Dólar volta a bater R$ 6,20 por causa do pacote de gastos do governo
Mercado segue atento ao andamento das propostas do Executivo, o que interfere diretamente no dólar
(Da Folhapress) O dólar está em nova disparada nesta quarta-feira (18), com o mercado monitorando a tramitação do pacote de corte de gastos do governo no Congresso Nacional. A Câmara dos Deputados aprovou a primeira parte do projeto na terça, e as outras duas deverão ser analisadas no plenário nesta sessão.
O dia ainda guarda a última decisão de política monetária do Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos) do ano, prevista para às 15h (horário de Brasília).
Às 14h42, a moeda norte-americana subia 1,72%, cotada a R$ 6,201 e próxima à máxima da sessão, de R$ 6,204. Já a Bolsa desabava 2,10%, aos 122.072 pontos.
Em dia de forte estresse no mercado financeiro devido às incertezas sobre as contas públicas, a Câmara aprovou, na noite de terça, o texto-base de um dos projetos do pacote de contenção de gastos do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A proposta não contempla alguns dos pontos centrais do pacote, como o limite ao ganho real do salário mínimo e as mudanças no BPC (Benefício de Prestação Continuada), mas prevê outros dispositivos relevantes, como a possibilidade de bloquear até 15% das emendas parlamentares para cumprir os limites do arcabouço fiscal.
O resultado da votação é a primeira sinalização concreta de que as medidas têm condições de avançar no Congresso Nacional. Mas, entre os agentes do mercado, ainda há preocupações de que o pacote possa não ser votado até o fim do ano ou que as propostas sejam desidratadas. Os parlamentares entram em recesso já nesta sexta-feira (20).
“Caso consigam aprovar tudo ainda em 2024, é possível que o mercado se tranquilize. Essa perspectiva apareceu na segunda metade do pregão de terça, quando, depois de uma manhã de muito estresse que levou o dólar até a R$ 6,20, os ânimos se acalmaram”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.
Além do PLP, ainda está pendente de aprovação o projeto de lei ordinária que contempla o limite ao ganho real do salário mínimo, as mudanças no BPC (pago a idosos e pessoas de baixa renda) e a alteração na regra de cálculo dos repasses ao FCDF (Fundo Constitucional do Distrito Federal), entre outras medidas.
O pacote do ministro Fernando Haddad (Fazenda) ainda inclui uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que mexe no critério de concessão do abono salarial (espécie de 14º salário pago a parte dos trabalhadores com carteira assinada) e busca extinguir de vez com os supersalários na administração pública.
Ambos os projetos deverão ser analisados no plenário da Câmara nesta sessão, enquanto o texto-base segue para o Senado.
Mas, mesmo que o pacote seja aprovado, a percepção do mercado é que ele ainda não é o suficiente para estancar a crise das contas públicas.
“O pacote é medíocre e insuficiente. O governo vai ter que apresentar medidas adicionais para tentar reancorar as expectativas que foram desancoradas por conta do próprio governo. Ele criou a situação atual com uma comunicação truncada na apresentação do pacote, e foi uma grande frustração. Caso aprovado, parte do problema será endereçado, mas ainda falta mais”, diz Spiess.
A pressão afeta as curvas de juros futuros. O contrato para janeiro de 2026 subia de 15,08%, do ajuste anterior, para 15,33%. O de janeiro de 2027 ia de 15,415% para 15,65%; e a de janeiro de 2029 avançava de 15,12% para 15,26%.
Para conter parte do estresse, o Tesouro Nacional anunciou a compra e a venda de títulos públicos nesta semana. Serão três dias de leilões (18, 19 e 20 de dezembro), cujas condições das ofertas serão divulgadas nos dias de realização.
Para realizar essas operações, o órgão cancelou o leilão tradicional de títulos previsto para quinta.
Segundo o Tesouro, o objetivo da atuação é oferecer suporte ao mercado de títulos públicos, assegurando seu bom funcionamento e o de mercados correlatos. A atuação foi discutida com o Banco Central e se soma aos leilões de dólar promovidos pela autoridade monetária em meio à disparada da moeda americana.
Mais de US$ 12 bilhões foram injetados no mercado desde quinta-feira passada (12). Os leilões são intervenções do BC no câmbio. Na prática, eles servem para aumentar a quantidade de dólares disponíveis para os investidores, seguindo a lei da oferta e demanda. Ou seja, quanto mais moeda puder ser comprada, menor vai ser a cotação dela.
Haddad, em falas a jornalistas nesta quarta, não descartou a possibilidade de que movimentos especulativos estejam promovendo a alta recente do dólar, mas disse acreditar que as intervenções do Banco Central e do Tesouro devem ajudar a acalmar os ânimos.
Na especulação, investidores procuram lucrar com a volatilidade de preços de um ativo, muitas vezes no curtíssimo prazo. Há também decisões tomadas por “robôs” (operações automatizadas), que dão impulso à volatilidade já aumentada.
“Há contatos conosco falando em especulação, inclusive jornalistas respeitáveis falando disso. Eu prefiro trabalhar com os fundamentos, mostrando a consistência do que nós estamos fazendo em proveito do arcabouço fiscal para estabilizar isso”, afirmou.
O ministro também lembrou que houve outros episódios recentes em que o valor do dólar apresentou altas. “Já houve dias tensos que depois se acomodaram em virtude do desdobramento das medidas tomadas pelo governo.”
Haddad também falou sobre o pacote de ajuste fiscal em tramitação no Congresso Nacional. Para o ministro, não haverá desidratação do projeto.
Já no exterior, os investidores aguardam a decisão do Fed sobre a taxa de juros dos EUA. A expectativa é por uma redução de 0,25 ponto percentual, para a faixa de 4,25% e 4,50%.
As atenções estarão voltadas às novas projeções dos membros da autarquia, que sinalizarão os movimentos da política monetária para o próximo ano.
“Se eles sinalizarem apenas dois cortes em 2025, o dólar poderá avançar ainda mais”, avalia Eduardo Moutinho, analista de mercados do Ebury Bank.