‘Democracia brasileira vive em risco permanente’, avalia filósofo Roberto Romano
O ataque a faca contra o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), na quinta-feira, 6, em Juiz…
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo um dia após o incidente, o pesquisador alerta para a necessidade de os candidatos, os partidos e as autoridades públicas, sobretudo do Judiciário, “assumirem as responsabilidades de suas funções”.
“Se não tivermos uma reação saudável e rápida, evidentemente teremos mais fatos graves até as eleições”, disse ele. “Estamos longe de perceber a gravidade da crise política e social brasileira.”
Abaixo, leia os principais trechos da entrevista.
O que significa esse episódio?
Isso é um resultado da democracia brasileira, que vive em risco permanentemente. Ela não está consolidada. As instituições de Estado e da sociedade civil não estão agindo normalmente. Com isso, temos a perda radical da autoridade pública. E democracia sem autoridade pública não funciona. Quando não há autoridade, a violência física e a violência verbal se imiscuem em todos os assuntos da sociedade e do poder público. E então temos resultados como esse (o ataque). Se não tivermos uma ação rápida para resolver esses problemas, evidentemente vamos caminhar para um fim trágico. Quando o próprio Jair Bolsonaro, no Acre, usou uma frase no sentido de “metralhar seus adversários”, a Procuradoria-Geral da República não tomou providências. Esse é um ponto. Ela (Raquel Dodge) achou que era um assunto menor e isso mostra o quanto estamos longe de perceber a gravidade da crise social e política brasileira.
Nos últimos meses, tivemos outros ataques a políticos. São episódios isolados?
Não é isolado, esse é o ponto. Temos um regime civil que, na Constituição, promete ser democrático e, ao mesmo tempo, um Estado de direito. Para essa promessa ser cumprida, é necessário que os três poderes cooperem. No caso brasileiro, há um Executivo desacreditado, já que o presidente tem a avaliação do eleitor mais baixa possível. Tem um Parlamento em que o eleitor também não acredita, com desprestígio absoluto, e a Justiça começa a mostrar sinais de partidarismo, de política e de divisão, inclusive no Supremo Tribunal Federal. Tem vários tribunais abrigados sob a sigla do STF. É isso que eu chamo de a perda da soberania.
Como é esse conceito de perda da soberania?
O conceito de soberania permite o uso da autoridade pública, exige a coordenação e a harmonia dos três poderes com o compromisso diante do cidadão. Quando os poderes se autonomizam em relação à sociedade e à economia, e começam a definir um padrão que não é o legal, mas o político, temos quase o princípio da anarquia. No Brasil, a falta de ordem começa nos mais altos escalões do Estado. E é evidente que, com isso, não tem como garantir na base da sociedade o bom convívio.
Que ações seriam necessárias para alterar esse cenário?
O primeiro passo é que os partidos políticos assumam a sua função de partidos e não de máquinas eleitoreiras que apenas visam a demagogia e a conquista de cargos. O segundo ponto é que as autoridades públicas no Executivo, Legislativo e, principalmente, no Judiciário tenham consciência da gravidade e não ajam como se nada estivesse acontecendo. As instituições brasileiras não estão funcionando normalmente. Dizer que estão é negar a realidade, negar os fatos como assassinatos de políticos e tentativas de assassinato.
Com esse novo componente, o que se pode esperar para as eleições 2018?
O imprevisível sempre. Essa tem sido, infelizmente, a história do Brasil desde o governo de Getúlio Vargas. No momento em que se pensa que a situação do País vai caminhar para a normalização, para o respeito da autoridade e da ordem pública, tem um fato terrível como esse acontecendo. É preciso ter mais prudência, que não significa ter medo, mas sim agir no momento certo e não deixar que os fatos se precipitem. O que estamos assistindo são autoridades públicas que assistem à violência que grassa na sociedade como um todo e agem como se nada estivesse mudando. Os fatos deverão ser enfrentados até outubro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.