PANDEMIA

“Pedi para desconhecido me levar ao altar com máscara do rosto do meu pai”

Brasileira que mora no Canadá relata como foi casar sem ninguém da família

“Tenho 27 anos e sou de Brasília, mas hoje moro na província de Ontário, no Canadá. Me casei recentemente e por causa da pandemia precisei encontrar uma maneira criativa de ter meu pai me acompanhando até ao altar.

Até meus 25 anos eu não acreditava muito em relacionamentos e até pensava que, talvez, não fosse me casar, porque meus relacionamentos nunca haviam sido muito tranquilos. Queria ser a mulher independente e sob controle dos meus sentimentos que eu me educava a ser. Me sentia assim.

Quando eu tinha 18 anos meu pai me mostrou um vídeo da minha infância. Nele, ele me pergunta o que eu quero para o futuro e eu encho a boca para dizer que “quero estudar inglês e ir para os Estados Unidos morar com um príncipe no castelo”.

Fiquei sem entender como uma criança de 5 anos pensaria naquele tipo de sonho. Tentando encontrar uma explicação, eu só posso concluir que a minha paixão pelas princesas da Disney – que falavam inglês e moravam nos Estados Unidos em seus castelos – me fez querer a mesma coisa.

Nós demos muita risada daquele vídeo. Aos 18 eu não tinha namorado, não falava inglês, nunca tinha ido aos Estados Unidos e tinha zero reais para ir, muito menos para cogitar um castelo.

De tudo que falei ali, as únicas coisas que eu realmente queria naquele momento era fazer o meu tão sonhado intercâmbio e falar inglês. Mas não tínhamos condições para isso. Bati o pé e segui a vida. Em 2014, depois de muito economizar, eu consegui fazer um intercâmbio de um ano nos Estados Unidos.

Voltei para São Paulo e terminei a faculdade de jornalismo, mas meu destino não estava aqui. Em 2016, retornei para os Estados Unidos. Lá eu vivi vários perrengues, desilusões, ganhei experiência e maturidade.

‘Conheci um canadense e achei que não daria certo’

Conheci o Isaac, meu agora marido, em 2017, em um aplicativo de relacionamentos gospel. Quando descobri que ele era do Canadá, pensei que era só mais um relacionamento que não daria certo devido à distância, mas continuei conversando. Essa brincadeira durou cinco meses e passei a planejar a minha visita ao Canadá.

Sai dos EUA rumo ao Brasil e fiz uma conexão de 20 dias lá para conhecer o Isaac e toda a família dele. Foi um risco, mas eu já tinha falado com a família dele por chamada de vídeos e fui confiante.

Deu tudo errado logo na minha chegada ao Canadá, onde eu fiquei mais de três horas presa na imigração do aeroporto e o Isaac teve que ser entrevistado para confirmar minha história.

A viagem foi ótima e começamos a namorar. Depois disso enfrentamos o namoro a distância, ele foi para o Brasil me visitar, eu vim para o Canadá visitar ele e depois de um ano de distância, me mudei para o Canadá, onde vivemos atualmente.

‘Minhas amigas me ajudaram a escolher o vestido pela internet’

Começamos a planejar nosso casamento no começo de 2020 e veio a pandemia. Adiamos a data o máximo que podíamos para que minha família estivesse presente, mas o Canadá continuava sem previsões para o fim das restrições de viagem para brasileiros.

Eu precisava da documentação do casamento para poder continuar morando no país e por isso não podíamos mais adiá-lo. Por causa das restrições da covid, a família do Isaac também não poderia estar presente na cerimônia, apenas os avós dele acompanharam a gente.

Aceitar que me casaria sem ninguém da minha família aqui foi uma das decisões mais difíceis que já tomei. Minha mãe e minhas amigas me ajudaram a escolher o vestido de noiva pela internet.

Todas as ligações que fiz para o meu pai antes do casamento foram difíceis. Ele sentia vontade de chorar com tudo: quando dizia que já tinha escolhido o vestido, quando contava detalhes e principalmente quando dizia que não sabia quem me levaria ao altar (mas eu já tinha planos). Às vezes ele saía da ligação sem avisar, mas eu sabia que ele estava tentando não chorar na minha frente.

Eu não entraria acompanhada de outra pessoa que não meu pai. Depois de muito pensar surgiu a ideia de confeccionar uma máscara com o rosto dele, feliz. Eu queria que a pessoa que usasse a máscara com o rosto dele fosse alguém que não fizesse parte do meu ciclo de amigos ou da família do Isaac, queria que fosse alguém que não tivesse nenhum tipo de ligação conosco, para que ele realmente estivesse ali apenas para representar o meu pai.

Uma amiga me indicou um amigo alto e magro como o meu pai. Combinamos tudo.

O dia 18 de novembro, data do nosso casamento, finalmente chegou e eu estava com o coração a mil. A cerimônia estava marcada para ser ao ar livre, no jardim da casa dos avôs dele. Todos os familiares estavam acompanhando nosso grande dia pela internet. O Isaac já estava me esperando, a música tocou e eu fui. Fui rindo, chorando, tremendo e quase caindo de nervoso.

‘Meu pai’ veio ao meu encontro e ver aquele sorriso na máscara me fez ver o meu pai ali, orgulhoso e realizando um sonho nosso. Não sei explicar a realidade que aquilo se tornou para mim. Depois que eu vi vídeo da reação dele, acompanhando tudo de casa, pude perceber que valeu muito a pena.

Para viver esse momento comigo, mesmo que a distância, minha mãe preparou um almoço especial na casa deles, em Brasília. Ela, meus irmãos e meu pai estavam vestidos como se estivessem realmente na minha cerimônia de casamento. Senti, que apesar das condições, nosso casamento foi mágico e não ficou um vazio no coração de ninguém.”