Em funk, milícia exalta domínio no RJ: ‘Tem AK e tem Glock pra todo lado’
PF aponta vereador como líder de grupo paramilitar que domina Nilópolis
A Polícia Federal encontrou nas mensagens trocadas entre milicianos alvos da operação Hoste uma letra de funk em que o grupo paramilitar exalta o controle de território em Nilópolis, cidade na região metropolitana do Rio de Janeiro.
Segundo a PF, o vereador Mauro Rogério Nascimento de Jesus (PSD) é o líder da milícia. O político conhecido como Maurinho do Paiol é vice-presidente da Câmara de vereadores local e já foi policial militar e secretário municipal da Defesa Civil da cidade. Ele foi preso na quinta (10).
“Oi, morador, fica tranquilo que o nosso bloco chegou. Quem é paz, vai ter paz. Quer Kaô, vai ter Kaô. O bloco tá fazendo a ronda, ninguém passa, tudo para. Pegou a Nilo Peçanha, Cabuis e Madeu Lara. Essa é a nova Nilópolis, tá tudo monitorado”, diz trecho da letra.
Para a PF, a existência de uma música exaltando a atuação do grupo mostra o “enraizamento sedimentado de um verdadeiro estado de coisas ilícitas”.
“É de conhecimento público e geral que os investigados fazem parte de um mesmo grupo de natureza criminosa e, a partir de cooperação mútua, desenvolvem e mantém ativo esquema antijurídico que, a um só tempo, propicia a exploração clandestina de serviços públicos, impõe o monopólio mediante ameaça de atividades regulares”, afirma a PF.
Além de Maurinho do Paiol, foram presos quatro policiais militares que, diz a PF, lucravam com a prestação de serviços clandestinos, como a exploração de transporte irregular (mototáxi), venda ilegal de botijões de gás e roubo de sinal de TV e internet —o chamado gatonet.
A letra da música também expõe como a milícia se vale do uso da força para comandar o território.
“Essa é a tropa do cerol, é melhor ficar ligado. Tem AK, tem meia-dois, tem Glock pra todo lado. De fuzil, tá destravado. Rayol vem na contenção, pega a fita bandidagem: vocês vão para o caixão”, continua o funk, citando diversos tipos de arma.
O funk também celebra os integrantes da organização criminosa que foi alvo da PF. Em um dos trechos da música, são citados Igor de Souza Nascimento, o Igor Porco, Diego Nunes Rayol, Wellington Mello e um outro conhecido como Jorginho, mas que não foi identificado pelos investigadores.
Nesses trechos, a música expõe o uso de armamento pesado como forma de intimidar os adversários.
“Quem puxa o bonde de frente, derrubando as barricadas, é o mano Igor Porco, soltando várias rajadas, de fuzil, tá destravado”, diz a letra. “Mello vem com o Jorginho, doido pra bater de frente. Pegando a Nilo Peçanha, descarregando os pente”, continua a música.
A operação, chamada de Hoste, contou com a participação de cerca de 150 agentes para cumprir 19 mandados de prisão preventiva e 29 de busca e apreensão em Nilópolis, Mesquita e no Rio de Janeiro. A ação foi feita em parceria com o Gaeco (Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado do Ministério Público).
Um relatório da apuração, ao qual a Folha teve acesso, apontou a ligação de integrantes do grupo ligado a Maurinho ao “Bonde do Ecko”, a maior milícia em atividade no Rio de Janeiro, que era comandada por Wellington da Silva Braga, o Ecko, morto pela Polícia Civil no ano passado.
Os investigadores afirmaram ainda no documento que foram levantados indícios de que a relação entre os dois grupos “vem de longa data”.
A Folha não conseguiu contato com a defesa do vereador.