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Guedes prometeu gás pela metade, o que daria R$ 35, mas já custa até R$ 105

Guedes nunca citou um preço específico, apenas o percentual, mas em junho de 2019, quando fez uma das declarações, o valor médio chegava a R$ 69,24

Ministro da Economia, Paulo Guedes (Foto: Divulgação)

O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou repetidas vezes durante o primeiro ano do governo Jair Bolsonaro que o preço do botijão de gás poderia cair pela metade. Guedes nunca citou um preço específico, apenas o percentual, mas em junho de 2019, quando fez uma das declarações, o valor médio chegava a R$ 69,24, segundo dados da ANP (Agência Nacional de Petróleo). Metade daria cerca de R$ 35. Entretanto, isso ainda não ocorreu, e o gás de cozinha já é vendido a até R$ 105 em Mato Grosso e a R$ 90 em Goiânia.

Guedes declarou que a redução de preço do botijão seria possível com mais concorrência no setor e, no ano passado, a Petrobras vendeu a Liquigás, uma subsidiária que atuava no engarrafamento, distribuição e comercialização de gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha. Entretanto, nesse caso, a privatização não garantiu mais concorrência porque mudaram apenas os controladores da empresa, sem a entrada de novos participantes no mercado. Além disso, o governo não tomou medidas adicionais para estimular a competição no setor, com a entrada de mais companhias.

“Mesmo que houvesse aumento de produção no Brasil, não teríamos queda no preço. Primeiro porque a Petrobras é a única produtora do GLP por aqui, e outra parcela é importada. Além disso, o GLP, matéria-prima do gás de cozinha, é derivado do petróleo, que tem os preços determinados no mercado internacional. Como a cotação é formada no mercado global, nenhuma empresa vai reduzir preço para ter prejuízo”, disse Adriano Pires, o analista de energia do CBIE

Procurado, o Ministério da Economia não se manifestou até a publicação deste texto.

Petrobras importa GLP

Segundo a Petrobras, o Brasil é importador de GLP e, se reduzir o preço abaixo das cotações internacionais, ficaria diante de duas opções: deixar o mercado desabastecido ou importar a preço mais alto e vender a preço mais baixo. Do total de GLP vendido no Brasil, a Petrobras precisou importar 28% entre janeiro e setembro do ano passado.

Além de o preço do gás variar de acordo com os mercados, o dólar em alta encarece ainda mais o preço do produto importado para o Brasil. Em dezembro de 2019, o preço médio do botijão de gás chegou a R$ 69,24, passou para R$ 74,74 em dezembro de 2020 e já alcançou R$ 75,77 em janeiro de 2021, conforme dados da ANP. Esse é o preço médio, mas há picos, como os R$ 105 em MT.

Segundo a Petrobras, políticas de intervenção de preços adotadas no passado trouxeram prejuízos e não deveriam ser feitas para reduzir o valor do botijão. “O passado já nos deu boas lições sobre isso. Prejuízos para a Petrobras, endividamento, menos investimento, menos empregos e menor arrecadação de impostos para o Estado brasileiro”, declarou a empresa.

Em 6 de janeiro, a Petrobras anunciou um reajuste de 6% no preço do gás de cozinha para as distribuidoras. Foi a 11ª alta nos últimos nove meses.

Petrobras é única produtora

O presidente da Abragas, entidade de reúne os revendedores de botijão de gás, José Luiz Rocha, afirmou que a Petrobras tem subido o preço do gás de cozinha desordenadamente. Segundo ele, o setor não é competitivo porque a estatal é a única produtora de GLP e existem apenas quatro distribuidoras no mercado.

“Estamos na mão de um monopólio na produção do GLP e de um oligopólio entre as distribuidoras. Não temos competição. Essa competição só ocorre no segmento de revendas. E, se o preço do petróleo continuar a subir, a tendência é que o botijão de gás fique mais caro”, declarou.

Rocha ainda declarou que, mesmo com os aumentos de preço, os empresários consideram o gás de cozinha barato. Entretanto, ele admite que em algumas cidades, o valor do botijão tem comprometido parte significativa do orçamento das famílias.

“A gente entende que o produto ainda é uma energia barata, se comparada com outras, mas tem pesado em relação ao salário mínimo, comprometendo 10% da renda em algumas cidades. Isso pesa no bolso do trabalhador. Lamentavelmente, a gente não tem alternativa e não tem lado para correr”, declarou.

Tarifa social é saída para reduzir preço, diz especialista

O analista de energia Adriano Pires, do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), declarou que mesmo com a pandemia do coronavírus, o preço do petróleo subiu 40% entre julho de 2020 e janeiro de 2021. Com esse encarecimento e o aumento no valor do dólar, o preço do GLP também subiu e afetou o custo final do botijão de gás.

Ele afirma que uma queda no preço do botijão só ocorre de duas maneiras. Com intervenção na Petrobras, para represamento do preço, ou com a criação de uma tarifa social, assim como existe na conta de energia. Na política de represamento, a estatal não repassaria para o preço do produto a variação que ocorre no mercado internacional.

Pires disse que caberia ao governo cadastrar as famílias de baixa renda e dar a elas um cartão ou um voucher com um valor específico para a compra do gás. Isso seria bancado com recursos do Tesouro Nacional.

“O preço do botijão leva em conta o preço do GLP, que é uma commodity [matéria-prima]. Se houver intervenção na Petrobras, faremos a mesma política do governo Dilma Rousseff, que quebrou a empresa. Mas, se o governo achar que tem que subsidiar o preço, deve fazer isso com recursos do Tesouro Nacional e não com o dos acionistas da empresa”, disse.