficialmente pelo governo, mas houve um recuo e o texto acabou engavetado, segundo os delegados.
O governo, alegando a transição da direção geral, devolveu o projeto.
Os delegados argumentam que o governo resiste sob alegação de impacto orçamentário e financeiro.
“Ocorre que isso não foi visto, nem alegado, nem foi óbice para a Polícia Rodoviária Federal conseguir sua aprovação pelo governo e Congresso Nacional”, aponta um delegado federal.
Entre idas e vindas, o projeto da PF foi reapresentado, mas “continua dormindo em berço esplêndido”, sem previsão de avançar.
Os delegados argumentam que, como “consequência dessa omissão do governo”, por exemplo, um chefe de delegacia em fronteira recebe gratificação de R$ 200. Logo, muitos não têm interesse de ocupar chefias em locais ‘ruins’ ou mesmo assumir Superintendências em Estados afastados dos grandes centros porque “o custo/benefício não compensa”.
A Associação dos Delegados da PF informa que tentou mostrar ao governo que se não é possível aprovar o projeto em sua integra, que o faça como em outras áreas, como no INSS, Justiça Federal e Ministério Público Federal – instituições que planejaram para os próximos anos gradativamente a expansão de suas estruturas.
“A Polícia Federal não tem unidades, chefias, funções e pessoal para acompanhar o planejamento da Justiça Federal e do Ministério Público Federal”, cobram os delegados.
Fontes do governo informaram que o projeto dos delegados não foi engavetado. O governo destaca que a proposta da PF está sob exame do Ministério do Planejamento e que a meta do Ministério da Justiça é “viabilizar a reestruturação da Polícia Federal”.
A demora ocorre, segundo avaliação do governo, por causa da “temperatura interna da instituição” – uma alusão à queda de braço entre as carreiras policiais que agita a PF.
O QUE DIZ A POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL
A Polícia Rodoviária Federal não entrou no mérito da insatisfação dos delegados da PF. A corporação manifestou-se exclusivamente sobre a reestruturação da carreira.
“O projeto para a reestruturação dos cargos da Polícia Rodoviária Federal iniciou-se em 2006 motivada por uma auditoria operacional do Tribunal de Contas da União, a qual resultou no Acórdão 353/2006 do TCU Plenário, apontando a necessidade do fortalecimento da estrutura de gestão da PRF”, assinala a corporação, por meio de sua Assessoria de Comunicação Social.
“Desde então esse projeto tramita cumprindo o fluxo estabelecido para qualquer reestruturação de funções na esfera federal”, informa a PRF. “Como resultado, em agosto de 2013 foi criado o Projeto de Lei 6243/13 da Câmara Federal e, em 2014, transformou-se no PL 72/14 do Senado, que, após sanção da Presidente da República, resultou na Lei 13.027/14.”
A Polícia Rodoviária Federal ressalta que o Decreto 8219/14 prevê a implantação da nova estrutura para 2015, por isso ainda não há impacto orçamentário. “Uma vez implementada, a modificação impactará em R$10 milhões ao ano. Os valores da remuneração podem ser consultados no anexo II da Lei 13.027/14. Os cargos de gestão na PRF somavam 800. O projeto, entre rearranjos das funções que já existiam e a criação de novas outras, cria 1288 novas funções que, somadas às existentes, resultarão em 2088 funções técnicas, que só poderão ser ocupadas por servidores de carreira da Polícia Rodoviária Federal.”
Aproximadamente 47% dessas funções destinam-se às atividades de gestão nas delegacias da PRF, que são pontos de atendimento à população, unidades administrativas instaladas ao longo das rodovias federais, destaca a Assessoria de Comunicação Social da PRF. “O aprimoramento na gestão será um importante fator na melhoria na qualidade do serviço prestado à sociedade.”
A PRF considera que essa reestruturação “é necessária e de suma importância para o desenvolvimento e a profissionalização da instituição”.
“Uma estrutura mais sólida permite aprimorar a capacidade de processamento gerencial diante do aumento das demandas do órgão, que, além de ser referência natural nas questões relacionadas ao trânsito, desempenha as mais diversas atribuições na área da segurança pública, com indução de políticas públicas e a participação ativa em diversos programas de governo, como o Plano Nacional de Redução de Acidentes e Segurança Viária, Plano Nacional de Segurança nas Fronteiras e Grandes Eventos”, destaca a corporação.
“Dotar a PRF de melhor capacidade de gestão ainda faz parte de um conjunto de ações do Governo Federal para atingir a meta de redução da violência dos acidentes na Década da Segura Viária.”