Para diminuir estatais dependentes ao Tesouro, Guedes quer ‘plano de voo’
O ministro Paulo Guedes (Economia) pretende criar um “plano de voo” para estatais dependentes do…
O ministro Paulo Guedes (Economia) pretende criar um “plano de voo” para estatais dependentes do Tesouro. O objetivo oficial é elaborar um projeto de reequilíbrio das contas de cada empresa para reduzir gastos da União, mas a medida também cria uma espécie de manobra para evitar que empresas como os Correios demandem recursos e estourem o teto de gastos.
Parte do plano foi proposto na modificação do PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) na terça-feira (15). O texto foi aprovado pelo Congresso nesta quarta-feira (16).
Guedes enviou uma modificação no projeto apresentado em abril para inserir uma meta fixa de resultado primário exigida pelo TCU (Tribunal de Contas da União). Ele aproveitou para propor ajustes nas normas para estatais.
Antes, o PLDO previa em termos gerais que as estatais com um plano de sustentabilidade ou reequilíbrio econômico-financeiro aprovado continuariam a receber recursos da União, mas não detalhava a medida. A modificação desta semana cria critérios mais claros para melhorar as contas das empresas.
Tecnicamente, o texto prevê um mecanismo de transição das estatais entre os chamados Orçamento fiscal (que abrange as dependentes e que impacta o teto de gastos) e o Orçamento de investimentos (que engloba as independentes, e que não impacta o teto de gastos).
Marcos Mendes, especialista em contas públicas e colunista da Folha, diz que o governo tenta, com a medida, adiar a inclusão de mais empresas dependentes no Orçamento regular, o que diminui o impacto no teto.
Isso porque estatais que se tornam dependentes do Tesouro têm que passar a ter suas despesas que são pagas pela União (como folha de pagamentos) registradas no Orçamento. Aconteceu, por exemplo, com a Telebras, que era independente e virou dependente a partir de 2020.
A interpretação é que há várias empresas independentes que deveriam ter virado dependentes, como Correios e Casa da Moeda.
“Para evitar colocá-las no orçamento fiscal, e impactar o teto de gastos, criou-se uma transição com a concordância do TCU de passar primeiro por um programa de ajustamento, para tentar reverter a dependência de verbas do Tesouro e voltar a ser independente. Isso adia por algum tempo a decisão de colocá-las para dentro do orçamento fiscal. O correto seria privatizar ou extinguir, mas isso está politicamente cada vez mais difícil”, afirma.
Membros da equipe econômica dizem que o plano servirá principalmente para que empresas que viraram dependentes façam um plano para sair dessa situação, ou ainda para evitar que outras entrem nesse quadro. O principal caso citado é justamente o dos Correios, que nos últimos anos gerou alertas sobre o risco de passar a depender do Tesouro.
São consideradas dependentes as estatais que recebem recursos da União para cobertura de despesas com pessoal e para custeio em geral. Há 19 empresas nessa situação atualmente, como Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e Valec, de construção e manutenção de ferrovias.
As subvenções do Tesouro para as estatais dependentes crescem a um ritmo nominal de 15% ao ano e em 2019 chegaram a R$ 17,5 bilhões. Em ao menos 12 casos, as subvenções representaram mais de 80% de toda a receita obtida por esse conjunto de empresas.
O conjunto das estatais federais dependentes tem registrado prejuízos recorrentes mesmo com o recebimento de subvenções. Em 2019, o resultado dessas companhias ficou negativo em R$ 1,9 bilhão.
O objetivo da equipe econômica é avaliar com profundidade a condição de dependência da empresa durante o período em que o plano da estatal vigorar, além de criar medidas administrativas e orçamentárias para a melhora nos números.
A pasta vem chamando internamente o processo de “plano de voo” das estatais, algo que ainda precisaria ser regulamentado por ato do Executivo.
O mecanismo é entendido por técnicos do governo como um aperfeiçoamento para as desestatizações, mas especialistas apontam um alcance limitado da medida e veem até retrocesso para as privatizações.
Técnicos do Congresso avaliam que o novo texto suaviza o PLDO anterior, permitindo uma transição mais suave e não obrigando mudanças imediatas de todas as dependentes.
A economista Elena Landau, diretora de privatizações do BNDES (Banco de Desenvolvimento Econômico e Social) de 1994 a 1996, também afirma que o plano representa um abrandamento na desestatização.
Isso porque porque quando as companhias passarem para o orçamento de investimentos, deixam de disputar recursos com outras rubricas.
“Isso é muito ruim, do ponto de vista conceitual. Se você não colocar a estatal competindo por Orçamento, pelas despesas mais nobres, aí mesmo que você não vai privatizar. Precisa ficar claro para a sociedade que você precisa vender”, afirmou. “No fundo, está flexibilizando”, disse.
O PLDO ainda diz que as estatais precisam entrar no PND (Plano Nacional de Desestatização) para permanecer no Orçamento de investimento e receber aportes da União em 2021.
Mesmo assim, Landau vê alcance limitado. “O fato de entrar no PND não quer dizer nada. Os Correios, por exemplo, estão lá. Você só acelera a privatização se não afrouxar nada”, afirma.