Previdência paga 12 vezes mais para ricos do que para pobres
Relatório da Fazenda recomenda mudanças nas regras de aposentadoria para reduzir desigualdade, entre outras ações
A demora na realização de uma reforma da Previdência tem mais do que um custo fiscal para o Brasil. Ela acentua a desigualdade, um dos dados mais perversos da economia. Estudo sobre os principais desafios do país divulgado nesta quarta-feira pelo Ministério da Fazenda mostra que o sistema previdenciário do Brasil paga 12 vezes mais para os mais ricos do que para os mais pobres. O levantamento considera os benefícios do INSS e os dos servidores públicos.
– Isso ocorre porque o regime do INSS tem um teto, e o dos servidores é muito mais alto. Existe extrema desigualdade na aposentadoria. É um sistema desumano – afirma o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas.
Segundo o relatório, de todos os benefícios previdenciários, só 3,3% vão para a parcela mais pobre da população, como antecipou a colunista do GLOBO Míriam Leitão. Isso equivale a R$ 17,8 bilhões. Enquanto isso, os mais ricos ficam com 40,6% do bolo – ou seja, 12 vezes mais -, o que representa R$ 243,1 bilhões.
Isso é o inverso do que ocorre no Bolsa Família, em que mais de 44% do total de benefícios vão para a parcela mais pobre da população.
Com a conta, a equipe econômica busca frisar para o futuro governo a importância da reforma da Previdência, considerada a medida mais importante de uma série de recomendações listadas no documento de quase 40 páginas.
Para especialistas, a chave para atacar a desigualdade é focar em uma reforma que acabe com as diferentes regras de acesso, principalmente entre servidores públicos e aposentados da iniciativa privada.
Luís Eduardo Afonso, professor da USP, destaca que as diferenças se multiplicam no sistema previdenciário: servidores recebem mais que aposentados do setor privado; benefícios por tempo de contribuição são maiores que os por idade; aposentadorias urbanas são maiores que rurais.
– A convergência de regimes é fundamental – diz ele.
Uma das ideias em análise pelo novo governo é que servidores que ingressaram na carreira antes de 2003 só possam se aposentar com integralidade (recebendo o último salário) e paridade (tendo direito ao mesmo reajuste que os ativos) ao atingirem idade mínima de 65 anos. Essa medida tornaria mais igualitários os regimes previdenciários.
No estudo da Fazenda, os técnicos afirmam que a proposta de emenda constitucional (PEC) que tramita na Câmara dos Deputados é um bom “ponto de partida”. Logo após a eleição, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, buscou apoio para aprová-la, mas a ideia não foi à frente.
Reforma fatiada
Nesta quarta-feira, Bolsonaro disse que pretende colocar em votação um projeto de reforma nos primeiros seis meses. Como já tinha dito na terça-feira, ele afirmou que a reforma poderá chegar ao Congresso fatiada, com pontos agregados em diferentes projetos, para facilitar sua aprovação.
– O que mais interessa, num primeiro momento, é a idade mínima. Então vamos começar com essa. É a ideia, mas pode mudar, e isso não quer dizer que houve recuo, é sinal de que houve mais negociação. Mas a ideia é começarmos pela idade e depois apresentarmos outras propostas .