ataque à democracia

Golpistas articulavam invasão de sedes dos três Poderes nas redes desde 3 de janeiro

Radicais divulgaram mensagens em aplicativos como o Telegram para trazer manifestantes de todo o País para Brasília, com todas as despesas pagas desde terça-feira

A invasão do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso vinha sendo preparada por extremistas leais ao ex-presidente Jair Bolsonaro desde a terça-feira, 3, quando radicais começaram a divulgar com grande intensidade mensagens em aplicativos como o Telegram e o WhatsApp para trazer manifestantes de todo o País para Brasília, com todas as despesas pagas.

As viagens de diversos quartéis que ainda abrigavam bolsonaristas que contestam o resultado da eleição começaram na sexta-feira, 6. As mensagens falavam também em enfrentamento às forças policiais caso fosse necessário, com pedidos a mobilização de ex-policiais, militares e pessoas com porte de arma.

O plano era tomar os palácios dos três Poderes, acampar no interior, além de bloquear refinarias de combustível em todo País. E assim provocar o caos para levar a uma intervenção militar com a deposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito democraticamente em 30 de outubro.

Oferecia-se ônibus de graça – a maioria saiu da frente de quartéis de todos o país. Em Jundiaí, por exemplo, os radicais partiram para Brasília da frente do 12.º Grupo de Artilharia de Campanha. Em Campinas, os bolsonaristas se reuniram diante da Escola preparatória dos Cadetes do Exército.

Em mensagem, os bolsonaristas radicais queriam unir policiais militares e militares da reserva das Forças Armadas. Também convocaram caçadores, atiradores e colecionadores de armas e bombeiros militares. Queriam pessoas com experiência militar para enfrentar as forças de segurança caso fosse necessário. Prometiam aos que fossem para Brasília: “Tudo pago. Água, café, almoço e janta. Ficará acampado no Planalto.”

“O povo do agro me chamou e já me contratou 3 mil ônibus de diferentes áreas do Brasil”, disse um organizador de protestos bolsonaristas em áudio produzido e divulgado nesta quarta-feira, 4. “A gente vai tomar o poder. Agora vamos mostrar o que é gente do bem quando resolve ser do mal. Iremos fazer uma reintegração da posse das casas do Poder.”

Neste mesmo dia, mensagens apareceram em diversos grupos de WhatsApp e Telegram com convocações para caravanas de todas as capitais nacionais e de grandes cidades do interior. Um dos conteúdos afirmava que a participação dos manifestantes era “crucial ou será a escravidão e miséria para todos”. A publicação ainda exibia armas.

Num dos grupos centrais dos manifestantes no Telegram, uma mensagem publicada na quinta-feira falava de uma “operação” em três “trincheiras”: na primeira, a tomada do Congresso, do Palácio do Planalto, do Palácio da Alvorada e outros prédios em grande contingente. Num outro, o fechamento de rodovias e refinarias por caminhoneiros. Na terceira, ocupar os QGs. “Alinhar para concluir a missão”, finalizava o texto com a estratégia.

Na sexta-feira, mensagens ensinavam como fazer uma máscara caseira para resistir a bombas de gás lacrimogêneo. Durante os atos com vandalismo nos prédios federais em Brasília, diversos manifestantes usavam equipamentos de proteção individual.

Mobilização em larga escala

Desde a terça-feira, as mensagens que convocavam apoiadores de Bolsonaro para o Congresso foram crescendo em volume. Ao longo do sábado, alguns vídeos circulavam pedindo a presença na frente do Congresso Nacional. “Pessoal, o povo em massa deve ocupar todo esse espaço (o entorno da Esplanada), dentro e fora do Congresso. Aí sim derruba o governo”, dizia uma mensagem compartilhada em grupos ao longo da noite de sábado.

Durante a manhã deste domingo, a estratégia já se desenhava. “O Congresso é nosso! Vamos tomar posse dele!! Com cavalaria ou sem cavalaria, nada vai nos parar”, disse um usuário na filial organizadora dos manifestos de São Paulo, às 9h59 deste domingo.

“Foco, galera. Tomar a Praça dos Três Poderes”, dizia uma mensagem que começou a circular por volta das 10h da manhã. “Tomar o STF, o Planalto e o Congresso.” Outra mensagem, publicada às 10h43 da manhã dizia falar para o pessoal na frente do QG para marchar ao Congresso.

Às 10h58, uma convocação. “Hoje teremos a tomada dos três Poderes! E invasão no Congresso. Será um dia de guerra. O primeiro passo para a a rebelião de resistência civil.”

Levantamento

De acordo com levantamento da empresa de monitoramento Torabit, os brasileiros realizaram 795,5 mil menções nas redes sociais sobre a invasão de golpistas aos prédios dos Três Poderes, em Brasília entre às 16h e às 20h deste domingo, 8, com baixo apoio.

O sentimento favorável às manifestações durante a tarde foi caindo dos iniciais 25% e chegou à noite abaixo dos 10%. Predominou entre os usuários um sentimento de receio sobre o que pode acontecer nos próximos dias – desde aumento nos incidentes de violência até a preocupação com a economia e a alta do dólar. O número representa menos da metade de publicações realizadas no dia da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (1,6 milhão).

O sentimento registrado por usuários às 20h foi de 67,5% de críticas, 9,2% de apoio e 23,3% neutro. O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDF), foi mencionado em 7% das postagens, associando-o à responsabilidade e cumplicidade aos atos deste domingo. Para as redes, agora ele estaria com medo das consequências. A polícia foi mencionada no mesmo volume de publicações. Uma publicação que exibe agentes tirando foto das manifestações viralizou nas redes sociais e teve mais de 3,6 milhões de visualizações.

Brasília se manteve desde às 16h nos assuntos mais comentados no Twitter. Os termos “Congresso Nacional”, “Ibaneis”, “terroristas”, “Anderson Torres (secretário de Segurança Pública do DF, exonerado neste domingo)”, “Capitólio”, “SEM ANISTIA”, “Distrito Federal”, “Bolsonaristas”, “Congresso”, “Planalto”, “Esplanada” e “Xandão” completam os destaques.