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Funbites se prepara para fazer seu primeiro jogo 3D

Desenvolvedora local faz grandes planos para o futuro

Entre as muitas vantagens da democratização da internet, surgiu o mercado independente de games. Agora, basta fazer um bom jogo e conseguir juntar uma base de fãs para tirar um projeto do chão. Plataformas de financiamento como o Kickstarter e de distribuição como a Steam cortaram o intermediário e pouparam milhões em dinheiro que agora pequenos desenvolvedores de garagem podem investir no que realmente importa: seus sonhos. Com pouco mais de dois anos de vida – talvez três, há controvérsias – A Funbites Game Mechanics, desenvolvedora aqui de Goiânia, começa a dar os seus primeiros passos em direção à autossuficiência e começa a pensar grande.

Até agora, a empresa pode não ter explodido, mas já traz consigo um currículo respeitável com cinco prêmios Sebrae de desenvolvimento e um aplicativo contemplado em um concurso do Ministério das Comunicações. Até este momento, eles lançaram alguns jogos casuais mais simples para celulares, mas a coisa acaba de ficar séria: ainda no começo de junho eles devem lançar seu primeiro jogo completo e já começar a se dedicar exclusivamente a seu primeiro projeto comercial em grande escala e em 3D. Planos grandes para uma equipe composta por quatro pessoas: os programadores João Bertolino e Bullas Attekita, o especialista em interface Gustavo Camargo e a diretora de arte Michelle Santos. Mas vamos por partes. A primeira novidade é a versão completa do jogo Pizza Mania, disponível para celulares como um puzzle de pizza baseado em tempo, que vai ganhar um upgrade significativo. “Ele vai chamar Pizza Mania: alguma coisa, para diferenciar do outro, mas ainda não decidimos o nome”, conta Gustavo.

João conta que ele sempre foi pensado como um jogo maior e que este objetivo finalmente foi alcançado: “quando a gente pensou o Pizza era pra ele ter uma história, narrativa, você ia desenvolver sua pizzaria. Com o concurso, acabamos fazendo só o que seria uma parte do Pizza Mania, o pizza rush, que é só o de fazer pizza rápido”. Atualmente, ele está passando por uma bateria de testes e deve estar disponível para celulares em cerca de 15 dias. Gustavo garante que outra diferença, além da jogabilidade, pela primeira vez não será um lançamento silencioso: “tem toda uma questão de marketing também, uma divulgação em cima, vamos fazer um release, vamos mandar pra mídia, para os sites internacionais”. Já Bullas destaca a evolução do jogo que, garante ela, foi refeito umas três vezes e que se modificou bastante ao longo do tempo: “daquela versão pra essa, mudou muita coisa, inclusive em gameplay, cresceu bastante. Você compra coisas pra sua pizzaria, pode equipar. Entra a parte de gerenciamento, você tem que cuidar da pizzaria e agora temos missões”.

Ou seja, está mais perto de um sim do que de outros gêneros. Na versão anterior, como forma de monetizar, a equipe testou anúncios que apareciam de maneira aleatória no jogo. Agora, Gustavo explica que vão tentar uma nova abordagem, incluindo microtransações e recompensas para o jogador que se prestar a assistir anúncios: “Por exemplo, ele pode comprar pacotes com microtransações e tem publicidade. Ele quer ganhar aquele chapéu e avançar na história, ele pode assistir uma propaganda pra ganhar aquilo mais rápido. Mas o jogador também pode jogar o jogo completo sem gastar nada e sem ver nenhuma propaganda”.

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E agora para os grandes planos: a humilde equipe goianiense conseguiu aprovar seu primeiro grande projeto comercial, o jogo Echo, pelo Itaú Cultural, com um orçamento de R$ 200 mil. “É um subsídio para projetos de arte e esse subsídio é bem diferente das leis governamentais, é lei de parceria mesmo, eles também dão consultoria jurídica e artística de acompanhar o projeto”, explica Michelle. O jogo será de aventura, focado em exploração, escolhas e narrativa, algo parecido com os jogos da Quantic Dreams e da TellTale. “É um projeto de jogo 3D, será um desafio pra gente. É nosso primeiro jogo 3D e até agora só tínhamos feitos jogos casuais e jogos de treinamento. É um jogo maior, a temática vai envolver viagem no tempo, vai ter um loop temporal no qual o jogador está e terá que trabalhar como um adventure, desvendendo a trama, resolvendo puzzles e desafios, explorando o cenário para avançar. Queremos trabalhar com temas de ficção-científica, mas também com elementos de problemáticas sociais. Eu não posso contar porque faz parte do enredo”, ela explicou.

Vai ser um trampo tão pesado que a pequena equipe vai ter que expandir, contratando mais funcionários para ajudar no desenvolvimento (então se você quer trabalhar com jogos, pode preparar o seu currículo). Porém, exatamente por ser um projeto grande com muita coisa em jogo – tipo o destino de toda a empresa e sua trajetória até agora – a Funbites não pretende se arriscar loucamente nem se aventurar em ferramentas desconhecidas ou tentar reinventar a roda: “a gente vai tentar manter o pé no chão, a gente quer fazer desse projeto o melhor possível, mas ele tem que sair”, disse Gustavo. Michelle completa: “Em termos de ferramenta, nós vamos ficar nos mais tradicionais e com as quais já estamos familiarizados, vai depender um pouco de quem vai trabalhar com a gente”.

Mesmo com bastante planejamento, o frio na barriga é inevitável, mas a equipe acredita que toda a experiência obtida até agora contribuiu para amadurecê-los para isso: “medo a gente sempre teve, o medo ajuda. Se a gente acha que agora a gente tá bom demais, acaba que não dá certo. Temos medo, mas temos competência, as coisas vão acontecendo na dificuldade mesmo”, conta João. Para Bullas, os anos até agora foram fundamentais para a questão processual mesmo, afinal, um jogo não nasce da noite pro dia, demandando não apenas tempo, mas organização: “todo o procedimento de como fazer um jogo a gente aprendeu na lata e de lá pra cá a gente aprendeu muito e é o que a gente vai utilizar agora; nós estamos preparados para pegar um projeto grande e fazer essa gerência funcionar”. E ainda tem isso, o aspecto empresarial, que não pode ser negligenciado: “o que mais aprendemos foi o processo gerencial. Agora é um projeto grande. Antes passava alguma coisa, agora não pode mais”, afirma Gustavo, “mexer com dinheiro a gente ainda está aprendendo. A cada passo a gente descobre alguma coisa nova, ‘opa, a gente tem que pagar isso aqui?’. É uma coisa que se aprende levando porrada”.

Inclusive, paciência e cuidado foram as principais qualidades destacadas pela equipe quando perguntada sobre o que aprenderam e o que foi necessário nessa breve, mas exigente, jornada até aqui: “é um processo que exige paciência. Talvez uma pessoa com menos paciência não teria se saído bem. Tem gente que acha que em um ano já dá pra ter uma empresa consolidada. A gente tem três. Formada por uma equipe de estranhos, até a gente se habituar, mudar de linguagem de programação, criar afinidade”, conta Michelle. Ela completa dizendo que, ao dar esse próximo passo com Echo, há uma sensação real não apenas de realização, mas de profissionalização: “É um passo muito grande e agora poderemos nos dedicar inteiramente a fazer jogos, antes ainda tínhamos que pegar outras coisas, outro emprego, fazer freela. É um crescimento. Receber a validação do grupo de jurados do Itaú Cultural significou muito pra mim”. Bullas é ainda mais pragmática: “na lata, a gente vai viver disso agora”, despertando sorrisos nervosos por toda a mesa.

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O grupo agora possui plena consciência de que um processo como esse pode ser um sumidouro de dinheiro e de que não vão embolsar nada: cada centavo vai ser investido na empresa e no jogo. “Uma coisa boa que a gente aprendeu com os concursos do Sebrae é que você recebe o dinheiro rápido, mas já tem que investir tudo imediatamente. Então a gente aprendeu cedo isso de como investir na empresa, isso ajudou a formar responsabilidade. O Itaú é bem aberto, mas temos o compromisso de prestar contas e isso dá mais seriedade ao projeto”, conta João. “A gente sempre pensou de forma empresarial. A cada dinheiro que a gente recebeu, a gente investiu em fazer outro jogo, pagar as contas, comprar equipamento, guardar. Não dividimos entre a gente, ele é uma chave pra gente levar isso a sério”, completa Gustavo.

Mesmo em fases tão iniciais, é possível falar em lançamento? Michelle suspira: “o projeto vai levar anos!”. João é mais prático: “temos um cronograma de um ano aprovado por eles, mas o edital permite levar até três anos”. O plano é investir no cenário independente para PCs, tentando lançar o jogo pelas principais plataformas online de vendas – a Steam, a Humble e o GOG – mas também tentar por outros meios, como a Windows Store e talvez até em mídia física, se possível. E vai ser completo, com trilha sonora e até dublagem.

Eles ainda estão em dúvida se tentam tocar outros projetos menores juntamente com Echo: “A gente tem o Starving Dead e é uma versão alfa e estávamos pensando se tocamos ele pra virar um produto ou o deixamos de lado um pouco. Se vamos fazer um jogo acabado, redondo, mas menor que o Pizza Mania“, explica Gustavo. O grupo contou que ficou muito satisfeito e um pouco surpreso com a aprovação do edital. O motivo é simples: para muitas bancas, video game não é cultura e muito menos arte, posições e preconceitos criticados por eles: “a gente até tentou os fundos locais, mas a banca não considerou jogo como arte nem como algo cultural. Ainda há relutância por parte de muita gente. A Rouanet seria uma perspectiva muito melhor, mas com o intrave do Mec, é complicado”, disse Michelle. “A noção que o brasileiro tem de cultura é muito superficial. Até o que as pessoas entendem da própria lei Rouanet é errada. Em termos culturais, o Brasil tem muita coisa pra aprender”, disse Gustavo.

João contou que alguns fundos, inclusive o estadual, não viam o retorno social que um jogo pode ter: “Para o Itaú, o produto é o próprio retorno para a sociedade. É uma perspectiva muito mais madura em relação a isso”. Michelle complementa que é uma questão do modo de se pensar os video games: “é interessante o próprio desenvolvedor pensar em video games como arte e entretenimento. Tem muita gente que se foca muito no técnico, na programação, mas é importante também pensar em jogos como uma forma de expressão, algo passível de impacto social, mesmo entre jogos comerciais”. Enfim, quem sabe a Funbites não acabe bebendo das águas de uma certa CD Projekt Red, uma pequena loja de CDs de PlayStation e fitas de Super Nintendo fundo de quintal da Polônia que venceu todos os prêmios de Jogo do Ano em 2015 com The Witcher 3: Wild Hunt e que agora consegue fazer jogos na casa dos milhões de forma completamente independente. Já pensou, de Goiás para o mundo? Vamos torcer.