Insegurança alimentar afeta 61 milhões no Brasil, diz ONU
Desse total, 15,4 milhões passavam fome, diz relatório
No Brasil, 61,3 milhões (cerca de 3 em cada 10 habitantes) convivem com algum tipo de insegurança alimentar, sendo que 15,4 milhões se encontravam em insegurança alimentar grave, passando fome, no período de 2019 e 2021, aponta relatório das Nações Unidas.
Pelos países com dados comparáveis relacionados pela ONU, o Brasil é o que tem mais pessoas em algum grau de insegurança alimentar (moderada ou grave) nas Américas e o quinto no mundo, no período até 2021.
Houve um aumento significativo na comparação com o período de 2014 a 2016, quando 37,5 milhões passavam por algum nível de insegurança alimentar e 3,9 enfrentavam o nível grave.
Os dados são do relatório “O Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo em 2022”, divulgado na quarta-feira (6) por cinco agências da ONU.
Segundo a organização, o estado de insegurança alimentar moderada ocorre quando as pessoas enfrentam incertezas sobre sua capacidade de obter alimentos e são forçadas a reduzir, algumas vezes durante o ano, a qualidade ou quantidade de alimentos que consomem.
Já a insegurança alimentar grave ocorre quando, em algum momento durante o ano, as pessoas ficaram sem comida e passaram fome por um dia ou mais.
No mundo, o número de pessoas que são afetadas pela fome aumentou para 828 milhões no ano passado —um crescimento de 46 milhões desde 2020 e de 150 milhões desde o início da pandemia.
Os dados relativos ao período da pandemia de Covid-19 preocupam: após ficar sem alterações desde 2015, o percentual de pessoas no mundo afetadas pela fome saltou em 2020 e continuou subindo no ano seguinte, atingindo 9,8% da população mundial, ante 8% em 2019 e 9,3% em 2020.
Cerca de 3,1 bilhões de pessoas não conseguiram pagar por uma alimentação saudável em 2020, um aumento de 112 milhões em relação a 2019, refletindo os efeitos da inflação nos preços dos alimentos ao consumidor decorrentes dos impactos econômicos da pandemia e das medidas tomadas para contê-la.
Olhando para a frente, as projeções são de que cerca de 670 milhões de pessoas (8% da população mundial) ainda enfrentarão a fome em 2030 –mesmo que uma recuperação econômica global seja levada em consideração.
“No momento em que este relatório está sendo publicado, a guerra em curso na Ucrânia, envolvendo dois dos maiores produtores globais de cereais básicos, oleaginosas e fertilizantes, está interrompendo as cadeias de suprimentos internacionais e elevando os preços de grãos, fertilizantes, energia, bem como alimentos terapêuticos prontos para uso por crianças com má nutrição grave”, diz a ONU.
Com a disparada dos preços e a queda na renda, a falta de comida tem preocupado cada vez mais os brasileiros e tem sido tema recorrente nas conversas de família e em pesquisas divulgadas recentemente.
No mês passado, foi divulgado que 33 milhões de pessoas passam fome no país, segundo apontou a segunda edição do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, da Rede Penssan —um patamar semelhante ao que havia sido registrado há três décadas.
Além disso, pesquisa Datafolha feita nos dias 22 e 23 de junho, apontou que para 26% dos entrevistados, a comida disponível nos últimos meses era abaixo do suficiente, enquanto 62% julgaram ser suficiente e apenas 12% diziam acreditar ser mais do que o suficiente.
Embora as pesquisas tratem do mesmo tema, as metodologias são diferentes, o que impede a comparação entre elas. As estimativas da FAO são baseadas na Escala de Experiência de Insegurança Alimentar e consideram duas categorias: insegurança alimentar moderada ou grave (combinada) e apenas insegurança alimentar grave.
A pesquisa da Rede Pensann é uma amostra de domicílios usando quatro categorias de gravidade da insegurança alimentar: segurança alimentar, insegurança alimentar leve, insegurança alimentar moderada e insegurança alimentar grave.
Já a do Datafolha é uma amostra com a população brasileira adulta (16 anos ou mais). Outro ponto é que, no Datafolha, a resposta se dá pelo que o entrevistado entende por “falta de comida”, em uma única pergunta.
O documento da ONU é uma produção conjunta da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), o Fida (Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola), o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), o WFP (Programa Mundial de Alimentos da ONU) e a OMS (Organização Mundial da Saúde).
O relatório também inclui orientações de como os governos podem reformular políticas públicas em apoio à agricultura, para reduzir o custo de uma alimentação saudável para suas populações, considerando a limitação cada vez maior de recursos em diferentes partes do mundo.
“Este relatório destaca repetidamente a intensificação desses principais fatores de insegurança alimentar e má nutrição: conflitos, choques climáticos e choques econômicos, combinados com as crescentes desigualdades”, escreveram as cinco agências da ONU.