Fim do comércio mundial de animais selvagens entra na pauta do G20
Tema, que envolve o Brasil, ganha interesse global com a pandemia de Covid-19, cuja origem está ligada ao contato de seres humanos com animais silvestres
Aumenta a pressão internacional sobre problemas ambientais do Brasil, que não se limitam ao desmatamento da Amazônia, às queimadas no Pantanal ou à falta de ação contra mudanças climáticas. Na pauta de grupos presentes à cúpula do G-20 neste fim de semana, em Riad, na Arábia Saudita, esteve o fim do comércio de animais selvagens em todo o mundo.
Legal ou ilegal, esse tipo de comércio do qual o Brasil é fornecedor, se tornou assunto de interesse global com a pandemia de Covid-19, cuja origem está ligada ao contato de seres humanos com animais silvestres.
O contato de seres humanos com animais selvagens levou ao surgimento de 70% das infecções surgidas nos últimos 50 anos, como HIV, ebola, Sars, Mers, gripes suína e aviária e, a pior de todas, a Covid-19.
À frente da campanha “Me Deixa Ser Selvagem” está a ONG Proteção Animal Mundial (PAM), com sede no Reino Unido e ações em 50 países. A PAM entregou uma petição assinada por 1,1 milhão de pessoas aos líderes do G-20.
— Esse comércio não é compatível com a segurança da Humanidade. É uma ameaça ao bem-estar humano e animal. A pandemia de coronavírus causou danos globais estimados em pelo menos U$ 15 trilhões, a venda de animais silvestres rende U$ 23 bilhões, segundo estimativas da ONU, ganhos por poucos em detrimento de todo o planeta. Perdem a saúde, a economia e a biodiversidade — afirma João Almeida, gerente de campanha da PAM no Brasil.
Ele lembra que o Brasil, dono da maior biodiversidade, é o país de origem de boa parte dos animais selvagens vendidos no mundo. Justamente por isso uma carta assinada pela PAM e outras 40 instituições foi entregue ao ministro da Economia, Paulo Guedes, pedindo o apoio do Brasil ao fim do comércio de animais silvestres.
— O desmatamento da Amazônia, a caça, tudo isso está relacionado com o tráfico de animais — frisa ele.
O comércio de animais silvestres movimenta um mercado ilegal de pets e serve às indústrias de moda, turismo, alimentação, medicina tradicional e caça esportiva.
O relatório “Crueldade à Venda”, da PAM, diz que o número total de animais silvestres em cativeiro no país é desconhecido. Tampouco se sabe quantos são caçados. Dados da ONG Freeland Brasil mostram que só o estado de São Paulo apreende cerca de 30 mil animais por ano.
Mas, legalmente, 37.937.619 aves são mantidas em cativeiro e 3.265.973 passarinhos vivem engaiolados no Brasil.
— As pessoas precisam saber que prender passarinho em gaiola, um jaboti no quintal não é apenas crueldade, é aumentar o risco de transmissão de doenças. Muita gente nem se dá conta de que não pode ter esses bichos como pets — acrescenta Almeida.
O relatório mostra que 26% dos donos de animais silvestres criados como pets no Brasil desconhecem que eles não são domésticos, mesmo que sejam cobras, jacarés, onças e tamanduás. O canto de um passarinho engaiolado é o som do sofrimento, pois animais silvestres jamais se adaptam ao cativeiro.
— Um animal silvestre, ao ser aprisionado, tem comportamento e instinto suprimidos. É um sofrimento imenso. As pessoas que se mantém reclusas em casa com a quarentena talvez tenham uma vaga, distante noção do que é uma vida em cativeiro — observa Almeida.
Um dos focos da campanha é evidenciar que, na realidade, mesmo o dito comércio legal pode ter uma origem ilegal. Pois, embora a brasileira proíba a caça de animais selvagens, estes muitas vezes acabam por ser vendidos por meios legais.
Papagaios apreendidos de caçadores, por exemplo, são levados para centros de triagem da vida selvagem e, depois, entregues a criadouros legalizados apenas para a reprodução. Os filhotes desses papagaios podem ser vendidos legalmente como animais de estimação e condenados a passar toda a vida em cativeiro.
— As pessoas também podem colaborar e jamais comprar animais silvestres. Eles não são pets. O Brasil tem um mercado pet silvestre consolidado e exporta muita vida silvestre. Mesmo quem não se preocupa com o bem-estar animal deve se importar. Isso nos deixa internamente expostos a doenças e também nos faz exportá-las — enfatiza Almeida.