Deputados bolsonaristas pagaram cabos eleitorais com verba de universidade, diz site
O site oficial do UOL Notícias informou que a UERJ contratou "fantasmas" ligados a dois deputados bolsonaristas reeleitos, Soraya Santos e Dr. Serginho
O site oficial do UOL Notícias informou, nesta terça-feira (13), que a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) contratou “fantasmas” ligados a dois deputados bolsonaristas reeleitos, Soraya Santos (federal) e Dr. Serginho (estadual), ambos do PL-RJ. Segundo as informações, cabos eleitorais tinham sido pagos com verbas da UERJ.
A reportagem informou que, ao longo dos últimos dois meses, chegou a pessoas que receberam dinheiro da Educação, no Rio de Janeiro, para trabalhar pela reeleição de dois parlamentares. Apesar de trabalharem para os políticos, os pagamentos recebidos eram realizados com recursos que a Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec), órgão do governo estadual, direcionou à UERJ.
Em tese, os contratados deveriam ter trabalhado em um projeto da universidade de implementação de espaços de qualificação profissional, que ainda está em andamento. Essas pessoas, porém, negam ter feito qualquer serviço para a universidade, apesar de constarem em listas enviadas em outubro pela instituição ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ).
Questionados, Soraya e Dr. Serginho disseram não conhecer o projeto da UERJ e afirmam não ter indicado ninguém. A universidade também nega irregularidades.
Investigações
“Os dados enviados pela universidade ao TCE-RJ fazem parte de uma série de investigações abertas após o UOL revelar, em agosto, a existência de folhas de pagamento secretas da universidade de contratados para projetos realizados com recursos de secretarias e órgãos do governo estadual”, informou o site.
A reportagem disse ainda que além do TCE-RJ, há apurações em andamento dos ministérios públicos Estadual e Eleitoral. Essas investigações podem resultar em ações de improbidade administrativa e até em perda de mandato de políticos envolvidos.
Segundo as apurações, há indícios de que ao menos 45 contratados pela universidade tenham ligação com Dr. Serginho e Soraya Santos. No total, segundo a reportagem, ele receberam um total de R$ 2,314 milhões de recursos que vieram da UERJ. Ao todo, as planilhas do projeto têm 394 pessoas, com valor bruto total de R$ 23,736 milhões.
O que os “contratados” dizem
A reportagem entrou em contato com seis pessoas que teriam ajudado os parlamentares nas eleições 2022. Cinco disseram que não fizeram nenhum trabalho na universidade; um desligou o celular após ser questionado especificamente sobre o serviço na UERJ.
“Todos eles afirmaram, em entrevistas feitas pessoalmente ou por telefone, ter apoiado informalmente ou trabalhado para as campanhas eleitorais dos deputados do PL. Esse grupo recebeu R$ 325 mil brutos entre abril e agosto (último mês que consta nas planilhas), segundo as tabelas enviadas pela Uerj ao TCE-RJ”.
Um comerciante e líder comunitário de Nova Friburgo disse que combinou um valor de R$ 18 mil com Soraya Santos para fazer campanha em sua cidade, porém o trabalho não se concretizou.
Cailan da Silva Cardoso, cujo o nome dele consta nas tabelas da universidade com um pagamento de R$ 26 mil em agosto, disse à reportagem que enviou toda a sua documentação para a equipe da deputada eleita, mas nunca recebeu dinheiro. “Nunca fiz nada, nem recebi nada da UERJ e não sei como usaram meus dados. Vou acionar meu advogado”, disse.
Três pessoas, que pediram para não terem as identidades reveladas, afirmaram não ter ideia de como seus dados foram parar na universidade e negaram qualquer relação com políticos. Também disseram nunca ter trabalhado ou recebido um centavo da universidade.
Nas tabelas enviadas ao TCE-RJ, porém, cada uma dessas pessoas consta com um valor recebido de R$ 115 mil brutos entre abril e agosto (total de R$ 345 mil).
Apuração em Cabo Frio (RJ)
Na última semana de novembro, a reportagem do UOL esteve em Cabo Frio, principal base eleitoral de Dr. Serginho, atrás de contratados da UERJ. Ao encontrar Romenique Fagundes Marvila, a reportagem o questionou sobre o seu trabalho com o deputado.
“Eu ajudava o meu cunhado que trabalhava para ele (Serginho). Nem sei qual é o cargo específico que eu exercia [na campanha]”, respondeu.
Romenique consta nas tabelas da universidade com pagamentos que somaram R$ 130 mil entre abril e agosto. À reportagem, ele negou ter prestado serviço para a UERJ. Segundo a tabela, Victoria da Rocha Santos, esposa de Romenique, recebeu o valor de R$ 65 mil no mesmo período.
O site apurou que constam dois saques em espécie de Romenique numa agência do Bradesco de Cabo Frio, no valor de R$ 19.154 cada, em junho e julho.
Também em Cabo Frio, o DJ Hugo Leonardo de Souza Garcia, conhecido como Hugo Scorpion, disse ter oferecido serviço de som em eventos na universidade e para as campanhas de Dr. Serginho e Soraya Santos. Na tabela da universidade, consta R$ 65 mil entre abril e agosto em seu nome.
Segundo as apurações, as namoradas de motoristas do Dr. Serginho também receberam valores que constam na tabela. Letícia Ferreira Cotta é confeiteira de bolos e, segundo apurado, teve R$ 65 mil recebidos entre abril e agosto. Para a reportagem, afirmou ser namorada de um dos motoristas de Dr. Serginho, Estevão Oliveira. Disse que ajudou na parte de “rede social” do deputado e negou ter prestado serviço à universidade.
“Outra pessoa que aparece na lista, com R$ 78 mil entre abril e agosto, é Soraya Vitorino de Souza. Ela fez um saque em junho de R$ 19.154. O UOL não conseguiu contato com ela, mas apurou que é namorada de outro motorista do parlamentar, Jehann Costa”.
Em Rio das Ostras, vizinha de Cabo Frio, a reportagem esteve na casa de Jaime Garcia dos Reis, de 75 anos. Uma senhora atendeu os jornalistas e disse não saber de serviços do idoso para a UERJ, nem para campanhas políticas, mas que Jaime é sogro do vereador local André Braga (PSC).
“O UOL pediu para falar diretamente com Jaime, mas, passados dez minutos, a mesma senhora disse que ele não poderia dar entrevista porque passou mal. O idoso aparece nas planilhas da Uerj com R$ 52 mil entre junho e agosto. A esposa do vereador Braga, Arlene Andrade Garcia Braga, também está lá: R$ 39 mil em julho e agosto. Braga fez campanha para o Dr. Serginho, que gravou vídeo no Facebook agradecendo pelo apoio do amigo”, informou a reportagem.
Apoiadores de Soraya Santos
A reportagem conversou, por telefone, com três apoiadores de Soraya Santos. Essas pessoas constam nas planilha da UERJ, mas eles negam ter prestado serviços para a universidade. São eles: o motorista Amaury Campos Menezes (R$ 39 mil entre julho e agosto) e os microempreendedores Diego Peixoto Santos (R$ 52 mil entre julho e agosto) e Gilmar de Oliveira (R$ 39 mil entre julho e agosto).
De acordo com a reportagem, Bianca Silva Valentim, cabeleireira da cidade de Teresópolis, falou com entusiasmo sobre seu auxílio à candidatura de Soraya. Ela afirmou que não atuou na campanha de rua, pois trabalha diariamente em seu salão, mas que “pediu muito voto” para as suas clientes. “No fim da conversa de dois minutos, após uma pergunta específica sobre o trabalho para a Uerj, ela desligou o telefone. As planilhas da universidade mostram um total pago de R$ 52 mil entre junho e agosto”.
Deputados conhecidos da família Bolsonaro
Soraya Santos e Dr. Serginho participaram de atos da campanha de Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro. A deputada é próxima à primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Já Dr. Serginho é próximo ao senador Flávio Bolsonaro (PL). Durante a gestão do governador Cláudio Castro (PL), o deputado eleito foi secretário de Ciência e Tecnologia, pasta que tem sob seu guarda-chuva a Uerj e a Faetec.
O que dizem os deputados e a universidade
A deputada federal reeleita e presidente nacional do PL Mulher, Soraya Santos, afirmou, em nota enviada ao UOL, que desconhece o projeto da UERJ e que não indicou ninguém para o projeto.
Também em nota, Sérgio Luiz Costa Azevedo Filho, o Dr. Serginho, deputado estadual reeleito, disse que não fez nenhuma indicação para o projeto da universidade e que nenhuma das pessoas citadas pela reportagem trabalhou em sua campanha.
Já a assessoria de imprensa da Universidade Estadual do Rio de Janeiro afirmou que “desconhece a influência de qualquer parlamentar (candidato ou eleito) na seleção de colaboradores”.