Cambistas presos no Rio de Janeiro foram abastecidos por ingressos fornecidos pela “família olímpica” e atuavam para uma empresa com ligações com membros do Comitê Olímpico do Rio (COI). No total, cerca de 40 cambistas foram presos em três dias no Rio e grupos repetiram o esquema que já existia na Copa do Mundo de 2014.
Um dos presos pela Polícia Civil do Rio na última sexta-feira foi um irlandês acusado de envolvimento com uma quadrilha internacional de cambistas, Kevin James Mallon. Detido em flagrante, ele era um dos diretores da empresa inglesa THG que, em 2014, teve seu CEO, James Sinton, preso por integrar a máfia dos ingressos da Copa do Mundo de 2014.
Durante a ação, os policiais civis apreenderam cerca de 1.000 ingressos que eram comercializados por valores bem acima dos fixados pela organização da Olimpíada.
Mas vários desses ingressos faziam referências às entidades de membros do COI. Para que cada ingresso seja emitido, ele precisa sair com um nome de referência. Muitos deles estavam em nome do Comitê Olímpico da Irlanda, inclusive ingressos de valores elevados para a cerimônia de abertura.
Donovan Ferreti, diretor de Ingressos do Rio-2016, explicou que uma pessoa ou empresa pode comprar no máximo 120 entradas. Mas entidades olímpicas nacionais tem acesso a um volume maior, supostamente para vender para seus torcedores.
Procurado, o Comitê Olímpico da Irlanda indicou que não conhece as pessoas presas. “Abrimos investigações imediatas para entender como ingressos com os nomes do Comitê chegaram a essas pessoas”, indicou o Comitê irlandês, em um email. A entidade garante que segue as regras do COI sobre venda e revenda. “Estamos tratando desse assunto com máxima seriedade”, garantiu.
Na THG, porém, um dos funcionários que trabalhou numa das subsidiárias da empresa era Stephen Hickey, filho do também irlandês Pat Hickey, membro até semana passada do Conselho Executivo do COI e hoje chefe dos Comitês Olímpicos Europeus.
Em 2012, o senador Romário apresentou um requerimento no Ministério do Esporte, solicitando que o governo federal investigue um possível tráfico de influências envolvendo Pat Hickey com o presidente do Comitê Organizador Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman. “O senhor Hickey costuma visitar o Rio para contribuir com os preparativos do evento ou para sondar oportunidades de negócios para sua família?”, questionou Romário na época. Hickey, naquele momento, negou qualquer envolvimento.
Membros do COI indicaram ao Estado de S. Paulo que a THG não foi autorizada a atuar no Rio, rompendo uma tradição de anos. A empresa teve o contrato para vender ingressos em 2012 em Londres e 2014 em Sochi. Ferreti ainda garantiu que não tem qualquer relação com a THG e que a empresa não tem credenciamento para vender entradas.
No momento da prisão, segundo a Polícia Civil, Mallon estava com ingressos falsos da Olimpíada. Ele foi autuado pelos crimes de associação criminosa, marketing por emboscada e facilitação de cambismo. Também foi presa Barbara Carnieri, funcionária da THG, contratada há três meses para atuar como intérprete nos Jogos. De acordo com a polícia, com base nas provas reunidas, ela foi atuada pelo crime de marketing por emboscada.
VOLTA
Apesar das prisões, a reportagem do Estado voltou a presenciar cambistas nas passarelas que dão acesso ao Parque Olímpico, na Barra da Tijuca, atuando livremente. No domingo, os cambistas percorriam a calçada perto dos locais de acesso, caminhando poucos metros da Força Nacional.
Um dos ingressos vendidos era para o basquete, com o preço de tabela estabelecido em R$ 100,00. Nas mãos dos cambistas, valiam R$ 300,00.