Em julgamento sobre Agência de Inteligência, STF decide por limites
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) usaram a análise de um processo sobre a atuação…
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) usaram a análise de um processo sobre a atuação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para deixar claro os limites de atuação para este tipo de atividade. A ministra Cármen Lúcia foi uma das mais veementes:
— Inteligência é atividade sensível do Estado, mas está posta na legislação como sendo necessária. Arapongagem é crime. Praticado pelo Estado, é ilícito gravíssimo. O agente que obtém dados sobre quem quer que seja fora da legalidade comete crime. Não é de crime que estamos falando, é de uma norma que estabelece o comportamento que tem de respeitar limites — disse Cármen Lúcia, completando:
— O fornecimento de informações é ato legitimo, quando prestado conforme a lei. O que é proibido é que se torne subterfúgio para o atendimento de interesses particulares.
Seis dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) declararam constitucional a norma que autoriza à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) solicitar a outros órgãos informações sigilosas relacionadas à defesa nacional. Os ministros ponderaram, no entanto, que esses pedidos devem ser acompanhados de fundamentação, para que se evite o uso dos dados para objetivos particulares. Também foi decidido que a Abin só pode ter acesso a informações pessoais de cidadãos protegidas pelo sigilo mediante autorização judicial. É o caso de dados bancários, fiscais e telefônicos.
Os votos foram dados no julgamento de uma ação que a Rede Sustentabilidade e o PSB apresentaram contra a Lei 9.883, de 1999, que autoriza o compartilhamento de dados entre os órgãos de inteligências – entre eles, a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), antigo Coaf. Segundo os partidos, a Abin, como coordenadora do sistema de inteligência, teria o poder de requisitar informações sigilosas a outros órgãos. Em seus votos, os ministros esclareceram que não existe esse poder de requisição, apenas de solicitação. O compartilhamento de informações não seria, portanto, obrigatório. Cinco ministros ainda vão votar.
Na ação, os partidos também demonstram preocupação com o decreto baixado no mês passado, que reforçaria esses poderes da Abin. Para as legendas, a norma é mais um dos “abusos do governo federal”, com a intenção não de aperfeiçoar o serviço de inteligência, “mas dar mais dados à sua linha investigativa paralela” contra possíveis adversários político-ideológicos.
Segundo o decreto, órgãos de inteligência devem fornecer à Abin “dados e conhecimentos específicos relacionados à defesa das instituições e dos interesses nacionais”. Os ministros do Supremo ponderaram que o próprio decreto explica que esse compartilhamento deve ser feito de conformidade com a legislação vigente. Portanto, dados sigilosos não poderiam ser fornecidos sem autorização judicial.
Os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso lembraram que, na ditadura militar, houve uso indevido de dados de inteligência para a produção de dossiês contra adversários. Ainda assim, ambos ressaltaram que o serviço de inteligência é importante para a segurança nacional e formulação de políticas públicas.
— O Brasil da legalidade constitucional não admite autoritarismos, não compactua com a corrupção como forma de governança, põe a cobro corruptos e corruptores, protege a ordem jurídica democrática e tem um Judiciário que não se verga a ameaças ou agressões. Com ainda mais razão, o Supremo Tribunal Federal de ontem, de hoje e de sempre tem um compromisso com esta história. Tem-se um cenário em que a ausência de protocolos claros de proteção e tratamento de dados, somada à possibilidade, narrada na inicial e amplamente divulgada na imprensa, de construção de dossiês investigativos contra servidores públicos e cidadão pertencentes à oposição política, deve gerar preocupações quanto à limitação constitucional do serviço de inteligência — disse Fachin.
— A própria Abin já esteve envolvida em investigações internas ilegais que levaram à anulação de processos penais. O perigo é muito grande, a tentação é muito grande. Nada obstante isso, uma agência profissional e eficiente é importante para o país em matéria de segurança e de políticas públicas — declarou Barroso.
No julgamento, os ministros também esclareceram que a Abin só pode ter acesso a dados de investigações se eles forem públicos. Os ministros ponderaram que o serviço de inteligência não pode ser confundido com o sistema investigatório judicial. A relatora, ministra Cármen Lúcia, ressaltou que a legislação de 1999 e o decreto deste ano estabelecem limites legais para o compartilhamento de informações. Qualquer abuso, segundo ela, deve ser investigado.
Alexandre de Moraes concordou:
— Não me parece existir qualquer inconstitucionalidade na legislação que rege o sistema de inteligência. Qualquer desvio de finalidade, qualquer abuso de poder, qualquer utilização para fins pessoais do sistema de informação é crime.