Ciência

Entidades alertam para possível corte bilionário em ciência no Brasil

O alarme foi soado por duas das principais sociedades científicas do país, a ABC e a SBPC

Foto: Divulgação

Entidades de pesquisa fizeram um alerta, nesta sexta-feira (27), de que um corte de verba na casa de quase R$ 3 bilhões deve ocorrer na ciência nacional ainda neste ano. A maior fatia desse valor é do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), um fundo bilionário que os pesquisadores pedem, há algum tempo, que seja integralmente liberado.

O ministério da Ciência e Tecnologia foi procurado e não se manifestou. O ministério da Economia afirmou que não iria se manifestar sobre o assunto.

O alarme foi soado por duas das principais sociedades científicas do país, a ABC (Academia Brasileira de Ciências) e a SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência).

“É trágico”, afirma Helena Nader, presidente da ABC. “A ciência brasileira acabou”, diz, referindo-se a esse bloqueio de verbas e a outros gargalos e cortes financeiros para pesquisas que vêm acontecendo.

Dos R$ 4,5 bilhões disponíveis pelo FNDCT para este ano, R$ 2,5 bilhões seriam congelados, ou seja, mais da metade do orçamento passível de uso.

O FNDCT recebe recursos por meio do recolhimento de encargos e tributos, que, na sequência, são destinados ao fomento da ciência.

Segundo o plano do FNDCT para 2022, o valor comprometido para o ano seria de cerca de R$ 3,5 bilhões, entre projetos já contratados e outros que ainda iriam começar a receber recursos. O valor é inferior aos cerca de R$ 2 bilhões restantes após o congelamento dos recursos.

Mais de uma centena de investimentos em projetos científicos podem ser afetados pelo congelamento de recursos.

Entre eles, estão ações amplas como o Proantar (Programa Antártico Brasileiro), o Centro de Síntese sobre Mudanças Climáticas Globais e pesquisas a respeito de mitigação e adaptação à mudança climática. Também pode haver reflexo em estudos e grupos de pesquisa da área agropecuária, de saúde, mineração, energia e até de segurança e defesa nacional.

Em alguns casos, bolsas também podem ser afetadas, como no programa nacional de apoio a jovens doutores.

Segundo Nader, o orçamento que ficará disponível será suficiente somente para ações que já estão em curso (carteiras contratadas).

A presidente da ABC afirma que o FNDCT, que teria uso mais correto sendo utilizado para programas estratégicos, virou a tábua de salvação do orçamento científico geral. “O CNPq não tem mais orçamento. Depende do FNDCT”, diz ela.

A SBPC, em nota de repúdio assinada por Renato Janine Ribeiro, presidente da entidade, afirma que a verba do FNDCT é “carimbada e que deveria ser usada exclusivamente para a pesquisa científica e tecnológica do país”.

Nader e a SBPC dizem que o bloqueio vai contra a legislação. Eles citam a lei complementar 177, de 2021. O artigo 11, parágrafo 3º, afirma que é “vedada a alocação orçamentária dos valores provenientes de fontes vinculadas ao FNDCT em reservas de contingência”.

Para o corte atual, porém, Nader afirma que o ministério estaria se utilizando de semântica. “Ele diz que não cortou, está bloqueando. Foi cortado o orçamento do ministério em, no mínimo, 40%.”

“A SBPC exige que o Poder Executivo respeite a legislação em vigor e não dê sequência a esse bloqueio bilionário dos já poucos recursos do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação – SNCTI”, afirma Ribeiro, na nota. “Conclamamos o Congresso Nacional a defender o orçamento aprovado e agir para reverter estes cortes, caso eles se confirmem. É inacreditável que, mesmo depois de todas as contribuições da ciência nestes anos difíceis da pandemia de Covid-19, a ciência siga sendo atacada pelo governo federal.”

A sociedade presidida por Ribeiro classifica o bloqueio orçamentário como um “ataque do governo federal à ciência brasileira”.

Na mesma linha, Nader diz que não acha que o corte não seria ao acaso. “Eu acho que eles não acreditam que precisam de ciência. É um projeto de nação que eles têm. Não é o meu”, diz a pesquisadora, afirmando, em seguida, que ciência gera emprego.