IMPRENSA

Entre brigas e demissões, Jovem Pan vive crise de identidade

Emissora vem tentando se tornar mais plural, mas não está conseguindo

Entre brigas e demissões, Jovem Pan vive crise de identidade (Foto:Divulgação)

Nos Estados Unidos, é comum que um veículo de comunicação assuma abertamente suas opiniões políticas. O jornal The New York Times, por exemplo, é de centro, com uma ligeira inclinação para a esquerda. No canal de notícias MSNBC, esta inclinação é mais acentuada. Já seu concorrente Fox News não deixa dúvidas: é de direita, e cada vez mais extremista.

Aqui no Brasil, quase toda a mídia se diz neutra, mas sabemos que não é bem assim. Até mesmo a Folha, que defende uma imparcialidade radical, já publicou seu posicionamento a respeito de diversos assuntos, como a liberação das drogas e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

O atual governo, que sempre apostou na polarização, fez com que muitos órgãos de imprensa deixassem mais claras suas preferências. E ainda propiciou o surgimento de um canal de TV tão alinhado com o bolsonarismo que parece até um veículo oficial, a Jovem Pan News.

Chamar a Jovem Pan News de TV traz um certo exagero. O canal está mais para uma rádio com imagens, transmitindo ao vivo a programação da Jovem Pan. Que, até a chegada de Bolsonaro ao poder, era uma emissora “normal”, com comentaristas de várias tendências. Mas, na nova conjuntura política, a JP não tardou a perceber que a defesa incondicional do presidente, e até mesmo a difusão de fake news favoráveis a ele, atraíam ouvintes e anunciantes.

Os tempos mudaram novamente, e Lula foi eleito presidente. Temendo problemas na Justiça por causa da língua solta de alguns de seus contratados, a Jovem Pan desligou de seus quadros estrelas como Augusto Nunes, Caio Copolla, Carla Cecato e Guilherme Fiúza. Ana Paula Henkel também pediu demissão. Já Guga Noblat saiu por não ter endossado que a emissora sofreu censura por parte do STF.

Novos nomes começaram a aparecer na grade da Jovem Pan, como Fernão Lara Mesquita e Cesar Calejon. Este último, crítico do atual presidente, protagonizou um imbróglio esta semana, detonado durante um debate com Rodrigo Constantino no programa Três em Um de segunda-feira (14).

“Se quer comentar o caos no país, pegue um voo e venha para o Brasil, Rodrigo Constantino. Fazer isso via TV em Miami é cínico demais (…). A tua fala incorre em irresponsabilidades que encaminham o país para o colapso (…). O que você vai ter em seguida são assassinatos.”

Desabituado a ser contrariado ao vivo, Constantino levantou e foi embora, feito uma criança birrenta. Deu mais uma prova de sua imaturidade emocional ao condicionar sua permanência na Jovem Pan ao afastamento de Calejon e de Léo Grandini, que ainda não estavam sob contrato. E conseguiu.

Ao se submeter aos caprichos de Constantino, a Jovem Pan demonstra que ainda está longe de se tornar mais plural, o que parecia ser seu objetivo. As pautas alucinadas da extrema-direita ainda estão entranhadas no DNA da emissora, e não vai ser fácil se livrar delas.

Tudo isto pode ser resumido numa questão: como será a Jovem Pan daqui para a frente? Uma emissora crítica ao governo Lula, mas com um certo equilíbrio entre seus jornalistas e comentaristas? Ou uma defensora ferrenha de ideias radicais, falando para um público que tende a diminuir? Essa crise de identidade pode levar algum tempo até se resolver.