Economia

Governo estuda desonerar todos os salários em até 25% em troca de imposto digital

Proposta amplia a ideia mencionada anteriormente, que previa corte de impostos apenas para rendimentos equivalentes a até um salário mínimo

O projeto do governo para afrouxar regras de contratação de trabalhadores prevê que até metade dos empregados de empresas privadas sejam pagos por hora trabalhada, em vez de salário mensal. Essa modalidade de contratação deve ser a base da proposta da carteira verde e amarela. O governo diz que o objetivo é incentivar a criação de empregos.

O Ministério da Economia estuda propor uma desoneração de até 25% da folha de pagamento das empresas para todas as faixas salariais. A proposta amplia a ideia mencionada anteriormente, que previa corte de impostos apenas para rendimentos equivalentes a até um salário mínimo.

O assessor especial do Ministério da Economia, Guilherme Afif Domingos, afirma que os técnicos avaliam os impactos da medida.

“[Estudamos] até a desoneração para todos, reduzindo em 25% a contribuição. Estamos fazendo o cálculo dentro disso”, disse à Folha.

O corte de impostos pagos pelas empresas à União sobre os salários é um objetivo antigo de Guedes, que vê na tributação sobre a folha de pagamentos uma arma de destruição de empregos. Com isso, o ministro espera conter o desemprego ao diminuir o custo de uma contratação.

Para abrir mão dessa receita, no entanto, a equipe econômica avalia que será necessária a criação de um novo imposto, a ser aplicado sobre pagamentos. “Tudo custa dinheiro”, disse Afif.

Os técnicos estão fazendo as contas com uma alíquota mínima de 0,2%. Eles estimam que ela renderia anualmente cerca de R$ 120 bilhões aos cofres públicos.

Nos cálculos usados por Guedes, esse montante seria suficiente para desonerar empresas a pagarem impostos aplicados até um salário mínimo (hoje, em R$ 1.045).

Cortar tributos para essa faixa e estender ao menos parte da medida para as demais demandaria uma alíquota maior.

O Ministério já vem mencionando a possibilidade de o novo imposto ter uma alíquota de 0,4%, o que em tese dobraria a arrecadação para R$ 240 bilhões.

Os membros da pasta veem como ideal, inclusive, a desoneração total sobre salários no país, mas reconhecem que o plano teria dificuldades. “Eu gostaria de desonerar tudo, mas aí seria uma alíquota inviável”, afirmou Afif.

Além de bancar a desoneração, o novo imposto deve servir para bancar o Renda Brasil. O programa social está em formulação e substituiria o Bolsa Família (criado na era Lula), com mais pessoas e um valor mais alto.

Afif disse que a proposta do novo imposto deverá ser enviada no mês de agosto ao Congresso.

Ele rebateu contestações à ideia. “A resposta a quem critica é: me dê uma alternativa melhor que essa. Ainda não vi”, afirmou. “O que faz sentido acaba acontecendo”, disse.

Para ele, a cobrança tem mais chances de ser aprovada caso esteja absolutamente ligada à geração de emprego e renda.

O imposto é planejado por Guedes desde o começo do governo, mas até hoje nunca foi apresentado oficialmente. A ideia recebe críticas do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e já foi contestada publicamente até pelo presidente Jair Bolsonaro.

No ano passado, as discussões sobre o novo imposto nos moldes da antiga CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras) ajudaram a derrubar o então secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra.

Na época, o plano era até saques e depósitos em dinheiro serem taxados com uma alíquota inicial de 0,4%; já pagamentos no débito e no crédito teriam cobrança de 0,2% (para cada lado da operação, pagador e recebedor).

Depois, Guedes colocou o novo imposto na geladeira, mas não o eliminou dos planos. Recentemente, reforçou o argumento de que não se trata de uma CPMF.

Além disso, passou a chamar o tributo de digital, principalmente por pegar em cheio o crescimento do ecommerce. As compras pela internet têm acelerado no Brasil e no mundo com a pandemia do coronavírus.

Nos planos da equipe econômica, até traficantes de drogas e políticos corruptos pagariam o imposto ao fazer uma transação, um pagamento, uma compra eletrônica e até pagar a fatura de serviços de streaming.

Transações em dinheiro também estariam sujeitas à tributação quando houver o registro digital da operação.

Os membros do Ministério dizem que os estudos sobre a proposta levam tempo pela necessidade de várias instâncias no governo fazerem avaliações e pelo fato e um componente da reforma estar ligado a outro.

“É um Lego tributário”, disse Afif, em referência ao brinquedo com partes que se encaixam e permitem múltiplas combinações.

Mesmo assim, o governo trabalha com urgência nos estudos. Até mesmo porque as propostas precisam ser consideradas no projeto de Orçamento do ano que vem, a ser enviado até 31 de agosto ao Congresso.

Perguntas e respostas sobre o novo tributo

Por que criar um novo imposto?

O governo afirma que não tem de onde tirar dinheiro para financiar o Renda Brasil, programa social que será ampliado para contemplar mais pessoas e um valor mais alto. Além disso, quer desonerar a folha de pagamento das empresas, considerada nocivas por Guedes para a geração de emprego

Há consenso?

Não. A tentativa mais recente de recriar um imposto similar à extinta CPMF levou à queda do secretário da Receita Federal. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), costuma se opor

De quanto seria a alíquota?

Inicialmente, o plano é que todos os pagamentos sejam taxados em 0,2%. Caso seja necessário, haveria aumento dessa alíquota

A que seria aplicado?

A pagamentos em geral, principalmente no comércio eletrônico. Transações em dinheiro também poderiam ser taxadas quando houvesse o registro digital da operação

Esse dinheiro é suficiente para desonerar completamente a folha salarial?

Não. A estimativa inicial é que a alíquota renderia R$ 120 bilhões, o suficiente para desonerar até um salário mínimo, já considerando que uma parte da arrecadação deve sustentar o Renda Brasil​.