Frias demite 174 pareceristas da Lei Rouanet, que dizem não terem sido informados
Papel dos pareceristas era analisar projetos interessados em captar recursos via Lei Rouanet
Foi dispensado pelo governo Bolsonaro, nesta terça-feira, um grupo de 174 pareceristas responsáveis por analisar os projetos culturais que buscam apoio da Lei Rouanet.
Segundo a publicação no Diário Oficial da União que oficializou o descredenciamento, as demissões estão ligadas a reiteradas tentativas de contato formal com os pareceristas. A publicação menciona também um artigo do edital que selecionou os pareceristas, em que se afirma que “emissão de parecer técnico considerado insatisfatório” pode resultar em descredenciamento.
A reportagem entrou em contato com três dos pareceristas descredenciados e todos afirmam que não foram contatados pela Secretaria Especial da Cultura ou por alguma de suas entidades vinculadas, como a Funarte, a Fundação Nacional de Artes.
“Eu estou chocado. A gente é que está com uma dificuldade imensa de se comunicar com eles desde 2017”, afirma o artista e parecerista cultural Ravel Andrade, que atua como parecerista da Secretaria Especial da Cultura desde 2014. “Não respondem nossos emails, não atendem ligação”, diz.
Ele diz que, em seu período de parecerista, a secretaria só enviou quatro demandas de análise de relatório de cumprimento de objeto. Ele afirma ainda que tentou entrar um contato com a secretaria após um problema envolvendo pagamento por seus serviços, mas não conseguiu solucionar o problema.
Pareceristas da Lei Rouanet dizem que Frias quer submissão
Andrade afirma que não cabe ao parecerista definir quais e quantos projetos serão analisados por quem, mas sim se pôr à disposição da Secretaria Especial da Cultura.
A gestora cultura Alexandra Lima, que também está entre os pareceristas descredenciados, diz que só ficou sabendo da dispensa por meio de um grupo de WhatsApp composto por pareceristas. “A justificativa apresentada por eles é que tentaram de todas as maneiras entrar em contato com os pareceristas e não tiveram resposta. Isso não procede, pelo menos não da minha parte”, diz. Ele conta que é parecerista desde 2015 e que nunca foi enviado a ela um projeto para análise.
“Na verdade eles nem entraram em contato. Eu por exemplo não tenho acesso ao Salic [Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura, plataforma da Lei Rouanet] há mais de 40 dias, eu fui bloqueado”, diz o parecerista José Luís de Freitas, também descredenciado.
Segundo ele, o relacionamento da secretaria com os pareceristas é há muito tempo marcado pela desorganização, mesmo antes do governo Bolsonaro. “Eles simplesmente ignoram, deixam de lado, não enviam projeto”, diz Freitas.
“Eu fui cadastrado em 2015 e desde então eu nunca recebi um único projeto da Funarte ou da Biblioteca Nacional. Assim como eu, vários outros pareceristas nunca receberam nada. É uma bagunça”, diz.
Os três pareceristas ouvidos pela reportagem afirmam que costumam fazer postagens abertamente anti-Bolsonaro nas suas redes sociais.
Um recente parecer supostamente técnico citou Deus para reprovar um projeto de um festival de jazz que se dizia antifascista.
A reportagem tentou contato com a Secretaria Especial da Cultura, mas não obteve resposta até o momento desta publicação.
Nas redes sociais, diretora do departamento de fomento indireto da Secretaria Especial de Cultura, Flávia Faria Lima, afirmou que “o grupo de pareceristas que está sendo descredenciado é um grupo que não respondia aos chamados e, portanto, estava prejudicando o setor”. E afirma que “em breve faremos novo chamamento para cobrir este número”.
Os pareceristas são responsáveis pelas análises preliminares dos projetos que pleiteiam captar recursos via Lei Rouanet. Nas fases finais, os projetos são apreciados pela Cnic, a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, que está paralisada há seis meses. Só nesta semana, a gestão Frias lançou um edital para nova composição, que deve entrar em vigor em 2022.