Empresários veem sinais de recuperação em meio à instabilidade econômica
A tão aguardada retomada, no entanto, vem acompanhada de ambiguidades entre os diferentes setores
Pela primeira vez desde o início da pandemia, há sinais de recuperação dos pequenos e médios negócios em praticamente todos os segmentos da economia, segundo levantamento do Sebrae. Os dados foram apurados nos meses de agosto e setembro deste ano.
A tão aguardada retomada, no entanto, vem acompanhada de ambiguidades entre os diferentes setores, refletindo o impacto heterogêneo do coronavírus na economia brasileira.
A recuperação nas vendas do comércio varejista (1,2%) e no volume de serviços (1,1%) em julho contrastam com a queda da indústria (-1,3%) no mesmo período, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Já a inflação medida pelo IPCA em 12 meses até agosto acumula alta de 9,68%, enquanto a prévia do índice para setembro indica elevação de 1,14% no mês.
“Nossa preocupação atual não é tanto a pandemia, mas as nossas restrições relacionadas à retomada. Quando o vírus sai de cena, a gente olha para problemas como inflação, para o emprego que ainda não voltou”, diz Silvia Matos, pesquisadora do FGV-IBRE (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas). “Além de sofrer com as cicatrizes geradas, temos que lidar com uma dificuldade de crescimento.”
O empreendedorismo digital foi a saída encontrada pelos brasileiros para recompor a renda perdida durante a pandemia. Segundo o Sebrae, 2,1 milhões de empresas foram abertas no primeiro semestre de 2021, um crescimento de 35% na comparação com o ano anterior.
“O empreendedor por necessidade domina. São pessoas que perderam o emprego ou viram a renda familiar diminuir e precisaram empreender para ter uma condição de vida sustentável”, explica Sérgio Gromik, gerente regional do Sebrae-SP.
Mais de 50% dos entrevistados no Brasil pela pesquisa GEM (Global Entrepreneurship Monitor) conhecem alguém que passou a empreender em função da pandemia.
Os especialistas preveem um cenário menos turbulento à frente, mas nem por isso simples. As projeções do Itaú Unibanco para o PIB (Produto Interno Bruto) de 2021 foram revisadas para baixo: crescimento de 5,3% em 2021 e 0,5% no próximo ano, em função da taxa de juros mais alta.
“A taxa real mais elevada deve gerar uma desaceleração dos setores sensíveis ao crédito e aos juros, um dos motivos pelo qual a economia deve desacelerar ano que vem”, explica Luka Barbosa, economista do banco.
Entre os principais desafios dos empreendedores nos próximos meses estão a taxa de câmbio e seus impactos na formação de custos dos pequenos e médios negócios. Segundo Barbosa, o pano de fundo para os patamares do câmbio são as preocupações dos investidores domésticos e estrangeiros com a saúde das contas públicas.
“A preocupação fiscal é um dos motivos pela dinâmica da taxa de câmbio, que por sua vez é um dos motivos para a inflação alta e o aumento dos juros”, diz o economista.
As projeções do mercado para 2022 apontam para inflação em 4,12% e Selic em 8,5% ao ano, pelo último Boletim Focus de setembro.
Em curtíssimo prazo, no entanto, as expectativas são mais positivas. “Nós temos dados diários de consumo de serviços via cartão de crédito e débito, e há uma recuperação significativa nesses gastos”, diz Barbosa.
O retorno do setor de serviços -um dos mais afetados pelo distanciamento social- deve colaborar com um cenário menos adverso, acredita Gromik, sem interrupções ou novas restrições afetando o segmento.
“É legítimo imaginar um ano de 12 meses, pleno em funcionamento. Isso pode contrabalançar os efeitos de um crédito mais caro ou outros efeitos no cenário macroeconômico”, avalia o gerente do Sebrae-SP.
Para a Endeavor Brasil, a despeito das dificuldades, o momento é favorável para quem vai criar novos negócios no país.
“Existe capital de fundos de investimento que estão vendo oportunidades no Brasil. Muitos investidores fizeram saídas e estão prontos para começar novos negócios”, diz Maria Fernanda Musa, diretora de aceleração de negócios da Endeavor.
Dos setores em ascensão citados pelos especialistas, além de serviços, os segmentos de educação, saúde e economia verde estão entre os mais promissores.
“Temos muitos desafios no Brasil, mas existem também muitos talentos, pessoas competentes e prontas para abraçar oportunidades que vão transformar o país. Uma transformação por meio do empreendedorismo”, afirma Maria Fernanda, da Endeavor.