ASSÉDIO NO TRABALHO

Empresa goiana chama assédio de “paquera” e terá que indenizar vítima em R$ 71 mil

Na decisão, o Tribunal Superior do Trabalho entendeu que apesar dos relatos da trabalhadora, empresa não tomou providências.

Uma empresa goiana do mercado de varejo chamou assédio de “paquera” durante processo movido pela vítima e terá que indenizar a funcionária. O caso de assédio sexual no trabalho ocorreu na sede da companhia, em Trindade, na região metropolitana de Goiânia.

A decisão é da sétima turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que aplicou ao caso o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e estipulou a reparação em R$ 71 mil.

Perseguida por encarregado, empregada resistiu ao assédio e não foi promovida

Segundo o processo, o assédio começou quando a balconista foi chamada para um teste na seção de açougue com duração de seis meses. Se fosse promovida, ela teria aumento salarial.  No início, ela disse que o encarregado fazia elogios à sua forma física e sua beleza, mas depois as investidas se intensificaram, com tentativas de beijos e de contato físico forçado.

Ao fim do período de teste, ela foi reprovada como açougueira e disse que passou a ser perseguida pelo encarregado, “recebendo advertências por tudo”. Foi então que decidiu levar o caso ao setor de recursos humanos da empresa e relatar o assédio, mas, segundo ela, suas alegações foram desacreditadas pelo setor. 

A situação levou a empregada a entrar com um processo trabalhista contra a empresa com pedido de indenização por danos morais e de rescisão indireta do contrato de trabalho. Esse tipo de rescisão é uma espécie de “justa causa” do empregador: se for comprovado que ele cometeu uma falta grave, a pessoa tem direito a todas as verbas rescisórias que receberia se a dispensa fosse imotivada.

Empresa goiana classificou assédio como “paquera”

Ao saber da ação, a empresa disse que a empregada mentiu “descaradamente” a fim de enriquecer à sua custa. Segundo a varejista, “a balconista e o encarregado se paqueravam durante o horário de trabalho”, e, como a empregada achou que ele havia sido responsável por sua reprovação no teste para açougueira, teria “armado” a situação de assédio sexual.

O juízo da 18ª Vara do Trabalho de Goiânia condenou a empresa a pagar indenização de R$ 30 mil, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) excluiu a condenação porque a balconista não teria comprovado que as investidas do encarregado eram indesejadas e repelidas.  O TRT mencionou o fato de a trabalhadora ter admitido, em seu depoimento, que a perseguição teria se iniciado quando o encarregado viu que ela não ia mais dar atenção a ele e concluiu que ela teria confessado que deu atenção ao suposto assediador, o que demonstraria a consensualidade.

Palavras da vítima foram desconsideradas

No TST, segundo o relator do recurso de revista da balconista, a suposta consensualidade muitas vezes decorre de coação por falta de opção ou por colocar em risco o emprego. “O fato de ter tido consensualidade até certo ponto não quer dizer que esta prossiga no tempo. Pode ser que seja um não a partir dali”, ressaltou. 

Na sua avaliação, ao desconsiderar totalmente a palavra da trabalhadora para formar seu convencimento, o TRT contrariou uma das orientações do protocolo do CNJ, que considera fazer parte do julgamento com perspectiva de gênero à alta valoração das declarações da mulher vítima de violência. 

Para o relator, a empregada comprovou que foi vítima de assédio sexual e que a empresa, ao não responder adequadamente às denúncias recebidas, contribuiu para a manutenção de um meio ambiente de trabalho desequilibrado, em descumprimento dos deveres previstos no art. 157 da CLT. 

Ainda cabe recurso da decisão.