ARTE

Eduardo Kobra completa 35 anos de carreira e inaugura painel na ONU

Ícone da arte de rua mundial, grafiteiro estuda forma de restaurar e preservar seus murais em mais de 30 países

Eduardo Kobra completa 35 anos de carreira e inaugura painel na ONU (Foto: Reprodução/Youtube)

“Nunca fui um bom aluno, meu interesse estava da janela para a rua.” A fala é do artista plástico, grafiteiro e muralista Eduardo Kobra em cena do documentário “Kobra — Autorretrato”, que teve sua primeira exibição no Festival do Rio e chega aos cinemas dia 17 de novembro. Antes disso, porém, será exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que acontece entre o dia 20 e 2 de novembro.

De fato, Kobra nunca tirou os olhos da rua. Lá se vão 35 anos desde que, em 1987, o garoto de 12 anos começou a fazer seus primeiros desenhos nas ruas do Campo Limpo, periferia de São Paulo. No filme dirigido por Lina Chamie, o artista popular por seus murais coloridos repletos de formas geométricas dá detalhes sobre seu processo criativo e o início da carreira, quando, sem apoio da família, decidiu pintar os muros da rua.

— É um filme sobre a pessoa dele (Kobra). Falamos do artista para então entender a gênese da obra — relata Chamie. — É um cara simples, que vem da periferia e que passou por várias dificuldades. Quis mostrar esse cara que tem um trabalho colorido e vibrante, mas que é tímido, calmo e centrado.

Em cena, Kobra fala abertamente sobre lidar com depressão, insônia e consumo excessivo de álcool e medicamentos ao longo dos anos. Ele relata a falta de apoio no início da carreira e o trauma de ser expulso da casa dos pais, que “não viam o grafite como um trabalho de verdade”. Grafite, por sinal, que considera a única constância em sua vida.

— Do dia em que eu comecei até hoje, eu nunca parei. Foi uma conexão muito intensa com esse universo da rua, desde o primeiro dia em que peguei um spray na mão, senti que eu faria aquilo pelo resto da minha vida, independentemente da circunstância — conta Kobra, de 47 anos, em conversa no Cine Odeon, tradicional sala localizada na Cinelândia, Centro do Rio. — Sigo com a mesma paixão e a mesma dedicação de quando comecei. Cada convite que recebo não é apenas um trabalho, é um orgulho, uma missão.

Ícone da arte de rua

Hoje, Kobra é um dos maiores nomes da arte de rua do mundo, com mais de três mil murais espalhados por cerca de 35 países. E este número poderia ser ainda maior. O artista conta que recusou cerca de 40 convites internacionais nos últimos dois anos em razão da pandemia. Agora, voltou a trabalhar fora do país e inaugurou em setembro um mural de 24 metros de comprimento por 14 metros de altura em uma das fachadas da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York.

O novo mural vem para fortalecer uma relação próxima do artista com a cena da arte de rua da cidade americana, que sempre admirou. Atualmente, 22 murais de Kobra podem ser vistos em Nova York — só perde para São Paulo.

— Kobra foi um dos primeiros artistas a conquistar espaço nas ruas — destaca Baixo Ribeiro, curador e ativista urbano. — As ruas paulistanas precisaram ser conquistadas, elas sempre foram de difícil atuação para o artista urbano, com muita repressão policial. Ele também conquistou um reconhecimento internacional difícil de conseguir.

Inquieto e autodidata, Kobra brinca que até hoje não fala inglês, mas que conversa por meio de sua arte e de seus muros por todo mundo.

— A arte é universal. Assim, é possível falar todas as línguas e me conectar com diferentes culturas mesmo sem trocar uma palavra — diz ele.

Obra para ficar

O artista considera o painel “Etnias”, na Zona Portuária do Rio, uma de suas obras mais importantes. O mural, inclusive, está visivelmente desgastado pelo tempo, o que despertou a atenção do “pai da criança”.

— Não podemos deixar esse mural simplesmente desaparecer. É importante criar murais novos, mas estou começando um projeto para manter, preservar e restaurar os que já foram feitos — diz o artista, que também procura parceiros para a iniciativa. — Era comum na história da street art você aceitar que trata-se de uma arte efêmera, que pode se desgastar, pode ser apagada, mas tenho colocado uma outra opinião sobre isso.