Exército designa coronéis da ativa para órgão federal de inteligência em 3 estados
O comandante do Exército, o general Edson Pujol, designou três coronéis do Exército na ativa…
O comandante do Exército, o general Edson Pujol, designou três coronéis do Exército na ativa para superintendências da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) em estados do Nordeste e do Norte. O movimento voltou a alimentar o temor entre servidores da agência sobre um retorno de práticas do SNI (Serviço Nacional de Informações), marcado pela espionagem contra opositores da ditadura militar (1964-1985) e extinto em 1990.
Segundo a portaria publicada em Diário Oficial nesta quarta-feira (20), as transferências ocorrem “por necessidade do serviço” para o GSI (Gabinete de Segurança Institucional), no Palácio do Planalto, chefiado pelo general Augusto Heleno, ao qual a Abin está subordinada. O coronel de artilharia Julio Teodorico Nascimento Netto, o coronel de infantaria David Meireles e Sá e o coronel de artilharia José Gerino Bezerra Cordeiro vão para as superintendências da Abin em Pernambuco, Amazonas e Ceará, respectivamente.
Servidores da Abin receberam com surpresa as designações. Eles dizem que vão continuar cumprindo o entendimento consolidado nos últimos anos de que a agência não investiga pessoas em especial. A dúvida é se o general Heleno pretende fazer atalhos para cumprir missões indigestas para a Abin, seja usando a inteligência militar, seja ocupando os cargos civis na Abin com militares da ativa, movimento que poderia estar saindo do papel a partir das três designações.
No último dia 12, Heleno confirmou, por exemplo, que a Abin e o GSI estão “preocupados” com a organização do sínodo (reunião de bispos) da Igreja Católica sobre a Amazônia, previsto para outubro próximo no Vaticano. O sínodo organizado pelo Papa Francisco tem como tema “Amazônia: novos caminhos para a igreja e para uma ecologia integral”.
“A preocupação com o sínodo é uma preocupação real, porque o sínodo tem uma pauta que ele vai desenvolver e alguns assuntos dessa pauta são de interesse de segurança nacional. Então acaba preocupando a Abin e o GSI. Mas em nenhum momento eu falei em espionar ninguém”, afirmou Heleno no dia 12, durante velório do jornalista Ricardo Boechat.
Nas décadas de 60, 70 e 80, era comum o SNI dar grande atenção ao que chamava de “clero de esquerda”. Muitos religiosos foram presos, perseguidos e até torturados e expulsos do país a partir da espionagem dos militares. O aumento da presença militar na Abin deixa uma interrogação entre os servidores do órgão também porque os militares já têm à disposição todo o sistema de inteligência militar no Exército, na Marinha e na Aeronáutica, além do próprio GSI, todos comandados por militares.
Pouco antes de ser extinto pelo governo Fernando Collor em 1990, o SNI era coalhado de militares, mas essa presença foi sendo reduzida a partir da criação da Abin, em 1999, pelo governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Em 2015, durante o governo Dilma Rousseff (2011-2016), a Abin chegou a passar para o controle civil, com a extinção do GSI, mas a situação foi revertida a partir da posse do presidente Michel Temer, em maio de 2016. O órgão voltou ao controle militar do GSI, que foi recriado.
O motivo da designação dos oficiais do Exército para a Abin não foi esclarecido pelo governo. Em mensagem nesta quinta-feira (21), o GSI afirmou que se “trata de um ato administrativo, temporário e os oficiais não ocuparão cargos ou funções específicas da Abin”. O GSI disse ainda que “não há previsão de outras designações de militares para superintendências” estaduais da agência. A reportagem indagou qual o motivo das designações, mas não houve resposta sobre esse ponto.
Segundo o GSI, “conforme a legislação vigente, é normal haver militares das Forças Armadas cedidos à Agência, particularmente na sede da Agência, em Brasília”. A reportagem apurou, contudo, que pelo menos desde meados dos anos 2000 não se tinha notícia de oficial coronel da ativa designado para superintendência da Abin nos estados, muito menos três ao mesmo tempo.
Procurado pela reportagem na manhã desta quinta-feira (21), o Comando do Exército disse que iria responder as dúvidas, mas isso não havia ocorrido até a noite do mesmo dia. A reportagem queria saber o motivo das designações e de quem partiu a decisão, se do GSI ou do próprio comandante do Exército.