Ex-patroa é citada em processo e tem 10 dias para se defender
Sarí Mariana Gaspar Corte Real é ré no processo da morte de Miguel da Silva, de 5 anos, que caiu do 9º andar do prédio em que a empresária mora
O Tribunal de Justiça de Pernambuco informou, na noite de hoje, que a primeira-dama do município de Tamandaré (PE), Sarí Mariana Gaspar Corte Real, recebeu o mandado de citação como ré no processo da morte de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, que caiu do 9º andar do prédio em que a empresária mora, localizado no condomínio Pier Maurício de Nassau, na área central do Recife.
A citação foi entregue ontem por oficiais de Justiça. Agora, os advogados de Sarí Corte Real, ex-patroa da mãe do menino, Mirtes Renata Santana de Souza, têm o prazo de dez dias, a contar da data do recebimento da intimação, para apresentar a defesa da ré. O TJPE informou que o mandado de citação de Sarí Corte Real foi expedido no dia 28 de julho.
“A ré terá o prazo de dez dias para responder às acusações. Após a apresentação da defesa, o juiz José Renato Bizerra analisará a defesa da ré, podendo decretar a absolvição sumária da acusada ou dar início à fase de instrução do processo, composta por oitiva de testemunhas e apresentação de documentos ou perícias que o magistrado julgar necessários”, explicou o TJPE.
Em seguida, o MPPE (Ministério Público de Pernambuco) e a defesa deverão apresentar as alegações finais, para depois, ao final, o magistrado proferir a decisão. Ainda não há data para o julgamento.
O advogado Célio Avelino, um dos contratados para fazer a defesa de Sarí, informou que vai protocolar a defesa de sua cliente ainda nesta semana. Ele afirmou que a linha da defesa é a de que “não há culpa” de Sarí na morte de Miguel.
Menino foi deixado sozinho no elevador
Miguel morreu no dia 2 de junho depois que foi deixado sozinho em um dos elevadores do edifício, quando estava sob os cuidados de Sarí Corte Real — a mãe dele, a empregada doméstica Mirtes de Souza, havia saído para levar o cachorro da família dos patrões para passear na calçada do condomínio.
Mirtes de Souza trabalhava para o prefeito de Tamandaré, Sérgio Hacker (PSB). O menino acompanhava a mãe na casa porque a creche em que ele ficava está com as atividades suspensas devido à pandemia do novo coronavírus.
A ex-patroa da mãe de Miguel se tornou ré no processo no dia 15 de julho, pelo crime de abandono de incapaz com resultado morte. O juiz da 1ª Vara de Crimes Contra a Criança e ao Adolescente da Capital, José Renato Bizerra, aceitou a denúncia do MPPE.
Na decisão de aceitar a denúncia, o magistrado afirmou que “há indícios de autoria e materialidade do delito, conforme se extrai do caderno policial, bem como a legitimidade do Ministério Público para propor a ação”.
O MPPE denunciou Sarí pelo crime de abandono de incapaz com resultado morte, com os agravantes de cometimento de crime contra criança e em ocasião de calamidade pública, conforme o CPB (Código Penal Brasileiro)
O crime de abandono de incapaz com resultado morte tem pena de 4 a 12 anos de prisão. Com os agravantes, a ré poderá pegar a pena máxima, caso seja condenada.
Na decisão, o magistrado destacou a narrativa do MPE (Ministério Público Estadual), afirmando que “Mirtes precisou se ausentar do apartamento para efetuar uma tarefa doméstica (…) deixando Miguel aos cuidados de Sarí durante referido interregno, passando essa a ter o papel de garantidor sobre Miguel”.
O texto ressaltou ainda que Miguel teria entrado diversas vezes dentro dos elevadores do prédio, sendo que na última vez não foi retirado por Sarí do equipamento e foi deixado sozinho. “Todavia, após várias trocas de elevadores, Miguel teria apertado a tecla de alguns andares e Sarí permitido que a porta se fechasse, e fazendo com que o menor se deslocasse sozinho dentro do referido meio de transporte”.
A morte de Miguel
Mirtes de Souza precisou sair para passear com a cadela dos patrões e deixou o menino sob os cuidados de Sarí. Com poucos minutos, o menino quis ir atrás da mãe, sendo retirado por quatro vezes do elevador, mas na quinta vez foi deixado sozinho por Sarí no equipamento. Segundo a polícia, ela não fez o monitoramento do elevador para ver a trajetória do menino e voltou a fazer o embelezamento das unhas com uma manicure dentro do apartamento, que fica no 5º andar.
Miguel caiu de uma altura de 35 metros enquanto estava perdido e procurava pela mãe. O delegado Ramon Teixeira, responsável pelas investigações, afirmou que possivelmente o menino não tinha noção de que estava no 9º andar, avistou a mãe na calçada do condomínio e quis ir atrás dela, mas acabou caindo da grade em queda livre e morreu durante atendimento no hospital da Restauração, localizado na área central do Recife.
Mirtes afirmou, em entrevista ao UOL, que confiou o filho dela à ex-patroa da mesma forma que Sarí deixava os filhos aos seus cuidados. Ela disse que está vivendo o pior momento da vida ao perder o filho.
“Como pode um adulto não ter a capacidade de tirar meu filho do elevador? Foi a primeira vez que eu confiei meu filho a ela, eu nunca tinha deixado ele com ela, e ele foi para a morte”, disse a mãe de Miguel.
Sarí Corte Real chegou a ser detida em flagrante pelo crime de homicídio culposo (quando não há intenção de matar), mas pagou fiança de R$ 20 mil e foi liberada para responder pelo crime em liberdade provisória.
Em entrevista ao programa Fantástico, da rede Globo, Sarí disse ser alvo de perseguição e afirma ter medo de ser linchada.
“Terríveis [os dias]. Vivo no psiquiatra, preciso de remédio para dormir. As pessoas me julgaram antes mesmo de a Justiça me julgar, não tive nem tempo de me defender. Hoje eu não posso sair na rua, tenho medo de ser linchada. Não posso correr, não posso fazer nada. Eu, hoje, estou numa prisão dentro da minha casa”, relatou.
Prefeito teve bens bloqueados
A Justiça determinou o bloqueio parcial de bens do prefeito Sérgio Hacker no valor de R$ 580 mil, a pedido do MPE, no dia 1º de julho, porque ele colocou as três empregadas domésticas que trabalhavam para ele como servidoras comissionadas da prefeitura — uma delas é Mirtes.
Na ação, o prefeito é acusado de enriquecimento ilícito e atos de improbidade administrativa. O MPE pediu o bloqueio do dinheiro, equivalente ao valor de R$ 193 mil pagos às empregadas domésticas no período em que elas foram empregadas pelo prefeito e multa para ressarcimento do dano ao erário.
O prefeito de Tamandaré também está sendo investigado pela Draco (Departamento de Repressão ao Crime Organizado), da Polícia Civil de Pernambuco, por supostamente empregar funcionários fantasmas na administração municipal.
A Prefeitura de Tamandaré informou que Hacker devolveu os valores pagos pelos cofres municipais às empregadas domésticas e que “não houve dano ao erário com a devolução da quantia”.