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Homem diz que esfaqueou mulher trans para apagar mensagens

Adiência aconteceu nesta quinta-feira (28) no município de Içara, em Santa Catarina

Homem confessa que esfaqueou mulher trans e diz que queria apagar mensagens (Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal)

Em audiência realizada nesta quinta-feira (28) no município de Içara (SC), os dois homens acusados de esfaquear a transexual Rebeka Curtts, de 28 anos, confessaram o crime. Em audiência que durou cerca de 4h, Rudinei Xavier de Jesus e Anderson Andrei Palaoro alegaram também que só pretendiam apagar mensagens do celular da vítima.

De acordo com o advogado Diomar Gilberto de Souza Junior, assistente de acusação, Rudinei confirmou que possuía uma dívida com Rebeka e sua intenção era apenas de pegar o celular da vítima. O acusado disse que devia cerca de R$ 800 e, em conversa com Rebeka, se sentiu pressionado e com medo de uma exposição da situação nas redes sociais. Também sentiu medo que a vítima fosse até a casa de sua mãe para lhe cobrar.

“Ele disse que estava bêbado e drogado e que, a princípio, iria só roubar o celular para excluir as mensagens e depois devolver. Confessou que estava devendo e que já saia para programas com a vítima há cinco meses e fez isso porque estava com medo”, afirma Junior.

A audiência teve início às 13h30 se estendeu por mais de quatro horas, mas acabou sem uma sentença. O juiz da 2ª Vara da Comarca de Içara, Fernando Dal Bo Martins, solicitou novas diligências, para que acusação e defesa possam fazer suas alegações finais, e também pediu para que o aplicativo WhatsApp mande as trocas de mensagens entre Rudinei e Rebeka.

O advogado, que atua em conjunto com Jessica Darolt Correia no caso, acredita que pelo fato de as mensagens do WhatsApp serem criptografadas, elas não serão entregues à Justiça. Também afirmou que a sentença final, após diligências e alegações, deve sair em cerca de 45 dias.

Após a longa sessão realizada na tarde de hoje, Rudinei e Anderson permanecem presos no Presídio Santa Augusta, em Criciúma (cidade a 10 km de Içara), enquanto aguardam uma decisão final da Justiça.

Traumas e nova vida

Depois do ocorrido, Rebeka Curtts decidiu ir embora de Criciúma, onde morava há set anos, para voltar a viver com sua família em Minas Gerais. Entretanto, mesmo longe do local do crime, os medos e traumas ainda acompanham a mulher.

Em conversa com Universa, a vítima afirmou que começou a fazer um acompanhamento psicológico após o crime, e que agora também foi encaminhada para um acompanhamento psiquiátrico.

“Ainda fico lembrando o que aconteceu, e o momento em que eles estavam me esfaqueando não sai da minha mente. Várias vezes, do nada, eu me assusto e escondo todas as facas de casa. Vem uma sensação ruim e parece que você sente a faca entrando em você. O que mais quero é passar essa página da minha vida e sei que vai ser difícil, porque tenho medo, na minha cabeça eles vão querer terminar o serviço e por isso eu vim embora para outro estado”, desabafa Rebeka.

Em relação aos tratamentos, ela contou que, enquanto estava em Santa Catarina, era ajudada por clínicas locais e não tinha nenhum custo com os procedimentos de radiofrequência, jato de plasma e laser para cicatrização. Entretanto, em Minas Gerais, está tendo que arcar com todos os custos.

“Hoje não me sinto feliz quando olho para o meu rosto no espelho. O que mais quero é poder me olhar no espelho e me sentir de novo uma mulher bonita, porque estou insegura e não me sinto mais bonita, não tenho mais entusiasmo e o que mais quero é voltar a ter um rosto e uma vida normal. Também não quero mais voltar para a prostituição porque tenho medo e não quero morrer, tenho medo e estou decidida disso”, afirmou.

Relembre o caso

Na madrugada de 17 de setembro de 2020, Rebeka Curtts foi vítima de uma tentativa de latrocínio. Ela levou mais de 30 facadas, principalmente na cabeça e no rosto, e teve seu carro e seu celular levados por Rudinei e Anderson. Rudinei já era seu cliente de longa data.

Quando o acusado entrou em contato para quitar uma dívida de mais de R$ 1 mil com Rebeka, eles se encontraram em uma estrada de terra, na zona rural da cidade. Rudinei tentou executar o pagamento em uma máquina de cartão e teve o procedimento recusado, o que deu início às agressões.

Os dois homens puxaram cada um uma faca e começaram a desferir diversos golpes na cabeça e no rosto da vítima. Sentindo medo e tontura, com o carro em movimento, Rebeka conseguiu destravar a porta do veículo e saltar para fora.

Ela correu para um sítio próximo ao local para procurar ajuda. Nesse momento, o Corpo de Bombeiros foi acionado para prestar socorro à vítima.

Os dois agressores fugiram no veículo da vítima, que foi encontrado abandonado no mesmo dia. De acordo com o delegado da Polícia Civil, Marcelo Viana, as investigações levaram a uma conclusão do inquérito como tentativa de latrocínio.

Violência contra trans

Desde 2008, o Brasil é o país que mais mata transexuais no mundo. Os dados são do projeto de pesquisa Trans Murder Monitoring, que, desde 2008, monitora os homicídios de pessoas trans em todo o mundo.

Em 2020, o boletim dos assassinatos e da violência contra pessoas trans, feito pela Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), mostra que, mesmo em meio a pandemia, os assassinatos de pessoas trans no Brasil cresceu 41%.

Foram 175 assassinatos de transexuais contra 124 registrados no ano anterior. Em 2020, todas as mortes foram de mulheres transexuais e travestis, não havendo o registro de morte de homens transexuais.