Governo quer distribuir remédio no SUS sem aval da Anvisa
Mudança valeria apenas para compras do governo federal em casos excepcionais, como em situação de emergência de saúde pública ou falta do produto no mercado local
O governo Jair Bolsonaro quer reduzir entraves para distribuir a pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) medicamentos sem registro sanitário concedido pelo Brasil. A proposta é permitir que a importação dos produtos seja autorizada automaticamente, eliminando análise da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Integrantes da cúpula do Ministério da Saúde afirmam, reservadamente, que a mudança evitaria atrasos com burocracias da Anvisa para importações urgentes. Já ex-diretores da agência e a indústria farmacêutica no Brasil, críticos à sugestão, dizem que uma nova regra abriria brecha para o governo driblar preços de medicamentos ofertados no País, mas sob risco aos pacientes.
A mudança valeria apenas para compras do governo federal em casos excepcionais, como em situação de emergência de saúde pública ou falta do produto no mercado local. A condição é que o Ministério da Saúde se responsabilize por todas as etapas do processo, tarefa hoje compartilhada com a Anvisa.
Pela regra atual, o ministério pede autorização da agência para a importação de medicamento que não foi avaliado ainda no Brasil A Anvisa analisa documentos e se manifesta em 10 dias. O prazo cai para 48 horas em casos de “emergência de saúde pública de importância nacional ou internacional”.
Os próprios diretores da Anvisa sugeriram mudar a resolução da agência sobre importação, a RDC 203/2017. Uma consulta pública de 15 dias será feita sobre a proposta, até 18 de fevereiro, período mais curto do que o normal. O órgão, na sequência, vai analisar sugestões ao texto e votar em reunião de diretoria colegiada uma proposta final.
A resolução que o governo deseja alterar já serviu como barreira para impedir a distribuição de medicamentos de empresas contratadas pelo governo que não apresentavam as certificações sanitárias exigidas.
O Estado apurou que o apoio de parte dos gestores da Anvisa à mudança passa pelo interesse em agradar o governo, mirando três vagas de diretores do órgão que serão preenchidas por Bolsonaro este ano. A mudança de posição da Anvisa sobre a própria regra coincide com a ascensão do médico e contra-almirante Antonio Barra Torres, que tornou-se em dezembro presidente interino do órgão e apresentou a sugestão. Amigo de Bolsonaro, ele foi indicado em janeiro a presidente efetivo, mas a confirmação do cargo depende de aprovação no Senado.
Em nota, a Anvisa afirma que “é necessário buscar respostas prontas” quando há uma emergência por falta de medicamentos. Segundo a agência, a proposta é que seja do Ministério da Saúde a “responsabilidade objetiva”, a “definição da situação de necessidade” e “o atesto da qualidade dos produtos a serem importados”. O Ministério da Saúde não se manifestou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.