Estudo aponta primeira morte por reinfecção de covid-19 em paciente de Sergipe
Da primeira vez que se infectou o paciente teve apenas sintomas leves, sem necessidade de internação. Na segunda vez, porém, a doença se apresentou de forma grave
A morte de um farmacêutico sergipano de 44 anos por uma recorrência de covid-19, em Aracaju (SE), se tornou o primeiro caso documentado do tipo causado pela doença no país. Não se sabe se trata-se de uma reinfecção ou de uma recidiva (quando o vírus de uma mesma infecção volta a atacar o corpo).
O estudo confirmando o óbito foi publicado por pesquisadores na última sexta-feira (12) no Journal of Infection.
O artigo ainda traz o relato de 32 casos de recorrência da doença entre pacientes que atuam como profissionais de saúde no estado, inclusive um caso comprovado de reinfecção por linhagens diferentes no Brasil, ocorrido em julho de 2020, que seria o primeiro do país.
Oficialmente, o primeiro caso registrado até então pelo Ministério da Saúde de reinfecção ocorreu em 23 outubro de 2020 em uma médica do Rio Grande do Norte.
A publicação é assinada pesquisadores da UFS (Universidade Federal de Sergipe) em parceria com oito instituições.
Morte por recorrência
O paciente que morreu atuava em um hospital de urgência de Aracaju e teve o primeiro teste RT-PCR (considerado o padrão ouro de testagem) positivo feito no dia 8 de maio de 2020. Após nove dias de sintomas leves, ele voltou às suas funções normais. Não houve necessidade de internação.
Exato um mês depois, ele voltou a apresentar sintomas de covid-19. No dia 13 de junho, ele fez outro teste RT-PCR, que deu positivo. Dessa vez, porém, a doença se apresentou de forma grave: ele foi internado e morreu no dia 2 de julho.
“É um resultado importante porque o vírus está associado à morte numa recorrência. No primeiro episódio foi um caso bem leve. Ele voltar a apresentar sintomas da doença nesse intervalo já é algo incomum, e com o desfecho morte é inédito”, diz Roque Pacheco de Almeida, chefe do Laboratório de Imunologia e Biologia Molecular do Hospital Universitário de Sergipe
O cientista, que é doutor em imunologia celular e um dos líderes do estudo, afirma que não é possível saber se o caso se trata de uma recidiva ou de uma reinfecção, já que não foi possível isolar o vírus da primeira amostra de maio.
Mesmo que houvesse isso, segundo critérios adotados pela OMS (Organização Mundial de Saúde), seria necessário ter um período de 90 dias entre um caso e outro e haver um teste RT-PCR negativo nesse intervalo.
A morte do farmacêutico, diz, chamou a atenção por fugir à regra do que é visto do comportamento da doença. “Pelo que conhecemos do vírus, quando há morte de covid-19 é no primeiro episódio, nunca no segundo “, afirma.
Casos de recidivas de covid-19, com apresentação de sintomas após o período inicial, são raros, mas já foram descritos pela ciência em vários locais. “Foi em Hong Kong [na China] que teve o primeiro caso documentado; mas esse daqui, em Sergipe, foi antes dele —apenas não havíamos publicado. E o paciente lá não morreu”, afirma.
Mutação mais letal
Um dos pontos que chamou a atenção dos pesquisadores foi que o sequenciamento genômico apontou para uma mutação do vírus ligada a mortes de pessoas com covid-19 —que já havia sido descrita internacionalmente: trata-se da G25088T.
“Essa mutação tem um potencial letal grande, já era conhecida e descrita. Só encontramos ela nesse caso”, diz Roque.
Para ele, é provável que essa mutação tenha desaparecido, já que ela está associada a mais mortes do hospedeiro. Isso ocorre porque, em regra, os vírus tendem a se tornar mais transmissíveis, mas menos letais por causa do processo evolutivo deles.
Reinfecção em curto período
O estudo publicado no Journal of Infection pesquisou outros pacientes e descreveu 33 casos de pacientes que tiveram recorrência da doença.
Dos casos analisados, um chama a atenção porque se tratou comprovadamente de infecções por linhagens diferentes do vírus em um curto espaço: 54 dias entre maio e julho de 2020.
“Essa foi uma reinfecção comprovada. A pessoa pegou a doença, teve o PCR negativo depois e estava em atividades normais”, diz.
Interessante nesse caso é que o marido dela teve a doença pouco antes dela apresentar os sintomas de novo, o que nos faz ver que ela pegou o vírus com ele”
As amostras analisadas foram coletadas entre maio e julho de 2020. No caso do estudo, 93% são profissionais de saúde que tiveram a recorrência.