VIOLÊNCIA

Em cinco anos, Brasil teve quase 20 crianças e adolescentes mortos por dia

Relatório inédito mostra ainda que 123 vítimas nessa faixa etária foram estupradas a cada 24 horas

Governo Bolsonaro ignora desaparecimentos pela polícia, e país tem apagão de dados (Foto: Pexels)

Em cinco anos, o Brasil teve 34.918 crianças e adolescentes assassinados, uma média de quase 7 mil crimes por ano, entre 2016 e 2020. É o mesmo de dizer que quase 20 deles foram mortos a cada dia, segundo dados inéditos de um relatório lançado na manhã desta sexta-feira pelo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A grande maioria das vítimas de mortes violentas intencionais (MVI) são adolescentes entre 15 e 19 anos (88%), do sexo masculino (91%) e negros (75%), de acordo com o estudo. Analisada a série histórica dos dados gerais, a violência letal teve um pico entre 2016 e 2017, e caiu nos anos seguintes. Crimes envolvendo crianças com idades entre 0 e 4 anos, entretanto, registraram aumento (27%) nesse período. Meninos negros foram a maioria das vítimas em todas as faixas etárias.

Os dados fazem parte do relatório “Panorama da violência letal e sexual contra crianças e adolescentes no Brasil”, que traz um levantamento das MVIs entre 2016 e 2020. Por MVI, entende-se a soma de homicídios dolosos, feminicídios, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e mortes em decorrência de intervenção policial.

Para Danilo Moura, oficial de Monitoramento e Avaliação do Unicef no Brasil, o estudo evidencia como o Brasil expõe crianças e adolescentes a níveis inaceitáveis de violência, e que eles não estão a salvo nem mesmo dentro de suas casas.

– Não vou dizer que o resultado é uma surpresa, infelizmente. A principal informação é o quão prevalente é a violência na vida das crianças e adolescentes no Brasil – afirmou. – Seria um número alto para qualquer faixa etária, mas, se pensarmos que concentra só crianças e adolescentes, é absurdo.

Transição da violência

À medida que a criança cresce, há uma transição na dinâmica das mortes, segundo apontou o estudo. As menores são vítimas, principalmente, da violência doméstica – assassinadas dentro de casa, por pessoas conhecidas e por meio de instrumentos mais “íntimos”, como armas brancas e agressão física. Nesta faixa etária, o gênero e a raça são menos determinantes.

Já os adolescentes sofrem, em especial, com a violência armada típica das áreas urbanas no Brasil nas últimas décadas. Para os meninos, a faixa etária dos 10 a 14 anos marca a passagem da violência doméstica para a urbana. Dos 15 aos 19, essa substituição se consolida. Nessa faixa etária, de acordo com o relatório, as mortes ocorrem fora de casa, em geral por armas de fogo. Intensifica-se a vitimização de meninos negros.

Armas de fogo são o instrumento utilizado na maioria dos crimes. De 2016 a 2020, houve um aumento das mortes causadas por esses instrumentos, em especial no último ano. Desde que assumiu, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vem escalando a flexibilização do acesso a arsenal antes controlado.

Em 2020, segundo o estudo, 68% das mortes com vítimas de 10 a 14 anos foram praticadas por arma de fogo, 19% por armas brancas e 3% por agressão. No caso de vítimas de 15 a 19 anos, em 85% dos casos as mortes ocorreram com o emprego de armas de fogo e 10%, com armas brancas.