ALARMANTE

Disque 100 recebe duas denúncias por hora de estupro de vulneráveis

Casos que ocorrem em ambiente familiar são subnotificados

A violência sexual contra crianças e adolescentes continua alarmante no Brasil, como mostram as estatísticas nacionais. Entre 1º de janeiro e 13 de maio deste ano, o serviço Disque Direitos Humanos (Disque 100) registrou 7.887 denúncias de estupro de vulnerável. Isso representa uma média de cerca de 60 casos por dia ou duas denúncias por hora.

Neste sábado (18), é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. A data foi instituída pelo Congresso Nacional em 2000, marcando o assassinato de Araceli Cabrera Sánchez Crespo há 51 anos em Vitória (ES). Araceli, uma menina de apenas 8 anos, foi encontrada morta após seis dias de desaparecimento, com sinais de violência e estupro. O caso permanece impune até hoje.

Em 2022, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) registrou 58.820 casos de estupro de menores em delegacias de todo o país, um aumento de 7% em relação ao ano anterior. De cada quatro estupros, três envolviam vítimas incapazes de consentir, devido à idade ou a outras condições como deficiência.

Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apenas 8,5% dos estupros são relatados à polícia. O Ipea estima que, na realidade, ocorram cerca de 822 mil casos anuais de estupro no Brasil, sendo mais de 616 mil envolvendo vulneráveis.

A psicóloga Juliana Martins, coordenadora do FBSP, destaca que esses crimes são “o tipo de violência mais subnotificada” porque frequentemente ocorrem dentro de casa e envolvem familiares. Martins afirma que enfrentar esse problema requer uma “mudança cultural enorme” e que a ação do poder público não é suficiente. “É um enorme desafio para o Estado enfrentar essas violências que acontecem no contexto doméstico,” ela diz.

Em 2022, seis em cada dez estupros de vulneráveis envolveram crianças e adolescentes de 0 a 13 anos. Em 64,4% desses casos, o agressor era um familiar, como pai, padrasto, avô ou tio, e 21,6% eram conhecidos da vítima sem parentesco. Mais de 70% dos crimes ocorreram em casa e 65% durante o dia.

O juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, da 4ª Vara da Infância, Juventude e do Idoso no Rio de Janeiro, ressalta a dificuldade de atuação do Estado nesses casos, pois “em regra, ocorrem sem testemunhas” e muitos abusos não deixam marcas físicas detectáveis em exames de corpo de delito.

A promotora de Justiça Camila Costa Britto, do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), observa que esses crimes são cercados de preconceito e tabu, o que contribui para a subnotificação. “São encobertos pelo véu do silêncio, onde as partes envolvidas compactuam em prol de uma aparente harmonia familiar,” explica.

Gezyka Silveira, assistente social da ONG Plan International Brasil, alerta que crianças de diferentes estratos sociais podem ser vítimas de abuso sexual, mas fatores como vulnerabilidade socioeconômica, desigualdade social e discriminações tornam algumas mais suscetíveis. “Meninas e meninas negras são as que mais sofrem violência,” destaca Gezyka.

Em 2022, 56,8% das vítimas de estupro (adultos e vulneráveis) eram pretas ou pardas, 42,3% eram brancas, 0,5% indígenas e 0,4% amarelas, conforme o anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Com informações da Agência Brasil