Onda de crimes

Força-tarefa é criada em Altamira após 12 mortes em menos de duas semanas

No último sábado (14), quatro pessoas que estavam em uma distribuidora, no bairro São Francisco, foram assassinadas depois de três homens efetuarem diversos disparos contra elas

Foto: Agência Pará

Uma força-tarefa foi montada neste domingo (15) em Altamira, no sudoeste do Pará, após uma onda de crimes que vitimaram 12 pessoas em menos de duas semanas.

No último sábado (14), quatro pessoas que estavam em uma distribuidora, no bairro São Francisco, foram assassinadas depois de três homens efetuarem diversos disparos contra elas. O crime ocorreu por volta das 23 horas e foi registrado por câmeras de segurança do estabelecimento.

Segundo a Polícia Civil, ao todo oito pessoas foram atingidas. Quatro morreram, sendo três delas no local e a quarta a caminho do Hospital Regional da Transamazônica.

São elas: Diego Batista Lima, 28; Nila Loiana Félix Cunha; Alcides da Costa Araújo Neto, 57 anos; e Melquis Cesário da Cunha, 38.

Outros dois pacientes continuam internados em estado grave. As duas vítimas restantes foram atendidas na Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) de Altamira com ferimentos sem gravidade na perna e no braço.

Com a chacina, agentes da Divisão de Homicídios (DH), assim como da Polícia Militar, por meio do Batalhão de Operações de Policiais Especiais (Bope), Batalhão de Rondas Ostensivas Táticas Motorizadas (Rotam), Batalhão de Ações com Cães (BAC), e ainda, o Regimento de Polícia Montada (RPMOT) foram deslocados para a cidade.

No total, mais de 60 agentes de segurança, entre policiais militares e civis, estão realizando ações preventivas e repressivas no município.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social, também há um trabalho de inteligência em curso para identificar e localizar os autores dos crimes.

O secretário da pasta, Ualame Machado, disse que as ações continuam não só em Altamira, mas em todo o território paraense. “Montamos uma força-tarefa, com estratégias voltadas para neutralizar e capturar os responsáveis pelas mortes e por outros delitos que vêm ocorrendo em Altamira”, disse.

Segundo o governador do estado, Helder Barbalho (MDB), Altamira vinha, nos últimos meses, especificamente, de janeiro a abril, com uma média de menos de três homicídios por mês.

“Após esse episódio, que destoa da regularidade que vinha sendo apresentada, compreendemos ser fundamental o diálogo com o Ministério Público e com o Poder Judiciário para que haja celeridade nas decisões cautelares, já que as linhas investigativas proferidas pela Polícia Civil nos colocam, claramente, diante do que está gerando o aumento da criminalidade no município de Altamira”, disse.

Ainda no domingo (15), no primeiro dia de operação, um casal foi preso em flagrante por tráfico de drogas. Os dois estavam em uma das residências suspeitas de envolvimento nos crimes.

Apesar das ações, Aiala Couto, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, disse à reportagem, que, paralelamente à presença das forças de segurança pública, é necessária uma consolidação de projetos sociais e de políticas públicas que gerem oportunidades reais e cidadania aos moradores da cidade.

“A região de Altamira se transformou em um grande caldeirão de conflitos por ser uma área que é conectada pelas Rodovias Transamazônica e BR-163 em direção ao Amazonas, o que cria condições favoráveis para o escoamento de todo e qualquer tipo de produtos ilegais, entre os quais a madeira contrabandeada e o tráfico de cocaína.”

Para Couto, essa rota é uma herança perversa da construção de Belo Monte e do crescimento espontâneo e desordenado da população.

A estimativa atual da população de Altamira é de 117.320 habitantes, segundo o IBGE. Em 2010, um ano antes do início das obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, era de 99.075.

“O empreendimento permitiu que a cidade crescesse sem um acompanhamento de políticas urbanas ou políticas públicas. Isso favoreceu o aumento de facções do crime organizado que passaram a disputar então zonas territoriais. E o resultado é esse. Uma das cidades mais violentas do país. Para mudar isso, é preciso que o poder público crie estratégias significativas fazendo então com que a região seja incorporada a uma lógica de paz e uma cultura de civilidade.”

Dados do Atlas da Violência de 2019 colocavam a cidade de Altamira como a segunda mais violenta do Brasil, perdendo, apenas, para Maracanaú, no Ceará.

No relatório de 2021, a cidade não constava mais na segunda posição, mas ainda estava entre as 15 mais violentas do país. Em 15º estava outra cidade paraense, Marabá, no sudeste do Pará. Lembrando que o Brasil conta com 5.568 municípios.

Em 29 de julho de 2019, Altamira registrou segunda maior chacina registrada dentro de uma casa penal no Brasil. Na ocasião, 58 pessoas foram brutalmente assassinadas no Centro de Recuperação de Altamira. O contexto era de disputa pelo domínio da unidade entre as facções Comando Classe A (CCA) e Comando Vermelho (CV).

A chacina foi a maior desde o massacre do Carandiru, em outubro de 1992, quando 111 presos foram assassinados na Casa de Detenção de São Paulo.

À reportagem, Marcelo Salazar, amigo de uma das vítimas, Marcelino Souza, 31, que foi morto em sua própria casa, no bairro Mutirão, lamenta a escalada da violência na área urbana e também na zona rural em terras indígenas e unidades de conservação.

“São muitos compromissos das condicionantes de Belo Monte ainda não cumpridos e outros cumpridos muito fora do prazo (novo presídio por exemplo). Além disso, há planos frágeis para a área da segurança pública, proteção de terras indígenas e também para educação e geração de emprego e renda”, afirma ele.

Salazar diz que trabalhava com Marcelino no apoio a rede de cantinas da Terra do Meio, uma rede que conta com 14 associações conectadas a terras indígenas, unidades de conservação, que se organiza para comercializar os produtos dos povos tradicionais a um preço melhor e em condições mais favoráveis para esses povos.

“O Marcelino fazia parte do grupo de pessoas que prestava serviços para a rede na cidade de Altamira, organizando a produção que vinha das terras indígenas e unidades de conservação para depois enviar para diferentes parceiros. A suspeita é que, infelizmente, ele levou tiros que não eram para ele”, acrescenta ele.