Exame baseado em inteligência artificial pode ajudar a achar tratamento contra o câncer
Análise acontece a partir de grandes bancos de dados (big data), acessados e interpretados de acordo com as informações do tumor e de estudos clínicos já realizados
Um exame baseado em inteligência artificial, agora disponível no Brasil, pode dar um uma segunda chance a pacientes com câncer que não tiveram sucesso na primeira tentativa de tratamento.
Lançado neste mês pelo laboratório de análises clínicas Fleury, o exame Oncofoco é direcionado para pacientes oncológicos avançados (em geral, em fase de metástase ou com recidiva) e que não respondem aos tratamentos convencionais.
A iniciativa surge a exemplo de outras de sucesso no exterior, como uma da Quest Diagnostics e outra da Foundation Medicine, ambas americanas, diz o oncologista Mauro Zukin, do Grupo COI, do Rio. A análise acontece a partir de grandes bancos de dados (big data), acessados e interpretados de acordo com as informações do tumor e de estudos clínicos já realizados.
A matéria-prima é uma biópsia. Na primeira etapa, o DNA tumoral presente nessa amostra é sequenciado -ou seja, se o genoma fosse grande lista de frases, ela seria lida letra por letra neste momento. Assim, é possível apontar as peculiaridades genéticas naquele tumor. Podem ser analisados 72 ou 366 genes, dependendo da modalidade do exame, simples ou ampliado.
Essa soletração serve de base para o sistema Watson, da IBM, que analisa todos os artigos científicos relevantes para aquele caso. Seguindo nessa analogia, são detectadas duplicações de “letras”, repetição e falta de “palavras”, além de “erros de ortografia” genéticos.
A inteligência artificial, então, devolve, tendo em vista as alterações genéticas do tumor daquele indivíduo, uma lista de possíveis drogas e tratamentos aos quais ele poderia ser submetido, mesmo que ainda estejam em fase testes no Brasil ou no exterior e/ou sem aprovação final por agências reguladoras, como a americana FDA ou a brasileira Anvisa.
O trabalho, realizado em segundos pelo algoritmo computacional, requereria muitas e muitas horas de esforço humano em cada caso para realizar algo parecido.
“É virtualmente impossível, mesmo que dedicando 24h por dia e sete dias por semana, permanecer atualizado em todos os assuntos, mesmo que em apenas uma especialidade. O sistema faz uma curadoria dos estudos e uma análise muito extensa e sistematizada, sem viés”, explica Edgar Gil Rizzatti, diretor do Grupo Fleury.
Mas isso não quer dizer que o computador decida sozinho o futuro do paciente. Ainda há uma etapa de interpretação das conclusões do Watson por uma espécie de junta de cientistas e médicos antes da elaboração do laudo final, a ser encaminhado para o paciente e seu médico. Os exames custam R$ 5.200,00 e R$ 8.000,00 nas versões básica e ampliada, respectivamente.
Não é sempre, porém, que se encontra uma alternativa. “Programas baseados em sequenciamento genômico e tecnologia de inteligência artificial são muito promissores, uma vez que podem identificar alvos terapêuticos. Infelizmente, porém, apenas uma minoria de pacientes se beneficia”, diz o oncologista Gilberto Lopes, professor da Universidade de Miami e editor-chefe do Journal of Global Oncology, revista especializada em oncologia.
Seguindo Lopes, entre 50% e 60% dos pacientes com adenocarcinoma de pulmão encontram possíveis tratamentos. Isso, no entanto, não vale para a maioria dos demais tumores. “Pesquisas recentes sugerem que menos de 10% dos pacientes encontram alvos ou pesquisas disponíveis. Imaginamos que no Brasil o número de pacientes que encontrem uma alternativa seria ainda menor. Esperamos que isso melhore no futuro.”