Indígenas e policiais entram em conflito durante reintegração de posse no Pará
Procuradoria e Defensoria questionam decisão da Justiça paraense que permitiu retomada de fazenda
PORTA ALEGRE (FOLHAPRESS) – Policiais militares e indígenas da etnia turiwara entraram em conflito durante uma reintegração de posse em uma fazenda de dendê em Tailândia, no nordeste do Pará.
O confronto começou quando agentes da Polícia Militar cumpriam, na última terça (5), uma ordem judicial para reintegração de posse, determinada no dia 25 de outubro pelo desembargador Mairton Carneiro.
Durante a tentativa de remoção, os policiais utilizaram bombas de efeito moral, e os indígenas incendiaram pneus. Oito indígenas e uma quilombola foram detidas na terça-feira durante o conflito, e liberadas provisoriamente na quarta (6).
A fazenda Roda de Fogo é ocupada desde agosto pelos turiwara, em uma disputa com a empresa Agropalma, que mantém plantações de dendê para produção de óleo de palma. O Ministério Público Federal e a Defensoria Pública do estado se manifestaram contra a medida do Tribunal de Justiça.
Os indígenas afirmam que a área da fazenda tem importância para sua cultura e subsistência e acusam a empresa de restringir o acesso a cemitérios sagrados no local. Segundo eles, a introdução das plantações de dendê resultou na expulsão dos povos originários da região, o que motivou a demanda pela demarcação do território.
Em nota, a Agropalma disse que a operação foi feita em cumprimento à decisão judicial do Tribunal de Justiça do estado e que a desocupação foi feita sem registro de feridos.
Já a Defensoria Pública afirma que, durante a audiência de custódia, se verificou desrespeito a garantias legais, como leitura de documentos obrigatórios, e indícios de possíveis violações de direitos humanos, como uso excessivo de força policial.
O Ministério Público Federal diz que o tribunal estadual não tem competência para julgar o caso, por envolver direitos indígenas —tema de competência da Justiça Federal.
O órgão tentou impedir a reintegração de posse, sem sucesso. “Como o MPF havia alertado, o despejo foi extremamente tenso e gerou uma série de riscos a vidas indígenas”, disse a entidade em nota. “Se for identificado ‘dolo ou erro grosseiro’ no caso, os agentes públicos envolvidos podem ser responsabilizados pessoalmente pelos resultados”.
Em nota, a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) informou que monitora de perto a situação e atua na mediação do conflito entre os Turiwara e a Agropalma desde o início do conflito em 2022.
A Funai disse que houve uma audiência judicial em setembro com o intuito de buscar uma conciliação entre a Agropalma e a comunidade Turiwara. “A tentativa de conciliação, mediada pela Defensoria Pública e pelos advogados que representam os indígenas, não obteve sucesso, uma vez que a empresa não aceitou os termos propostos.”
Segundo a entidade, a coordenação regional da Funai de Baixo Tocantins planejava implantar ações como acompanhamento de demandas e estudos para qualificação fundiária na região. No entanto, devido ao agravamento do conflito e à ocupação da área, o foco foi redirecionado exclusivamente para ações de segurança.
No início deste ano, a Funai acionou a Polícia Federal e a Secretaria de Segurança Pública para investigar o assassinato de um indígena e o ferimento de outro em meio a um conflito. Desde então, o Ministério dos Povos Indígenas solicitou ao Ministério da Justiça o apoio da Força Nacional, com o objetivo de garantir a segurança dos Turiwara durante o processo de ocupação.
Segundo a fundação, esse pedido depende de autorização do governo estadual. Procurada pela Folha, a gestão do governador Helder Barbalho (MDB) não se manifestou até a publicação.