‘Há uma falsa impressão de que o pior da pandemia passou’, diz presidente do Conass
Carlos Lula diz que ministério dedica tempo demais à CPI enquanto poderia negociar novas doses da AstraZeneca
O secretário estadual de Saúde do Maranhão, Carlos Lula, criticou, na última terça-feira (18), o Ministério da Saúde por estar dedicando mais atenção à CPI da Covid-19 do que às atividades de resposta à pandemia. Em entrevista ao GLOBO, o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) diz que o governo federal precisa buscar negociações para adquirir doses de vacina da AstraZeneca que foram rejeitadas pelos EUA e pela Europa.
Repórter: O Conass trabalha com a possibilidade real de uma terceira ond
Carlos Lula: A gente trabalha com esse cenário e espera esse cenário. Uma diminuição passou uma falsa impressão para as pessoas de que o pior da pandemia passou. Só que não passou. A gente estabilizou num número muito alto de casos e mortes. E nas últimas semanas isso começou a aumentar novamente em alguns estados. Alguns estados não estão nem indo para a terceira onda, mas já para a quarta. É o caso do Espírito Santo.
Repórter: Prefeituras e estados devem começar de novo a adotar medidas mais duras de circulação e abertura de comércio e escolas?
Carlos Lula: A sociedade tem um esgotamento do ponto de vista econômico e social. As decisões dos governos têm que ser tomadas com base nessas duas variáveis, mas não dá para a gente ignorar o fato de que a gente tem uma vacinação lenta no país, que vai diminuir seu ritmo nas próximas duas semanas. É sim a hora de repensar medidas de distanciamento social.
Repórter: Os estados correm risco de ter falta de oxigênio e insumos de novo?
Carlos Lula: Desta vez, a gente não teve problema com oxigênio, como tivemos na segunda onda. Mas temos problemas com outros insumos, sobretudo o kit intubação, que não foi abastecido em quantidade adequada. A gente tem para o dia a dia, mas não um estoque que nos permita enfrentar uma nova crise.
Repórter: O diálogo dos estados com o governo federal melhorou com o novo ministro?
Carlos Lula: A gente dialoga permanentemente com o ministério. O problema é que, muitas vezes, ações são bloqueadas pelo presidente da República. A gente tem notado que o ministério também tem voltado muita atenção para o que acontece na CPI da Covid-19. O ministério tem que se preocupar neste momento em vacinar mais pessoas, e mais rápido. É isso que vai ajudar a conter a pandemia.
Repórter: O Conass ainda busca adquirir mais vacinas por conta própria?
Carlos Lula: Neste momento, existe uma fila enorme com os fornecedores, e a gente não tem como furar essa fila. O que era para ter sido feito era o governo federal adiantar suas compras. Nós, os entes subnacionais, não temos mais oferta de vacina. A gente tentou ajudar fazendo a compra da Sputnik V, mas não logramos êxito, porque não veio a autorização da Anvisa.
Repórter: O que o ministro, governadores e prefeitos podem fazer para conter uma eventual terceira onda?
Carlos Lula: Por parte do ministério, ele tem de ir atrás, por exemplo, da AstraZeneca, que rompeu contrato com a União Europeia. Eu não vi nenhuma atitude do ministério querendo ir atrás dessas vacinas. Isso é um problema. Por que a gente não foi atrás do excedente? Os Estados Unidos apontam no mesmo sentido. Cadê a interlocução para fazer um acordo com os EUA e tentar pegar o excedente de vacinas de lá? Falta às vezes proatividade para o governo federal tentar tomar medidas se antecipando ao problema, sem esperar acontecer.
Para os entes subnacionais, a gente precisa fazer uma pressão expressiva de financiamento. Isso tem que ser dito com todas as letras. A gente viveu o pior momento da pandemia sem o governo federal aportar nada de recursos para estados e municípios.
Repórter: O que o público precisa entender agora no Brasil?
Carlos Lula: A gente tem que olhar com muito cuidado e muita precaução as semanas que estão por vir. A gente pede cuidado e ajuda da população para ajudar a conter a Covid-19 neste momento. Uma terceira onda seria muito pior do que esses dois momentos que a gente já viveu.